quinta-feira, 30 de novembro de 2017

O FURO NA BOLHA


As redes sociais e a blogosfera em particular estão repercutindo o depoimento - por videoconferência - oferecido ao longo de 4 horas (AQUI) pelo advogado Rodrigo Tacla Durán à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que investiga a JBS e a J&F no contexto da Operação Lava Jato. Tacla é ex-advogado da Odebrecht.

O conteúdo do alentado depoimento, independentemente de ser fidedigno ou não, merece ser conhecido e esmiuçado. Mas desde logo algo pode ser dito: se as informações prestadas por Tacla Durán são procedentes, a Operação Lava Jato estará irremediavelmente comprometida; se infundadas, a certeza de que o acusador permanecerá ad infinitum na Espanha, onde se encontra em face da dupla nacionalidade de que desfruta.

Enquanto isso, os estudiosos do comportamento das mídias contam com singular oportunidade de ver no que resulta um genuíno confronto entre Mídia Corporativa e Redes Sociais.

Aguardemos.

O PREÇO DA PARANOIA É A ETERNA VIGILÂNCIA


Trayko Popov. (Bulgária).

A GUERRA NO HORIZONTE

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Foi no governo Ronald Reagan que - ao lado da consagração total do Neoliberalismo por Reagan e Margareth Thatcher - surgiu a onda da "Guerra nas Estrelas", espécie de febre dos EUA pelo 'domínio bélico' do espaço mediante instalação de sistemas high tech antimísseis de defesa. A paranoia nuclear, assim, chegava ao ápice, e por conta dela a elevação monumental de gastos (e lucros privados) do complexo militar-industrial. Paul Craig Roberts, autor do artigo abaixo, foi subsecretário de Política Econômica no citado governo; tem tudo para saber do que está falando. Mas convém lembrar que naquela época o alarmismo nuclear já encontrava área fértil. 


Você não enxerga a guerra no horizonte?

Por Paul Craig Roberts 
(Tradução por Ruben Bauer Raveira)

De acordo com o noticiário na imprensa britânica, o presidente da Rússia Vladimir Putin instruiu as indústrias da Rússia a se aprontarem de modo a estar aptas a fazer uma rápida transição para a produção de guerra. 
Obviamente, o governo russo não faria tal anúncio a menos que estivesse convencido de que o prognóstico de guerra contra o Ocidente fosse real. Já faz algum tempo eu venho enfatizando em meus artigos que a consequência de anos a fio de ações hostis adotadas por Washington e seus vassalos europeus contra a Rússia estava levando à guerra.
É fácil entender que o colossal complexo militar e de segurança dos Estados Unidos necessita de um inimigo convincente para justificar o seu enorme orçamento. É fácil entender que os neoconservadores loucos coloquem a sua ideologia fantasiosa acima da vida no planeta. E é fácil entender que Hillary e o Comitê Nacional Democrata farão qualquer coisa para reverter a vitória presidencial de Trump. No entanto, é difícil entender porque os líderes políticos europeus estão dispostos a colocar seus países em risco em benefício de Washington.
Ainda assim, é o que eles fazem. Por exemplo, em 13 de novembro a primeira-ministra britânica Theresa May disse que a Rússia era uma ameaça à segurança internacional, que estava interferindo em eleições europeias e que estava grampeando governos europeus. Não há evidência para estas alegações mais do que as há para o “Russiagate” [N. do T.: o alarido na imprensa nos Estados Unidos quanto a que a Rússia haveria interferido nas eleições americanas para favorecer Trump]. Ainda assim, tais alegações prosseguem e se multiplicam. Agora, a União Europeia está organizando antigas províncias da União Soviética – Bielorrússia, Moldova, Ucrânia, Geórgia, Armênia e Azerbaijão – numa “Parceria Oriental” com a União Europeia. 
Em outras palavras, o Ocidente está abertamente organizando antigas províncias de Moscou contra a Rússia, designada pela primeira-ministra May como sendo um “estado hostil”. A Rússia sabe que não há base para essas alegações anti-Rússia, e as considera idênticas às falsas alegações contra Saddam Hussein, Kadhafi e Assad, feitas para justificar os ataques militares ao Iraque, à Líbia e à Síria. Uma vez tendo convencido a Rússia de que ela está sendo tocaiada para um ataque, a Rússia está se preparando para a guerra.
Pense por um momento a respeito disso. O mundo está sendo levado ao Armagedom apenas porque um corrupto e ganancioso complexo militar e de segurança dos Estados Unidos precisa de um inimigo para justificar o seu gigantesco orçamento, porque Hillary e o Comitê Nacional Democrata não conseguem aceitar uma derrota política, e porque os neoconservadores têm uma ideologia de supremacia americana. Qual é a diferença entre a detestada supremacia branca [N. do T.: no original White Supremacy, uma suposta supremacia racial dos brancos] e a supremacia americana que o presidente Obama, ele próprio, alardeou? Por que a supremacia branca é terrível, enquanto que a supremacia americana é uma dádiva de Deus ao país “excepcional” e “indispensável”?
O governo russo partilhou abertamente a sua preocupação quanto a que a Rússia está sendo tocaiada para um ataque militar. Como eu reportei – já que a CNN, o The New York Times e o Washington Post não o fizeram – o vice-comandante do Comando de Operações Militares da Rússia externou publicamente a preocupação quanto a que Washington está preparando um ataque nuclear de surpresa contra a Rússia.  O presidente Putin chamou recentemente a atenção para a coleta por Washington de amostras de DNA de cidadãos russos para um laboratório de armamentos da Força Aérea dos Estados Unidos, o que significa o desenvolvimento de uma bio-arma específica contra a população russa. Por diversas vezes a Rússia chamou a atenção para bases dos Estados Unidos e da OTAN nas suas fronteiras, apesar das garantias manifestadas por sucessivos governos americanos que tal coisa jamais ocorreria.
Nós deveríamos perguntar a nós mesmos o porquê do fato de Washington ter convencido a Rússia, uma potência nuclear e militar de primeira linha, de que a Rússia será atacada não ser o principal tópico das discussões públicas e políticas. Em vez disso, nós ouvimos a respeito de jogadores de futebol americano que ajoelham durante o hino nacional, ouvimos fake news sobre o Russiagate, ouvimos sobre um tiroteio em Las Vegas, e por aí vai.
Nós também deveríamos perguntar a nós mesmos por quanto tempo mais Washington irá permitir que qualquer um de nós reporte pela internet notícias reais, em vez das fake news de que Washington se utiliza para controlar as explicações. O esforço do chefe da Comissão Federal de Comunicações para acabar com a neutralidade da rede, além de outros esforços em curso para descreditar notícias factuais como se propaganda russa fossem, indicam que Washington concluiu que, para fazer guerra à Rússia, Washington tem também que fazer guerra à verdade. 
Washington não sobreviverá à sua guerra, nem tampouco sobreviverão as populações americana e europeia.  -  (Fonte: aqui).
[Paul Craig Roberts, acadêmico e especialista em geopolítica, foi o Subsecretário de Política Econômica do governo americano durante a presidência de Ronald Reagan].

RISCO NUCLEAR: FECHA-SE O CÍRCULO


Rayma Suprani. (EUA).

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

EUA X COREIA: A HORA APOCALÍPTICA


Christo Komarnetski. (Bulgária).

A FUGA SUBMARINA


Bayram Hajizadeh. (Azerbaijão).

DA ARTE DE CHUTAR GATO MORTO

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Aos amigos e a si próprios, tudo, aos inimigos, a lei, eis a máxima imperante. E quando é premente a necessidade de 'pegar' alguém, qualquer 'pezinho' será suficiente. Garotinho rasgou o verbo denunciando no Youtube a monumental tramoia global-futebolística, e logo logo, por uma dessas (in)felizes, como direi?, coincidências, foi trancafiado (e exibido aos quatro ventos), mesmo sem condenação por alegado (e grave) crime eleitoral. Afinal, os acusados ou mesmo condenados têm ou não o direito de ter direitos?


A obsessão da Globo e da Lava Jato em chutar gato morto

Por José Carlos de Assis

Uma antiga lição de ética convertida ao senso comum diz que não se deve chutar gato morto. Entretanto, o poderio incalculável do sistema Globo aliado ao apetite de vaidade infinita dos promotores públicos do Rio decidiu esmagar Garotinho em sua cela solitária como ato de vingança por ganhos eleitorais suspeitos no passado. Ele não está preso por corrupção. Está preso, e ainda não julgado, por crime eleitoral. Teria comprado eleitores. Mas ainda não vi a exibição das provas. Os promotores estão mais preocupados com queijos e filtros nas celas.

Não tenho nenhuma simpatia política por Garotinho ou Rosinha. São típicos populistas que desconheceram medidas estruturantes para o desenvolvimento do Estado do Rio. Entretanto, não me  consta que tenham dado dinheiro para ricos. E daí, provavelmente, o ódio que despertam nas classes dominantes, especialmente na tevê Globo. Ele parece com Lula no favorecimento assistencialista aos pobres. É diferente dele porque não assistiu também a ricos. (Nota deste blog: Sobre o termo "populistas", ver comentário abaixo).

A única vez em que tive oportunidade de conversar com Garotinho foi no início de seu primeiro mandato. Fomos convidados, um pequeno grupo de intelectuais e eu, para um jantar no Laranjeiras com o objetivo de conhecer  seus programas de governo. O carro-chefe era o cheque cidadão, naquela época de 100 reais, a ser distribuído aos pobres através de igrejas. Pensei comigo: Garotinho quer concorrer com o Bolsa Família a partir de recursos do Estado?
Comentei com um de seus principais assessores que programas sociais precisam ser universais. Do contrário, constituem a pior forma de privilégio, a saber, o privilégio de pobres em relação a outros pobres. Evidentemente que essa observação foi ignorada. Garotinho continuou com seu cheque-cidadão. E eu hoje penso que fez muito bem. Se você, no Governo, não tem recursos para atender a todos, que atenda aos que puder e mande às favas os critérios de políticas assistenciais carimbadas pelo Banco Mundial.   
Tenho profundo desprezo pelos governadores presos nas penitenciárias do Rio, assim como pelos seus asseclas. Contudo, não consigo entender porque a Globo e os promotores aplicam seu tempo e sua imagem na televisão para esmagá-los além da humilhação suprema que é perder a liberdade. É claro que isso é uma exploração sórdida da desgraça alheia para atender o lado emocional da opinião pública que não quer propriamente justiça, mas vingança.
Relativamente ao queijo encontrado na cela, com outras comidas finas, é simplesmente asqueroso o comportamento do Ministério Público. Na verdade, no caso de condenados, o que o Estado determina é a perda de liberdade, não a  tortura psicológica. Condenados de todas as classes sociais têm famílias que enviam refeições para as cadeias, o que a Secretaria de Administração Penitenciária considerou normal. Pois o Ministério Público, num gesto de suprema arrogância, quer processar os administradores da Secretaria.
A punição de quem já está preso é muito fácil. A manipulação da opinião pública a fim de criar um ambiente de ódio contra presos acusados de fraude fornece uma oportunidade excelente de ganhar audiência e popularidade. O que falta em tudo isso é moderação. Ontem, os promotores  da Lava Jato, reunidos no Rio, anunciaram solenemente que, depois de três anos de investigação, encontraram fraudes de R$ 11 bilhões. As pessoas se impressionam com isso. Se souberem que nessa conta estão multas de sete vezes o valor das fraudes, e não propriamente fraudes, provavelmente ficarão um pouco desapontadas.
P.S. Sobre a (suposta agressão contra Garotinho), talvez ele tenha tido um pesadelo, muito natural na situação em que se encontra.  -  [Nota deste blog: Quanto ao assunto, sugerimos clicar AQUI para ler: "Procurador suspeita de edição de vídeo de Garotinho na prisão"].

(Fonte: AQUI).
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Comentário selecionado (autor: Clever Mendes de Oliveira):
"Grande texto. Não andava satisfeito com os seus últimos textos, principalmente com os ainda da época da ex-presidenta às custas do golpe Dilma Rousseff, quando você me parecia muito crítico às medidas econômicas do início do segundo governo dela, sem levar em conta a necessidade de correção do Balanço de Pagamento.
De modo semelhante, a minha crítica se estendia à sua análise da atual política econômica sem se ater que o erro maior é ter permitido mais uma sobrevalorização do real, que é camuflada pelo saldo na Balança Comercial mais puxado pela recessão interna. Também, não me parece boa análise ater-se muito ao teto dos gastos - quando se sabe que os que vão chorar primeiro com o teto vão ser o Poder Judiciário, o Ministério Público e o Poder Legislativo - e ao mesmo tempo não levar em conta o impulso ao crescimento puxado pelo déficit público crescente provocado pela queda da receita.
Vejo, entretanto, dois pontos que sem chegar a ser falhos são um tanto frágeis seja pela omissão seja pela sua referência. A omissão é você pertencer à corrente dos que acreditam que um meio de comunicação ainda mais monopolista como a Rede Globo possa ter poder de formar a opinião pública. Ela no máximo ajuda a deformar ainda mais uma opinião que pode já ser tomada como extremamente deformada, no sentido de que a cultura deixou inculcada uma série de ideias que não são comprovadas cientificamente e que mais provavelmente estão erradas.
Eu canso de dar o exemplo de como os meios de comunicação acompanham o que o povo pensa, mencionando a crença da Terra como centro do universo. Jamais uma Rede Globo, se existisse na Idade Média, iria contra a ideia de que a Terra era o centro do universo, pois uma ideia assim não teria aceitação popular.
Se na Idade Média o sistema fosse capitalista e de mercado, a exigência para a que a Rede Globo seguisse a orientação popular seria do próprio sistema econômico. Se a Rede Globo não seguisse ela não seria a rede de preferência popular. Então falar que o meio de comunicação é que forma a opinião das pessoas é desconhecer o sistema capitalista e o funcionamento do mercado.
A omissão em mencionar a pouca importância de um meio de comunicação na formação do pensamento popular em um texto que a todo momento fala em a Rede Globo querer atender aos anseios populares acaba nem mesmo podendo ser visto como uma fragilidade do texto. Afinal, para o bom entendedor meia palavra basta.
Eu mesmo assim tomo tal omissão como fraqueza porque penso que é importante alertar (...) para a crença pobre de que os meios de comunicação é que formam a cultura das pessoas. Tive oportunidade de criticar muito essa crença em comentários que enviei junto ao post “O que os leitores querem: um jornalismo isento ou um espelho daquilo que pensam?” de segunda-feira, 27/06/2016 às 23:03, aqui no blog de Luis Nassif e que pode ser visto no seguinte endereço:
O post “O que os leitores querem: um jornalismo isento ou um espelho daquilo que pensam?”, consistindo de uma breve introdução do texto de Alexandre Marini intitulado “Isenção ou identificação?” e publicado originalmente no Observatório da Imprensa, sofreu algumas críticas exatamente porque deixava transparecer que o leitor ou ouvinte ficava preso a determinado canal de comunicação porque o canal dava a notícia do modo que ele queria ler ou ouvir ou mesmo ver sendo noticiada.
A segunda fraqueza a meu juízo ao seu texto diz respeito a seguinte frase sua:
“São típicos populistas que desconheceram medidas estruturantes para o desenvolvimento do Estado do Rio.”
Não acho válido utilizar a expressão “típicos populistas”. A informação relevante seria “... que desconheceram medidas estruturantes para o desenvolvimento...”. Sendo assim, a frase ficaria muito mais adequada se fosse escrita do seguinte modo:
“São tipos que desconheceram medidas estruturantes para o desenvolvimento do Estado do Rio.”
Considero que o termo populista é maltratado pela academia. (...) vira e mexe aparece um texto para falar mal do populismo. Lá fora os textos são escritos pelo que podia ser visto como pessoas da esquerda. E a intenção é falar mal de Donald Trump. Para enquadrar-se em um conceito eles chamam de populista aquele que privilegia medidas de curto prazo de interesse da população sem levar em conta os efeitos de longo prazo.
O problema desse conceito é que nós vivemos em um mundo de ignorância tanto no curto como no longo prazo. E a ignorância de que eu falo não é a do cidadão. A ignorância é do acadêmico. No mundo das ciências humanas há pouco conhecimento para dizer que tal medida é boa no curto prazo, mas ruim no longo prazo.
Veja por exemplo o artigo “Populism and time inconsistency” de autoria de Mario Blejer e Piroska Nagy-Mohacsi, publicado em 22/1/2017 no Site Vox – CEPR’s Policy Portal e que pode ser visto no seguinte endereço:
Em nenhum momento os autores se referem à redução da inflação como um exemplo de medida adotada por políticos populistas. E na verdade trata-se de uma medida de anseio popular, e que é avaliada como benéfica para a população no curto prazo, mas que pode ser danosa para a economia no longo prazo. Será que os autores ousariam chamar os políticos que prometem abaixar a inflação de populistas?
Então considero equivocado fazer essa referência a Garotinho como um típico populista sem ficar bem esclarecido qual o significado dado na frase a tal palavra."

A CRISE NÃO DÁ TRÉGUA


Zé Dassilva.

A CONSULTA

      - Topa ser a alternativa ao velho modo de fazer política? / - Topo. / - E representar
      a mudança na presidência do país? / - Topo. / - Então vamos planejar a campanha 
      até a eleição. / - Espera. VOU TER QUE DISPUTAR ELEIÇÃO?!

Laerte.

terça-feira, 28 de novembro de 2017

DA SÉRIE OS QUE PODEM TUDO


"Sem mais, nem menos, eis que o programa "Fantástico" da Rede Globo exibe imagens de Sérgio Cabral e Garotinho, ex-governadores do Rio de Janeiro, na prisão em que se encontram. Presos estão, sem culpa formada, porque seriam, ao ver de juízes deformados pela tal "opinião pública", tão perigosos quanto Hannibal Lecter, o assassino serial engaiolado no filme "O silêncio dos inocentes".

As imagens dos políticos preventivamente presos teriam sido obtidas com apoio imprescindível de membros do Ministério Público do Rio de Janeiro, aquela mesma instituição que convidou Kim Kataguiri para palestrar sobre "bandidolatria". Desviaram-se criminosamente de sua função de fiscalizadores da execução penal para exporem a intimidade de pessoas presas preventivamente.

Há algo de muito doentio com nossas instituições persecutórias, aí incluído o judiciário com competência penal, porque há muito deixou de ser isento para comungar, com o ministério público e a polícia, a cosmovisão falso-moralista e punitivista. Hoje, quem cai nas garras dessa troika, que não espere justiça. Não espere imparcialidade. Saiba que corre o risco de ser exposto, junto com sua família, à execração pública, conduzido de baraço e pregão diante das câmeras de televisão. Pouco interessa se o caso contra si é frágil ou forte; a gravidade da acusação que pesa é medida pela audiência que possa ser atraída, composta de um público cúpido em se deleitar com a desgraça alheia. Se o suspeito exposto é uma personalidade pública, a audiência vai ao delírio, para regozijo da mídia e, sobretudo, dos meganhas travestidos de juízes, promotores e investigadores. (Nota deste blog: Baraço = corda para enforcar/açoitar condenados; punição do Brasil Colônia).
A Schadenfreude virou sentimento legítimo. Nunca, depois do iluminismo, se festejou tanto, nestas terras, o suplício exposto de alvejados pelo sistema persecutório, quanto nos dias atuais, em tempos de Lava-Jato. Falta só amarrá-los na roda e esquartejá-los em praça pública. E a massa celerada ovaciona o ministério público que lhe proporciona tamanho show. Pouco lhe interessa que o próximo a cair nas malhas dessa instituição sem freio e sem critério pode ser cada um daqueles que ali estão em espasmódico orgasmo de ira descontrolada. Porque, para virar alvo de promotores ou procuradores falso-moralistas e redentoristas, basta estar no lugar errado, na hora errada.
E, em tempos de Lava-Jato, os Dallagnóis da vida assumem abertamente que "sem exposição" não seria possível responsabilizar os alvos de sua sacrossanta operação. Na falta de provas, de argumento técnico, o delírio das massas legitima a repressão. Por isso anunciam, para sua audiência de sádicos psicopatas, que 2018 será o ano da "batalha final" da Lava-Jato, um clímax imperdível, a coincidir com as eleições gerais e, claro, com prometido potencial de influenciá-la em proveito de quem, por juizecos e promotorecos, são tidos como merecedores da confiança popular.
Não escondem que o teatro sórdido montado contra personagens de visibilidade tem finalidade política. Depois de terem virado heróis nacionais por força de midiática atuação à margem da Constituição e das leis processuais, querem se assenhorar do Estado como um todo, avalizando, ou não, quem se candidate a cargo eletivo. Cria-se, assim, o index personarum prohibitorum do ministério público.
Resta-nos prantear essa instituição, que traiu sua mui promissora missão constitucional de promotora dos valores democráticos e dos direitos fundamentais, para se tornar um cínico verdugo a buscar aplauso de uma gentalha embrutecida, sem escrúpulos. Tudo em nome de um primitivo conceito de moralidade que não se sustenta diante dos abusos cometidos, da ambição desmedida e da ganância por desproporcionais vantagens pela função mal e conspiratoriamente exercida.
Triste fim do ministério público a que pertenci em atividade com tanta honra. Vulgarizou-se. Amesquinhou-se. Tornou-se um trambolho, um estorvo para as forças democráticas deste país. Gordo e autossuficiente, deleita-se no seu bem-estar, sem preocupação com milhares de brasileiras e de brasileiros impactados pela baderna política e econômica que causaram; brasileiras e brasileiros que não moram no Lago Sul de Brasília, não moram em Ipanema ou no Leblon do Rio de Janeiro e nem nos Jardins de São Paulo. Não têm recursos para planos de saúde eficientes que nem o Plan-Assiste do Ministério Público da União e nem para colocar filhos em escola privada. Será que os promotorezinhos e os procuradorezinhos pensam que essa população se alimenta de blá-blá-blá moralista? Acabaram os empregos, acabaram-se os direitos — "MAS temos o combate à corrupção!" É esse discurso que vai encher a barriga dos que foram esmagados pelo golpe do "mercado" e de seus interesseiros lacaios? Não acredito...
Um ministério público que precisa de aplauso para trabalhar descarrilhou. A repressão penal, lembra Foucault, por tangenciar perigosamente os fundamentos do Estado democrático de Direito e toda nossa autocompreensão civilizatória, precisa ser levada a efeito, em nossos dias, com discrição e até certa vergonha. Porque se houve grave lesão a bem jurídico fundamental, foi todo o sistema de prevenção que falhou. Falhou a educação, falhou a vigilância, falharam os legisladores e falhou a própria justiça que não soube cumprir seu papel de exemplo.
Claro que é muito mais fácil apontar para um culpado e extirpá-lo para deleite de um público que se diz ofendido, do que perquirir as causas do comportamento desviante e propor medidas concretas para seu enfrentamento, que não seja mais repressão midiática. Mas, preguiçoso trabalha dobrado. A sociedade que se contenta com o atalho da persecução penal e festeja seus verdugos não superará seus vícios, mas afundará na barbaridade e na ignorância e, por isso, será o terreno fértil para aproveitadores inescrupulosos. A corrupção não diminuirá, apenas se organizará para driblar os falso-moralistas. E um dia inexoravelmente cairá a máscara desse ministério público que nada fez a não ser barulho e tanto nos envergonha. Trabalharemos dobrado para nos desvencilharmos desse trambolho e enfrentarmos seriamente a tal corrupção."



(De Eugênio Aragão, procurador da República aposentado, ex-ministro da Justiça, post intitulado "É de ter vergonha do Ministério Público", publicado, entre outros, no Jornal GGN - aqui).

AS ELEIÇÕES 2018 E A LAVA JATO

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Nos anos de chumbo, diante da impossibilidade de controle e do superdimensionamento dos poderes do SNI - Serviço Nacional de Informações, o general Golbery do Couto e Silva teria confidenciado ao então presidente Geisel: "Nós criamos um monstro". Não seria por aí, claro, mas, presentemente, diante da plena autonomia e 'boquirrotice' exercitadas por doutos procuradores condutores da Lava Jato, não constituiria surpresa o fato de a novel Procuradora-geral Raquel Dodge considerar ter razões para inquietar-se. 


Procuradores do PR, RJ e SP confrontam Raquel Dodge

Por Kennedy Alencar

Um grupo de procuradores da República do Paraná, de São Paulo e do Rio de Janeiro se reuniu ontem e lançou um manifesto. Com a “Carta do Rio”, os procuradores pediram que o eleitor vote em 2018 em candidatos que não sofram acusações de corrupção. Eles prometeram uma atuação conjunta do Ministério Público Federal desses três Estados no combate à corrupção.
Em entrevista, o procurador da República Deltan Dallagnol disse que a Lava Jato travará sua “batalha final” em 2018, ano eleitoral.
O manifesto é uma contestação à liderança da procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Há um contraponto à procuradora-geral, com o anúncio de uma coordenação da Lava Jato abertamente paralela à de Brasília.
Será importante ver se Raquel Dodge terá alguma reação ao manifesto ou se ela fingirá que não viu. O clima na Procuradoria Geral da República entre o grupo de Dodge e alguns integrantes do Ministério Público, especialmente do Paraná, é de desconfiança recíproca.
A sugestão de como o eleitor deve votar e a declaração de Dallagnol de que a Lava Jato enfrentará a batalha final em 2018 são atitudes imaturas e autoritárias. Cabe ao Ministério Público identificar condutas criminosas, investigar e acusar.
Sugestão de como o eleitor deve votar não é papel de procurador da República. Alguns integrantes do Ministério Público fazem política abertamente e depois se incomodam de serem tachados de parciais. Tratar um ano eleitoral como uma batalha final da Lava Jato chega a ser infantil. É preocupante o grau de imaturidade e messianismo de procuradores que possuem tanto poder.
O combate à corrupção não é uma luta de boxe com batalha final. Apesar da importância da Lava Jato, esse trabalho não começou ontem nem vai terminar em 2018.
Uma atuação mais técnica e menos política faria bem à Lava Jato e ao Ministério Público. Para o bem da investigação e da instituição, menos guerra interna também seria recomendável.  -  (Fonte: Blog do Kennedy - AQUI).

FIM DE ANO: SEM INCIDENTES NO FRONT


J Bosco.

TRATADO SOBRE A TOLERÂNCIA


Lista de livros: Tratado sobre a Tolerância - Voltaire

Editora L&PM
Tradução: William Lagos
Seleção: Doney



"Ninguém mais teme na Holanda que as afirmações de um Gomar sobre a predestinação façam decapitar o grande pensionário, o presidente do conselho de ministros. Não se teme mais em Londres que as querelas entre os presbiterianos e os episcopais por causa da liturgia ou de uma sobrepeliz acabem por derramar o sangue de um rei no cadafalso. A Irlanda povoada e enriquecida não verá mais seus cidadãos católicos sacrificarem a Deus durante dois meses seus cidadãos protestantes, enterrá-los vivos, pendurar mães em forcas e amarrar as meninas ao pescoço de suas mães para vê-las morrerem juntas; abrir os ventres das grávidas, arrancar dali os fetos semiformados e lançá-los aos porcos e cães para serem devorados; colocar punhais nas mãos de prisioneiros sufocados no garrote e empurrar seus braços contra o peito de suas esposas, de seus pais, de suas mães, de suas filhas, imaginando que assim os tornariam mutuamente parricidas e os condenariam todos ao inferno ao mesmo tempo em que exterminavam a todos. Esse foi o relato de Rapin-Thoiras, que foi oficial na Irlanda e quase contemporâneo desses fatos; é o que registram todos os anais, todas as histórias da Inglaterra, ações que, sem a menor dúvida, jamais serão imitadas. A filosofia, unicamente a filosofia, irmã da religião, desarmou as mãos que a superstição havia ensanguentado por tanto tempo; e o espírito humano, ao despertar de sua embriaguez, assombrou-se ante os excessos a que o havia lançado o fanatismo.
Nós mesmos temos na França uma província opulenta em que o luteranismo é mais forte do que o catolicismo. A Universidade da Alsácia é controlada por luteranos; eles ocupam parte dos cargos municipais; jamais a menor disputa religiosa perturbou o repouso dessa província desde que ela passou a nos pertencer. Por quê? É porque nela ninguém foi perseguido. Quando não se busca magoar os corações, todos os corações estão a nosso favor.”
*

      “O melhor método de diminuir o número dos maníacos, se é que existe, é o de deixar essa doença do espírito sob o controle da razão, que esclarece aos homens lentamente, mas de maneira infalível. A razão é doce, é humana, inspira a indulgência, abafa a discórdia, fortalece a virtude, torna agradável a obediência às leis, mais ainda que a força pode obrigar a cumpri-las. E não se deverá levar em conta o ridículo que todas as pessoas sensatas atribuem hoje aos excessos religiosos? Esse ridículo é uma poderosa barreira contra as extravagâncias de todos os sectários.”
*

      “Direito natural é aquele que a natureza indica a todos os homens. Você cria um filho, ele lhe deve respeito na qualidade de seu pai e reconhecimento na qualidade de seu benfeitor. Você tem direito aos produtos da terra que cultivou com suas próprias mãos. Você fez ou recebeu uma promessa; ela deve ser cumprida.
     O direito humano não pode ser fundamentado em nenhum caso senão sobre esse direito da natureza; e o grande princípio, o princípio universal de um e do outro, é o mesmo em toda a terra: “Não faças aos outros o que não queres que te façam”. Ora, não se percebe como, segundo esse princípio, um homem poderia dizer a outro: “Crê no que eu creio e não no que não podes crer; caso contrário, morrerás”. É isso que se diz em Portugal, na Espanha ou em Goa. Atualmente, em alguns outros países, prefere-se dizer: “Crê, ou te odiarei; crê, ou te farei todo o mal que estiver a meu alcance; monstro, se não tens minha religião, então não tens religião nenhuma; terás de ser um motivo de horror para teus vizinhos, tua cidade e tua província”.
     Se fosse o direito humano que nos levasse a nos conduzirmos dessa maneira, seria necessário que os japoneses detestassem os chineses, que, por sua vez, execrariam os siameses; estes perseguiriam os habitantes do Ganges, que se lançariam contra os moradores do Indo; um mongol arrancaria o coração do primeiro malabar que encontrasse; os malabares poderiam matar os persas, que poderiam massacrar os turcos: e todos juntos se lançariam contra os cristãos, se bem que estes vêm de fato devorando uns aos outros há muito tempo.
     O direito da intolerância é, portanto, absurdo e bárbaro; é o direito dos tigres, sendo bem mais horrível também, porque os tigres dilaceram suas presas para comer, enquanto nós nos exterminamos por causa de alguns parágrafos.”
*

      “Se fosse possível encontrar alguém suficientemente desprovido de boa-fé ou fanático o bastante para me dizer aqui: “Por que você quer revelar nossos erros e nossas faltas? Por que deseja destruir nossos falsos milagres e nossas falsas lendas? Eles servem de alimento para a piedade de muitas pessoas; há erros necessários; não se arranca do corpo uma úlcera crônica, porque isso acarretaria a destruição do próprio corpo”, eis o que eu lhe responderia:
     Todos esses falsos milagres com os quais vocês abalam a fé devida aos verdadeiros, todas essas lendas absurdas que acrescentais às verdades do Evangelho só servem para extinguir a religião dentro dos corações; muitas pessoas que desejam se instruir e que não têm tempo para se instruir o suficiente dizem: “Os catequizadores de minha religião me enganaram, portanto a religião não existe; é melhor jogar-se nos braços da natureza que nas garras do erro; prefiro depender da lei natural a depender das invenções dos homens”. Outros têm a infelicidade de ir ainda mais longe: percebem que usaram imposturas para lhes pôr um freio e não querem mais saber sequer do freio da verdade; inclinam-se para o ateísmo; tornam-se depravados porque os outros foram trapaceiros e cruéis.
     Essas são certamente as consequências de todas as fraudes pias e de todas as superstições.”
*

      “Quanto mais a religião cristã é divina, tanto menos pertence ao homem dirigi-la: se foi Deus que a fez, Deus a sustentará sem a nossa ajuda.”
*

      “Evitemos procurar descobrir aqui por que Deus substituiu a lei que havia dado a Moisés por uma lei nova, ou por que ele havia mandado Moisés fazer muito mais coisas do que ordenara ao patriarca Abraão e por que Abraão tivera de fazer muito mais do que Noé. Parece que ele se digna a adaptar aos tempos e à população do gênero humano: trata-se de uma gradação paternal, mas esses abismos são profundos demais para nossa débil visão.”
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      “O espírito perseguidor, que abusa de tudo, busca ainda sua justificação na expulsão dos vendilhões do templo e na legião de demônios que foram expulsos do corpo de um possuído e enviados para os corpos de dois mil animais imundos. Mas será que não se vê que esses dois exemplos não são outra coisa senão uma justiça que Deus se digna a realizar por Si mesmo em castigo a uma contravenção da lei? Era uma falta de respeito para com a casa do Senhor transformar seu recinto em uma loja de comerciantes. Não importa que o sinédrio e os sacerdotes permitissem esse negócio para a comodidade dos sacrifícios: o Deus a quem se sacrificava poderia, sem dúvida, mesmo que disfarçado em figura humana, impedir tal profanação; ele poderia até mesmo punir os que introduziam na região rebanhos inteiros de animais proibidos por uma lei que ele mesmo se dignava a observar. Esses exemplos não têm o menor relacionamento com perseguições motivadas por dogmas. É necessário que o espírito de intolerância seja apoiado sobre razões muito más, uma vez que busca em toda parte os pretextos mais vãos.
     Quase todo o restante das palavras e das ações de Jesus Cristo prega a doçura, a paciência e a indulgência. É o pai de família que recebe o filho pródigo; é o operário contratado na última hora que recebe o mesmo que os outros; é o samaritano caridoso; ele mesmo justifica seus discípulos por não jejuar; ele perdoa a pecadora; ele se contenta em recomendar à mulher adúltera que passe a ser fiel; ele se digna mesmo a condescender à alegria inocente dos convivas de Caná que, já estando encharcados de vinho, ainda pedem mais; ele se dispõe a fazer um milagre em seu favor e transforma água em vinho para eles.
     Ele não se enfurece sequer contra Judas, que o deve trair; ele ordena a Pedro que jamais se sirva da espada; ele repreende os filhos de Zebedeu que, a exemplo de Elias, queriam fazer descer o fogo dos céus sobre uma aldeia onde lhes haviam recusado alojamento.
     Finalmente, ele morre vítima da inveja. Se ousarmos comparar o sagrado com o profano e um Deus com um homem, sua morte, humanamente falando, tem muitos elementos em comum com a de Sócrates. O filósofo grego pereceu pelo ódio dos sofistas, dos sacerdotes e dos principais do povo; o legislador dos cristãos sucumbiu sob o ódio dos escribas, dos fariseus e dos sacerdotes. Sócrates podia ter evitado a morte, mas não o quis; Jesus Cristo ofereceu-se voluntariamente. O filósofo grego não somente perdoou a seus caluniadores e a seus juízes iníquos, mas também lhes pediu que tratassem um dia seus próprios filhos como estavam tratando a si mesmo, se eles alcançassem a felicidade de merecer seu ódio pelos mesmos motivos que ele; o legislador dos cristãos, infinitamente superior, rogou a Seu Pai que perdoasse Seus inimigos.
     Se Jesus Cristo pareceu temer a morte, se a angústia que sentiu foi tão extrema que Seu suor se misturou com sangue, o que é um sintoma extremamente violento e muito raro, é porque ele se dignou a se rebaixar à plenitude da fraqueza do corpo humano de que estava revestido. Seu corpo tremia, mas Sua alma permanecia inabalável; ele nos ensinou que a verdadeira força e a verdadeira grandeza consistem em suportar os males sob os quais nossa natureza sucumbe. Existe extrema coragem em correr para a morte quando mais se a teme.
     Sócrates havia tratado os sofistas de ignorantes e demonstrado que usavam de má-fé; Jesus, usando de seus direitos divinos, tratou os escribas e fariseus de hipócritas, insensatos, cegos, malfeitores, serpentes, raça de víboras.”
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      “É a tolerância ou a intolerância que provém do direito divino? Se quereis vos assemelhar a Jesus Cristo, sede mártires, e não carrascos.”
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      “Para que um governo não tenha o direito de punir os erros dos homens, é necessário que esses erros não sejam crimes; os erros somente são crimes quando perturbam a sociedade; eles perturbam a sociedade desde que inspirem fanatismos: é preciso, portanto, que os homens comecem por deixar de ser fanáticos a fim de merecer a tolerância.”
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      “Em qualquer lugar em que houver uma sociedade estabelecida, uma religião é necessária; as leis reprimem os crimes conhecidos, enquanto a religião se encarrega dos crimes secretos.”
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      “A superstição está para a religião na mesma proporção em que a astrologia está para a astronomia; é a filha abobalhada de uma mãe muito sábia. Mas essas duas filhas durante muito tempo subjugaram toda a Terra.”
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      “Quanto menos dogmas, menos disputas; e quanto menos disputas, menos infelicidades; se isso não é verdade, então o errado sou eu.
     A religião foi instituída para nos tornar felizes nesta vida e na outra. O que é necessário para ser feliz na vida que há de vir? Ser justo.
     Para ser feliz na vida atual, tanto quanto o permite a miséria de nossa natureza humana, o que é necessário? Ser indulgente.
     Seria o cúmulo da loucura pretender levar todos os homens a pensar de maneira uniforme no terreno da metafísica. Será muito mais fácil subjugar o universo inteiro pela força das armas do que dominar todos os espíritos de uma única cidade.”
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      “Quando a natureza faz ouvir de um lado sua voz doce e benfazeja, o fanatismo, esse inimigo da natureza, se põe a uivar; e tão logo a paz se apresenta aos homens, a intolerância forja suas armas.”
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      “A natureza diz a todos os homens: “fiz com que todos vocês nascessem fracos e ignorantes para vegetar durante alguns minutos sobre a terra e para fertilizá-la com seus cadáveres. Uma vez que são fracos, busquem socorro; já que são ignorantes, esclareçam-se e busquem apoio. Quando todos vocês tiverem a mesma opinião, coisa que certamente não há de acontecer nunca, caso só haja um único homem com opinião contrária, vocês deverão perdoá-lo: porque sou eu que o faço pensar como pensa. Eu dei a todos vocês braços para cultivarem a terra e uma minúscula luz de razão para conduzi-los; coloquei em seus corações um germe de compaixão para que todos vocês se ajudem mutuamente a suportar a vida. Não sufoquem esse germe, não o corrompam, compreendam que ele é divino e não substituam a voz da natureza pelos miseráveis furores de escolares.
      “Sou apenas eu que ainda uno todos vocês, apesar de tudo, por meio de suas necessidades mútuas, mesmo no meio de suas guerras cruéis iniciadas tão levianamente, teatro eterno das maldades, dos riscos e das infelicidades. Sou apenas eu que dentro de uma nação interrompo as consequências funestas das divisões intermináveis entre a nobreza e a magistratura, entre essas duas classes e o sacerdócio, entre o burguês e o camponês. Eles ignoram todos os limites de seus direitos; porém, a despeito de si mesmos, todos escutam a longo prazo a minha voz, que lhes fala ao coração. Sou apenas eu que conservo a equidade nos tribunais em que, sem mim, tudo seria entregue à indecisão e aos caprichos, no meio de um amontoado confuso de leis feitas frequentemente ao acaso, para atender a uma necessidade passageira, diferentes de província para província, de cidade para cidade e quase sempre apresentando contradições entre si até no mesmo local. Sou apenas eu que posso inspirar a justiça, quando as leis apenas inspiram as chicanas. Aquele que me escuta julga sempre bem; aquele que não busca senão conciliar as opiniões que se contradizem é aquele que se desorienta.
      “Existe um edifício imenso cujos alicerces eu lancei com minhas próprias mãos; era sólido e simples, todos os homens podiam nele entrar em segurança; contudo, quiseram acrescentar-lhe os ornamentos mais bizarros, mais grosseiros e mais inúteis; agora o edifício cai em ruínas por todos os lados; os homens pegam suas pedras e as jogam nas cabeças uns dos outros; eu lhes grito: Parai, abandonai esses escombros funestos que são o resultado de vossas próprias obras e vinde morar comigo em paz nesse edifício inquebrantável que é o meu”.  -  (Fonte: Aqui).

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Comentário: Dispensável.