quarta-feira, 29 de novembro de 2017

DA ARTE DE CHUTAR GATO MORTO

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Aos amigos e a si próprios, tudo, aos inimigos, a lei, eis a máxima imperante. E quando é premente a necessidade de 'pegar' alguém, qualquer 'pezinho' será suficiente. Garotinho rasgou o verbo denunciando no Youtube a monumental tramoia global-futebolística, e logo logo, por uma dessas (in)felizes, como direi?, coincidências, foi trancafiado (e exibido aos quatro ventos), mesmo sem condenação por alegado (e grave) crime eleitoral. Afinal, os acusados ou mesmo condenados têm ou não o direito de ter direitos?


A obsessão da Globo e da Lava Jato em chutar gato morto

Por José Carlos de Assis

Uma antiga lição de ética convertida ao senso comum diz que não se deve chutar gato morto. Entretanto, o poderio incalculável do sistema Globo aliado ao apetite de vaidade infinita dos promotores públicos do Rio decidiu esmagar Garotinho em sua cela solitária como ato de vingança por ganhos eleitorais suspeitos no passado. Ele não está preso por corrupção. Está preso, e ainda não julgado, por crime eleitoral. Teria comprado eleitores. Mas ainda não vi a exibição das provas. Os promotores estão mais preocupados com queijos e filtros nas celas.

Não tenho nenhuma simpatia política por Garotinho ou Rosinha. São típicos populistas que desconheceram medidas estruturantes para o desenvolvimento do Estado do Rio. Entretanto, não me  consta que tenham dado dinheiro para ricos. E daí, provavelmente, o ódio que despertam nas classes dominantes, especialmente na tevê Globo. Ele parece com Lula no favorecimento assistencialista aos pobres. É diferente dele porque não assistiu também a ricos. (Nota deste blog: Sobre o termo "populistas", ver comentário abaixo).

A única vez em que tive oportunidade de conversar com Garotinho foi no início de seu primeiro mandato. Fomos convidados, um pequeno grupo de intelectuais e eu, para um jantar no Laranjeiras com o objetivo de conhecer  seus programas de governo. O carro-chefe era o cheque cidadão, naquela época de 100 reais, a ser distribuído aos pobres através de igrejas. Pensei comigo: Garotinho quer concorrer com o Bolsa Família a partir de recursos do Estado?
Comentei com um de seus principais assessores que programas sociais precisam ser universais. Do contrário, constituem a pior forma de privilégio, a saber, o privilégio de pobres em relação a outros pobres. Evidentemente que essa observação foi ignorada. Garotinho continuou com seu cheque-cidadão. E eu hoje penso que fez muito bem. Se você, no Governo, não tem recursos para atender a todos, que atenda aos que puder e mande às favas os critérios de políticas assistenciais carimbadas pelo Banco Mundial.   
Tenho profundo desprezo pelos governadores presos nas penitenciárias do Rio, assim como pelos seus asseclas. Contudo, não consigo entender porque a Globo e os promotores aplicam seu tempo e sua imagem na televisão para esmagá-los além da humilhação suprema que é perder a liberdade. É claro que isso é uma exploração sórdida da desgraça alheia para atender o lado emocional da opinião pública que não quer propriamente justiça, mas vingança.
Relativamente ao queijo encontrado na cela, com outras comidas finas, é simplesmente asqueroso o comportamento do Ministério Público. Na verdade, no caso de condenados, o que o Estado determina é a perda de liberdade, não a  tortura psicológica. Condenados de todas as classes sociais têm famílias que enviam refeições para as cadeias, o que a Secretaria de Administração Penitenciária considerou normal. Pois o Ministério Público, num gesto de suprema arrogância, quer processar os administradores da Secretaria.
A punição de quem já está preso é muito fácil. A manipulação da opinião pública a fim de criar um ambiente de ódio contra presos acusados de fraude fornece uma oportunidade excelente de ganhar audiência e popularidade. O que falta em tudo isso é moderação. Ontem, os promotores  da Lava Jato, reunidos no Rio, anunciaram solenemente que, depois de três anos de investigação, encontraram fraudes de R$ 11 bilhões. As pessoas se impressionam com isso. Se souberem que nessa conta estão multas de sete vezes o valor das fraudes, e não propriamente fraudes, provavelmente ficarão um pouco desapontadas.
P.S. Sobre a (suposta agressão contra Garotinho), talvez ele tenha tido um pesadelo, muito natural na situação em que se encontra.  -  [Nota deste blog: Quanto ao assunto, sugerimos clicar AQUI para ler: "Procurador suspeita de edição de vídeo de Garotinho na prisão"].

(Fonte: AQUI).
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Comentário selecionado (autor: Clever Mendes de Oliveira):
"Grande texto. Não andava satisfeito com os seus últimos textos, principalmente com os ainda da época da ex-presidenta às custas do golpe Dilma Rousseff, quando você me parecia muito crítico às medidas econômicas do início do segundo governo dela, sem levar em conta a necessidade de correção do Balanço de Pagamento.
De modo semelhante, a minha crítica se estendia à sua análise da atual política econômica sem se ater que o erro maior é ter permitido mais uma sobrevalorização do real, que é camuflada pelo saldo na Balança Comercial mais puxado pela recessão interna. Também, não me parece boa análise ater-se muito ao teto dos gastos - quando se sabe que os que vão chorar primeiro com o teto vão ser o Poder Judiciário, o Ministério Público e o Poder Legislativo - e ao mesmo tempo não levar em conta o impulso ao crescimento puxado pelo déficit público crescente provocado pela queda da receita.
Vejo, entretanto, dois pontos que sem chegar a ser falhos são um tanto frágeis seja pela omissão seja pela sua referência. A omissão é você pertencer à corrente dos que acreditam que um meio de comunicação ainda mais monopolista como a Rede Globo possa ter poder de formar a opinião pública. Ela no máximo ajuda a deformar ainda mais uma opinião que pode já ser tomada como extremamente deformada, no sentido de que a cultura deixou inculcada uma série de ideias que não são comprovadas cientificamente e que mais provavelmente estão erradas.
Eu canso de dar o exemplo de como os meios de comunicação acompanham o que o povo pensa, mencionando a crença da Terra como centro do universo. Jamais uma Rede Globo, se existisse na Idade Média, iria contra a ideia de que a Terra era o centro do universo, pois uma ideia assim não teria aceitação popular.
Se na Idade Média o sistema fosse capitalista e de mercado, a exigência para a que a Rede Globo seguisse a orientação popular seria do próprio sistema econômico. Se a Rede Globo não seguisse ela não seria a rede de preferência popular. Então falar que o meio de comunicação é que forma a opinião das pessoas é desconhecer o sistema capitalista e o funcionamento do mercado.
A omissão em mencionar a pouca importância de um meio de comunicação na formação do pensamento popular em um texto que a todo momento fala em a Rede Globo querer atender aos anseios populares acaba nem mesmo podendo ser visto como uma fragilidade do texto. Afinal, para o bom entendedor meia palavra basta.
Eu mesmo assim tomo tal omissão como fraqueza porque penso que é importante alertar (...) para a crença pobre de que os meios de comunicação é que formam a cultura das pessoas. Tive oportunidade de criticar muito essa crença em comentários que enviei junto ao post “O que os leitores querem: um jornalismo isento ou um espelho daquilo que pensam?” de segunda-feira, 27/06/2016 às 23:03, aqui no blog de Luis Nassif e que pode ser visto no seguinte endereço:
O post “O que os leitores querem: um jornalismo isento ou um espelho daquilo que pensam?”, consistindo de uma breve introdução do texto de Alexandre Marini intitulado “Isenção ou identificação?” e publicado originalmente no Observatório da Imprensa, sofreu algumas críticas exatamente porque deixava transparecer que o leitor ou ouvinte ficava preso a determinado canal de comunicação porque o canal dava a notícia do modo que ele queria ler ou ouvir ou mesmo ver sendo noticiada.
A segunda fraqueza a meu juízo ao seu texto diz respeito a seguinte frase sua:
“São típicos populistas que desconheceram medidas estruturantes para o desenvolvimento do Estado do Rio.”
Não acho válido utilizar a expressão “típicos populistas”. A informação relevante seria “... que desconheceram medidas estruturantes para o desenvolvimento...”. Sendo assim, a frase ficaria muito mais adequada se fosse escrita do seguinte modo:
“São tipos que desconheceram medidas estruturantes para o desenvolvimento do Estado do Rio.”
Considero que o termo populista é maltratado pela academia. (...) vira e mexe aparece um texto para falar mal do populismo. Lá fora os textos são escritos pelo que podia ser visto como pessoas da esquerda. E a intenção é falar mal de Donald Trump. Para enquadrar-se em um conceito eles chamam de populista aquele que privilegia medidas de curto prazo de interesse da população sem levar em conta os efeitos de longo prazo.
O problema desse conceito é que nós vivemos em um mundo de ignorância tanto no curto como no longo prazo. E a ignorância de que eu falo não é a do cidadão. A ignorância é do acadêmico. No mundo das ciências humanas há pouco conhecimento para dizer que tal medida é boa no curto prazo, mas ruim no longo prazo.
Veja por exemplo o artigo “Populism and time inconsistency” de autoria de Mario Blejer e Piroska Nagy-Mohacsi, publicado em 22/1/2017 no Site Vox – CEPR’s Policy Portal e que pode ser visto no seguinte endereço:
Em nenhum momento os autores se referem à redução da inflação como um exemplo de medida adotada por políticos populistas. E na verdade trata-se de uma medida de anseio popular, e que é avaliada como benéfica para a população no curto prazo, mas que pode ser danosa para a economia no longo prazo. Será que os autores ousariam chamar os políticos que prometem abaixar a inflação de populistas?
Então considero equivocado fazer essa referência a Garotinho como um típico populista sem ficar bem esclarecido qual o significado dado na frase a tal palavra."

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