quinta-feira, 3 de outubro de 2019

A CONJUNTURA ARGENTINA 2019

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"O aumento da pobreza é o verdadeiro 'calcanhar de Aquiles' do presidente Macri, que foi eleito em 2015 com a promessa de reduzir a zero a pobreza. 'Pobreza Zero' era um de seus lemas de campanha."


Sob Macri, Argentina tem seis novos pobres a cada minuto

Por Márcio Resende
A pobreza na Argentina aumentou 8,1% em apenas um ano, afetando agora 35,4% da população, o índice mais alto de todo o mandato do presidente Mauricio Macri. Nesse período, 3 milhões e 250 mil pessoas caíram da classe média para a classe baixa, isto é, mais de 9.000 pessoas por dia. (Nota deste Blog: População da Argentina: 45,3 milhões de habitantes).
O número é uma média entre os dois primeiros trimestres deste ano. No primeiro trimestre, a pobreza aumentou a 34,1%; no segundo, 36,7. No total, existem 14,4 milhões de pobres na Argentina, considerando apenas os que se concentram nas cidades. O número pula para 15,8 milhões ao se incluir a zona rural.
Já o número de indigentes, aqueles que estão abaixo da pobreza, passou de 4.9% a 7,7% e atinge 3,1 milhões de pessoas, um milhão a mais em 12 meses.
Outro número alarmante: 52,6% das 9,5 milhões de crianças argentinas menores de 14 anos são pobres, comprometendo o futuro do país. A indigência infantil também aumentou de 8% para 13,1% em um ano.
Derrocada social
Em dezembro de 2015, a pobreza atingia 29% da população, segundo o Observatório da Dívida Social da Universidade Católica. O então governo de Cristina Kirchner (2007-2015), que era acusado pela oposição de manipular os dados oficiais do Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (INDEC), tinha deixado de divulgar o índice.
"Esses 10 pontos de diferença entre 2017 e hoje são explicados pela classe média baixa que tinha conseguido sair da pobreza e que agora voltou a essa situação. Já parte da classe baixa caiu para a indigência e depende cada vez mais da emergência de programas sociais. O mal humor nesses segmentos é grande", explica à RFI Agustín Salvia, diretor do Observatório da Dívida Social.
No final de 2017, Macri havia conseguido reduzir a pobreza a 25,7%. Com isso, ganhou as eleições legislativas e já era considerado reeleito pelos analistas políticos.
"Em 2017, este governo teve um dos índices mais baixos do século 21 em matéria de pobreza: 25%. Mas esses são resultados conjunturais que a Argentina consegue quando a inflação diminui, quando o emprego aumenta e quando os salários ganham um pouco perante a inflação, como em 2017", observa Salvia. "Não são soluções estruturais para pobreza", sublinha o acadêmico.
Tudo mudou a partir de abril de 2018. A economia entrou em turbulência com desvalorizações da moeda e a inflação, já alta, ganhou ainda mais fôlego. O país acentuou a sua "estagflação", combinação letal de estagnação com inflação.
Em um ano, a cesta básica aumentou 59,3% enquanto os salários aumentaram 32% em média. Ou seja: a inflação destruiu o poder de consumo, que caiu pela metade. No segundo semestre de 2018, a destruição do poder aquisitivo continuou, embora menos: a cesta aumentou 25,4% enquanto os salários subiram 19%.
"A situação é complicada porque o processo de inflação faz com que os salários fiquem constantemente abaixo dos preços. Ao mesmo tempo, a estagnação no mercado de trabalho faz com que não haja a possibilidade de compensar, nos lares pobres ou nas classes médias, as quedas na capacidade de consumo", avalia Salvia.
Ponto fraco de Macri
O aumento da pobreza é o verdadeiro "calcanhar de Aquiles" do presidente Macri, que foi eleito em 2015 com a promessa de reduzir a zero a pobreza. "Pobreza Zero" era um de seus lemas de campanha.
"Este governo acreditou que, através de uma política de abertura econômica, conseguiria atrair os investimentos produtivos que nunca chegaram, a não ser para o endividamento. Isso gerou uma crise econômica, fazendo com que os objetivos de recuperar a economia, de gerar emprego, de baixar a inflação e a pobreza não fossem atingidos", aponta Agustín Salvia.
O próprio Macri, quando assumiu o cargo, em dezembro de 2015, pediu para ser avaliado, ao final do seu governo, sobre seu combate à pobreza. Esse fracasso, acreditam os analistas, é o responsável pela reviravolta na política argentina e pela derrota que se desenha nas eleições presidenciais de 27 de outubro.
Situação ainda pior
Em agosto passado, a inflação chegou a 4% e a projeção é que atinja 6% em setembro. Em agosto, o peso argentino sofreu uma nova desvalorização de 30% como consequência do resultado eleitoral das primárias, que revelaram uma provável derrota do presidente Mauricio Macri para o candidato Alberto Fernández.
O desemprego continua a crescer, a inflação não dá trégua e não há perspectiva de crescimento econômico no horizonte. Nos últimos 12 meses, a inflação acumula alta de 54,5%.
Um simples exercício matemático permite calcular que os 3,250 milhões de pessoas que caíram da classe média baixa para a classe baixa fizeram-no a uma média de 9 mil pessoas por dia ou seis novos pobres por minuto. No tempo gasto para a leitura até este ponto do texto, cerca de 24 pessoas tornaram-se pobres na Argentina.
E o ritmo não arrefece. Pelos cálculos extraoficiais, a pobreza já está em 38% e pode terminar o ano atingindo 40% da população.
"A pobreza ainda não chegou ao seu teto", adverte o diretor do Observatório da Dívida Social, Agustín Salvia. "A pobreza vem crescendo: 32% no quarto trimestre de 2018, 34% no primeiro de 2019 e 36% no segundo de 2019. Estamos no terceiro trimestre com um efeito crítico da desvalorização e da estagnação que se agravou a partir de agosto e que, neste contexto, estaríamos próximos de 38% de pobreza", calcula.
"A saída estrutural não pode ser visualizada. Não há capacidade para sair desta situação apenas com a estabilização econômica. Para diminuir a pobreza estrutural, será preciso um programa de desenvolvimento", indica Salvia.
O governo Macri tenta minimizar o impacto dos números. A ministra do Desenvolvimento Social, Carolina Stanley, argumenta que a situação estrutural melhorou em termos de acesso à saúde, à educação e à rede de água e esgoto.
"Não podemos negar que houve uma melhora substancial em matéria de rede de água e esgoto, de acesso à educação e à saúde, de moradia e até de meio ambiente. Essas melhoras foram importantes, mas não suficientes. Quando olhamos para outros aspectos do bem-estar social, as melhoras não foram tão relevantes", conclui Agustín Salvia.  -  (Fonte: Ópera Mundi - Aqui).

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