sábado, 31 de março de 2018

OLD CARTOON


Jean. (Cruzeiro, SP).
Em algum lugar do passado.

DONA BELINHA, O SONHO PELO TEMPO AFORA

Ilustração: Carybé.

Cidadezinha do litoral piauiense: quatro dias sem internet e sem jornalões, quatro dias longe da atribulada realidade que nos atormenta. Que bom.

Concluí a leitura de 'Lavando a alma' (100 páginas), com que a poeta e prosadora piauiense Leila Sampaio relata a trajetória de vida de Isabel Francisca dos Santos Pereira, Dona Belinha, que, ao longo do caminho, labutou por décadas lavando roupas no Parnaíba e engomando/costurando para terceiros e a família, o que lhe permitiu criar - na essência da palavra - a 'escadinha' de oito filhos, sem qualquer ajuda do pai dos rebentos, ausente antes e depois de abandonar os seus, e a despeito das dores permanentes que doença grave (ferida crônica no pé) lhe infligia, doença somente superada quando a morte se avizinhara.

E Dona Belinha, que em tenra idade decidiu por iniciativa própria lutar para alfabetizar-se (mesmo que precariamente), alinhava em um 'caderno-diário' impressões gerais sobre a vida e conselhos de mãe, avó e amiga a seus entes queridos, notinhas permeadas de sabedoria e religiosidade.

Foi muito gratificante conhecer Dona Belinha. Leila Sampaio produziu um livro simples e bonito, além de oportuno, sobre essa especialíssima mulher. Os familiares e os amigos de Dona Belinha estão de parabéns por haverem com ela convivido.

Ah, e muito obrigado à autora e aos amigos Marly e José Wilson por nos haverem distinguido com esse livro, que representa o testemunho de Isabel Francisca, aquela que, como disse Leila, "nunca desistiu do sonho pelo tempo afora".

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Concluída a leitura de 'Lavando a alma', e sem prejuízo, por óbvio, do lazer com minha família, iniciei a leitura de 'Homo Deus - Uma breve história do amanhã' (Companhia das Letras, 500 págs), de Yuval Noah Harari, que, pelas poucas páginas que li até agora, imprime um enfoque otimista relativamente ao que o futuro nos reserva. Mas, claro, para confirmar, só lendo a íntegra de 'Homo Deus...', o que, com o retorno às atribulações que nos atormentam, não será feito em curtíssimo prazo.

FELIZ PÁSCOA.

INGENUOUS CARTOON


Sérgio Paulo. (Do Maranhão).

GAZA: HAICAI DO DESESPERO

Jarbas.
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DORMINDO OU ACORDADA
A CRIANÇA É TORTURADA
PELO BICHO PAPÃO

SÁBADO DE ALELUIA 2018


J Bosco.

quarta-feira, 28 de março de 2018

NO PARAÍSO DOS AGROTÓXICOS...

                - Nós não podemos continuar nos contaminando assim!

Gatis Sluka. (Latvia).

DA INTOLERÂNCIA


Samuca.

DISSECANDO O MECANISMO


Nietzsche explica "O Mecanismo": série explora o veneno psíquico nacional do ressentimento

Por Wilson Ferreira

O diretor José Padilha rebate as acusações de “Fake News” à série brasileira Netflix “O Mecanismo” alegando que é uma obra de ficção: uma “dramatização” da Operação Lava Jato. Porém, como obra de ficção, Padilha atirou no que viu e acertou no que não viu: sem a prisão de Lula, planejada para a semana do lançamento de “O Mecanismo”, a série foi deixada por si mesma. Sem o apoteótico final que a impulsionaria, a série revelou ser feita do mesmo material de propaganda indireta da atual guerra híbrida brasileira – o envenenamento psíquico pela doença do ressentimento. Como narrativa ficcional, “O Mecanismo” nada mais é do que uma tentativa de transformar ressentimento, ódio e frustração dos protagonistas em valores estoicos, nobres e patrióticos. A grande “virtude” de “O Mecanismo” é ser uma prova de como a “doença do ressentimento”, a “condição mais perigosa do homem” para Nietzsche, transformou-se em matéria-prima de propaganda política indireta.

A concessão da liminar a Lula pelo Supremo Tribunal Federal nessa última quinta-feira melou o que seria uma perfeita bomba semiótica dentro do quadro atual de guerra híbrida que mal os brasileiros estão percebendo.

Na semana em que a plataforma Netlix lançava a série de José Padilha O Mecanismo (baseado nos acontecimentos da Operação Lava Jato), a presidente do STF Cármen Lúcia manipulava a pauta do Supremo para que Lula fosse preso nesses próximos dias. E, como planejado, tudo se encerraria numa entrevista com o juiz Sérgio Moro, no programa Roda Viva da TV Cultura de São Paulo, nessa segunda-feira. E (por que não?) dando a ordem de prisão ao vivo em uma final apoteótica para o distinto público.

Mas os juízes do Supremo adiaram tudo para depois da Páscoa. E restou para a série O Mecanismo tentar sustentar-se por si mesma, sem o bombástico contexto que seria criado com a prisão do líder trabalhista.

E deixada por si mesma, a obra de José Padilha não consegue se sustentar: a necessidade insistente de voice over para explicar buracos no roteiro e os sentimentos que motivam as ações dos personagens, roteiro sem sutilezas (Rigo, o Juiz Sérgio Moro de Padilha, lê um HQ chamado “Vigilante Sombrio”), protagonistas idealizados e pairando sobre o bem e o mal e um roteiro que mal esconde o desequilíbrio – embora, a certa altura, a narração em of reivindique à Justiça brasileira equilíbrio e imparcialidade.  

Sem a razão, motivo e propósito de sua existência (a prisão de Lula), O Mecanismo no entanto revela involuntariamente um segredo: a matéria-prima psíquica que foi mobilizada pelas bombas semióticas, nos últimos anos, para produzir aquilo que o russo Andrew Korybko chama de “caos sistêmico” ou “caos estruturado” na sua obra “Hybrid Wars: The Indirect Adaptive Approach to Regime Change” (clique aqui, em inglês) – o envenenamento do psiquismo nacional pelo mecanismo regressivo do ressentimento.


Imprecisões oportunas


Todas as oportunas “imprecisões” na série (por exemplo, fala-se do esquema de corrupção do “Banco do Estado” que teria começado em 2003 – na verdade, o caso Banestado começou nos anos 1990 nos governos FHC) podem ser interpretadas como “licença poética” como logo no início Padilha alerta aos espectadores: “essa é uma obra de ficção livremente adaptada... etc.”.

Porém, como obra de ficção é uma perfeita e didática bomba semiótica por expor, in natura, o esgoto psíquico de onde foi retirado todo o ressentimento que alimentou mal estar, ódio, intolerância, polarizações cuja propaganda indireta da guerra híbrida deu forma e sentido... ou seja, o “caos estruturado” do qual se refere Korybko.

O tema central da série é o ressentimento, muito mais do que uma suposta dramatização da Lava Jato. O que comprova a natureza da produção Netflix: é mais um veículo de propaganda, como muitos outros desde 2013, a incutir o ódio e o ressentimento como doença psíquica nacional que legitimou todo o golpe e a crise política.

Tirando os vilões (doleiros, empreiteiros e as caricaturas de Lula e Dilma Rousseff), todas as motivações dos “mocinhos” são originadas no ressentimento – o ódio e desejo de vingança por descobrirem que “Deus não é brasileiro”, que a Justiça não existe, por descobrir que depois de 20 anos de trabalho na Polícia Federal o protagonista vai apenas receber migalhas de auxílio-doença da Previdência.

Ou por dó por ver “heróis anônimos” levando uma vida miserável enquanto doleiros enriquecem e sustentam “as mais caras campanhas eleitorais à presidência”... Logicamente, as campanhas das parodias de Lula e Dilma.  

Por isso, a obsessiva necessidade narrativa de voice over para tentar explicar as motivações dos protagonistas. É a única maneira dos criadores José Padilha e Elena Soarez tentar atribuir alguma motivação nobre, patriótica ou estoica para os heróis. Mas o que as imagens nos mostram mesmo é o mesmo envenenamento psíquico que a propaganda indireta da Guerra Híbrida (as “bombas semióticas”) inoculou nos corações e mentes de uma nação.


A série


A dupla Padilha e Soarez também tenta nos vender a ideia de que o tal “mecanismo” do título está por trás de tudo como “um câncer” como obsessivamente repete o policial federal Marco Ruffo (Selton Mello): na esquerda, na direita, na presidência, na empresa estatal, na “cervejinha” paga ao policial, na falsa carteirinha de estudante.

Mas o “câncer” mesmo está no clone de Lula: ele fala em “estancar a sangria” da Lava Jato e em “grande acordo nacional”. Na verdade, quem usou essas frases foi Romero Jucá no infame diálogo com Sérgio Machado... Mas, afinal, quem se importa? Ele já estaria preso, não fosse a “tremedeira” do STF. O que daria um belo empurrão promocional à série.

Ruffo fica obcecado pelo esquema corrupto do doleiro Roberto Ibrahim (Enrique Diaz). Junto com a sua companheira de investigações e aprendiz Verena (Croline Abras), Ruffo descobre um gigantesco mecanismo de corrupção envolvendo, logicamente, todo o fornecimento de dinheiro para as campanhas eleitorais de uma alusão ao PT e superfaturamento na “Petrobrasil”.

Padilha e Soarez fazem questão de reforçar ao espectador o contraste entre a vida contida financeiramente do herói (“levei 20 anos para dar um carro para minha esposa”, lamenta Ruffo), numa casa humilde e com uma filha que necessita de cuidados especiais, e as cifras milionárias manipuladas pelo doleiro Ibrahim.

Ruffo não se conforma em olhar para sua esposa e filha como um perdedor e a precária vida material que consegue dar a elas. Sua motivação profunda é a vingança, a justiça custe o que custar. Ressentido, sofrendo derrotas atrás de derrotas, sente-se paralisado pela Justiça (“às vezes tenho vontade de meter uma balas na sua cabeça!”) e quase a dupla Ruffo/Ibrahim se transforma na dupla atormentada Batman/Coringa do cinema e das HQs.


Ressentimento como arma política


Ressentimento sempre foi uma arma da propaganda política. Para Nietzsche, o ressentimento se transforma em doença quando as forças ativas perdem a capacidade de atuar e o indivíduo deixa-se contaminar. Então a sede de vingança começa a ganhar forma e buscar por um sentido.

E a propaganda política com seus bodes expiatórios e soluções finais está sempre atenta: golpes, intervenções militares, sanha persecutória, linchamentos etc oferecem a tradução política para essa doença.

Para Nietzsche, o ressentimento surge da oposição entre duas visões de mundo: a ativa, aceitar o mundo como é e tentar adaptar-se a ele aplicando seus instintos; e a reativa, que não aceita esse mundo e nega os instintos por pertencerem a esse mundo.

Logo cresce o sentimento de que alguma coisa é a culpada pela inércia, paralisia e o mal-estar. De imediato vem a ideia de vingança, mas é necessário agir. O que foge da capacidade do ressentido. 

O ressentimento é introjetado, criando o ódio – a matéria-prima à espera de uma tradução em um slogan, uma campanha, um bode expiatório. Mas, principalmente, à espera de alguém que, por delegação, faça o trabalho de vingança: um herói, um vingador que esteja acima do bem e do mal. Acima da Lei, da Constituição, do Estado de Direito – na verdade, para o ressentido, instituições que só dificultam a justiça.


O Mecanismo gasta os primeiros episódios para descrever esse cenário de impotência, esforço e sacrifício de destemidos investigadores federais e do Ministério Público (destacando o caso de um policial que veio da favela e graças ao esforço e mérito tornou-se um servidor público), da tragédia pessoal e familiar de Ruffo até os esforços inúteis daqueles que lutaram toda uma vida para serem servidores concursados. Enquanto doleiros e políticos corruptos se locupletam em dinheiro e poder.

Tudo para criar esse quadro de frustração e ressentimento. Na verdade, O Mecanismo tenta transformar em motivações nobres a doença do ressentimento que tanto Nietzsche denunciava.

Doença que levou o País a ficar eletrizado pelo espetáculo de meganhamento da Justiça, com policiais federais encapuzados empunhando escopetas negras, ao vivo na TV.

A dupla de criadores Padilha e Soarez atirou no que viu e acertou no que não viu. Se a “dramatização” da Operação Lava Jato foi paródica e tosca, por outro lado O Mecanismo é um documento exemplar do espírito do seu tempo: o ressentimento em estado bruto explorado como arma semiótica política.

A Guerra Híbrida ainda está em curso até o seu objetivo final: ódio, ressentimento e medo como atmosfera psíquica dominante que (tornará), para os cidadãos, até razoável o impedimento das eleições desse ano. Afinal, não foi para isso que foi dado o golpe político?  -  (Fonte: Cinegnose - AQUI).


Ficha Técnica 

Título:  O Mecanismo (série)
Criador: José Padilha
Roteiro: Elena Soarez
Elenco:  Selton Mello, Caroline Abras, Enrique Diaz, Antonio Saboia, Otto Jr.
Produção: Zazen Produções
Distribuição: Netflix
Ano: 2018
País: Brasil


Postagens Relacionadas










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Dica de leitura

"Na Folha, mais um capítulo da desonestidade de Padilha", por Luis Felipe Miguel.  -  (AQUI).
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ADENDO em 02.04:

Clique AQUI para conferir o vídeo "ENTREVISTA COM WILSON FERREIRA"/'Editor do Cinegnose fala sobre O Mecanismo' - Na redação do Brasil 247.

INGENUOUS CARTOON


Genildo.

DE OLHO NO VÍDEO


Dica de vídeo

"Pasmem! Moro propõe mudar cláusula pétrea da Constituição, diz Solnik"  -  AQUI.

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O inciso IV, § 4º do artigo 60 da Constituição Federal é incisivo: emendas tendentes a abolir os direitos e garantias individuais NÃO podem nem sequer ser objeto de deliberação, ou seja, estão terminantemente descartadas. A presunção de inocência é um direito individual, logo... Pois o juiz Sérgio Moro aventou, em entrevista ao programa Roda Viva de anteontem, na TV Cultura, a possibilidade de que a CF, mediante emenda, passe a determinar a prisão do réu após condenação em segunda instância. Ora, a alternativa, como já dito, é inviável.  Só uma nova Constituinte, um novo Poder Constituinte Originário... 
(E olha que nem sequer tocamos na questão da proibição do retrocesso...).

Nota: 
Ao fim e ao cabo, o juiz, com sua manifestação, admitiu  que a prisão do réu após condenação em segunda instância é inconstitucional. Como, aliás, o STF emite fortes sinais em sentido idêntico, o que será bem vindo.

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Traiko Popov. (Bulgária).

terça-feira, 27 de março de 2018

O DESMANCHE DA CONSTITUIÇÃO


"A Constituição de 1988 tornou-se exaurida e ineficaz a partir do afastamento de Dilma Rousseff da presidência da República, dadas a forma e as circunstâncias em que transcorreu o processo político e jurídico do impeachment, com a manipulação da Constituição para atender interesses casuístas e derrocar a democracia.

Atacada frontalmente, a CF/1988 não foi capaz de assegurar a democracia nem de manter a estabilidade política no país e, assim, as instituições políticas também se desmancharam com o impeachment pois seus membros não perceberam o papel que lhes foi delegado pelo constituinte para impedir o caos.

Os membros das instituições políticas promovem a dissolução de suas funções e impõem o fim trágico do Estado brasileiro, que não consegue mais assegurar o consenso do pacto político de 1988.

Da mesma forma que a CF/1988 hoje só existe no papel, também as instituições políticas não mais dispõem de legitimidade e respaldo popular; vale lembrar que foi do espírito da vontade popular que se acendeu a força nacional que exigiu o fim do regime de 1964-1985.
A CF/88 tem sido esvaziada nos seus propósitos originais desde que governos anteriores aprovaram reformas que levaram a termo a defesa da soberania nacional e dos valores sociais do trabalho e da dignidade humana, como o fim do conceito de empresa brasileira, o monopólio do petróleo, as reformas previdenciárias e as privatizações sem ampla discussão com a sociedade.
O atual governo decidiu dar fim a quase trinta anos de tentativas de se constituir no Brasil “uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social,” conforme a CF/1988.
Na teoria jurídica tem sido difundida uma corrente de pensamento que busca mitigar a racionalidade do Direito, transpondo-o para uma categoria de natureza empírica, como fato social. Segundo este pensamento, o aspecto realista do Direito se manifesta mediante o entendimento firmado pelos tribunais, principalmente os superiores, que julgam em definitivo as questões constitucionais.
Pela construção da teoria do fato social empírico, o Direito torna-se o que os tribunais venham a pronunciar em caráter definitivo. Essa corrente atende aos interesses da hegemonia, que, pelo consenso, tenta estabelecer uma ordem política imposta de cima para baixo, executada por burocratas, sem necessidade de respaldo na soberania popular e para que a máxima “todo poder emana do povo” perca o seu sentido histórico e finalista.
Assim, certos meios de comunicação difundem que o século XXI é do protagonismo judicial e rebaixam e desmoralizam as instituições políticas, como os parlamentos e os governos, nos quais ainda resta algum grau de vontade popular capaz de impedir, mesmo que temporariamente, reformas prejudiciais aos interesses da população, como a previdenciária.
Para a ordem atualmente em curso, é normal que bancos promovam jantares e eventos sociais e culturais para juízes; ou que juízes façam protestos e ameaças de greves visando a manutenção de benefício por moradia que atenta contra a moralidade jurídica; ou que juízes possam interferir em atos de governos, como a concessão de indulto de Natal. Em igual situação, os militares estão nas ruas a executar atribuições da polícia.
Fica evidente que não há mais eficácia da CF/1988, que proíbe tais comportamentos, tolerados como normais; da mesma forma que a Suprema Corte aceitou o julgamento de Dilma Rousseff pela Câmara dos Deputados e depois pelo Senado, num nítido desvio de suas funções para perseguir interesses contrários à democracia.
A CF/88 passou a ser manuseada e lida conforme interesses alheios ao espírito que a originou, promovendo seu desmanche e tirando sua eficácia; o mesmo nas instituições políticas por ela criadas para o funcionamento do Estado.
No cenário atual, temos juízes que asseguram a manutenção de uma ordem jurídica ilegítima, que não é a mesma estabelecida pela CF/1988, que deve ser resgatada. Assim, é preciso deixar claro que a suposta ordem jurídica constitucional, que se alega estar em vigor, está sendo usada para favorecer interesses contrários ao país e estranhos à formação original do pacto político de 1988, que, ao nosso ver, já não mais existe."



(Jorge Rubem Folena, post intitulado "O desmanche da Constituição", publicado no Jornal GGN - AQUI. Folena é advogado e cientista político.

Ficamos a pensar sobre quantas vezes fizemos registrar neste blog impressões acerca do tratamento conferido à Constituição em determinadas circunstâncias, bastando lembrar:  "Jamais poderá dar certo um País que de alguma forma despreze a sua Carta Magna", "Ultimamente, esses que teimam em defender a supremacia da Constituição são considerados elementos abaixo de qualquer suspeita", "O que dizer sobre um País em que um juiz de base pratica os mais chocantes excessos, verdadeiras agressões contra a Carta da República, e tem suas atitudes integralmente respaldadas por seus superiores imediatos?" - Etc.

Permitimo-nos dissentir de alguns pontos destacados pelo articulista, como o inicialmente alinhado. A Constituição já demonstrava sinais de exaustão e ineficácia antes mesmo do impeachment da presidente Dilma Rousseff. Afinal, como esquecer, p. ex., a invocação da Teoria do Domínio do Fato [no curso da AP 470], procedimento relativamente ao qual um de seus principais mentores, o jurista Claus Roxin, fez críticas para lá de contundentes?).

COMO TORPEDEAR A DEMOCRACIA


Veronezi.

A PENÚLTIMA SOBRE O MECANISMO


Thiago.

ECOS DO MECANISMO

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É como diz um velho amigo: Na infância, acostumei-me a curtir gibis em que heróis do Velho Oeste americano se esmeravam na "arte" de exterminar índios e búfalos aos borbotões, a vibrar diante da 'usurpação diplomática' de áreas pertencentes ao México (aqui), a reagir com indiferença 'diante' de chineses e outros asiáticos submetidos a trabalho escravo nas minas de ouro e prata e nos fronts de construção de estradas de ferro do Oeste Selvagem... E a despeito de tudo isso escapei!  
O velho amigo diz isso, mas admite o óbvio: Nos dias correntes, 'graças' ao furor geopolítico-cultural de Tio Sam, o buraco é muito mais embaixo! Os tentáculos nem remotamente lembram os 'inocentes' gibis de antigamente.
....
Nota: Há quem - com razoáveis argumentos - considere ser o caso de parar de dar bolas ao tal O Mecanismo e à própria Netflix. Veja, a propósito,  o que dizem AQUI Wellington Calasans e Romulus Maya, titulares do Duplo Expresso, a partir de 1h:17.


O mecanismo da dominação

Por Carlos Motta

Cancelar a assinatura da Netflix, como fiz, por causa da canalhice produzida por eles sob o disfarce de uma série televisiva, é apenas uma atitude simbólica - mesmo que outros milhares façam como eu, a Netflix continuará a existir, a faturar bilhões de dólares e a produzir obras de propaganda do american way of life, pois afinal, ela existe para isso.
Num chute por alto, 80% de que exibe, seja séries de televisão, dramas, comédias, ficção científica, policiais etc etc, faz parte do que se chama de "soft war", guerra suave, ou seja, é instrumento de dominação dos Estados Unidos, o grande império contemporâneo, sobre os outros povos e culturas.
Os americanos fazem isso desde que o cinema foi inventado, desde que se iniciou o processo de gravações musicais, desde sempre. 
Hollywood é uma fantástica fábrica de ilusões - nela se fabricam os sonhos de que somente os Estados Unidos são capazes de proporcionar às pessoas a liberdade, o luxo, a riqueza, a felicidade, os carrões ultravelozes, as mulheres de tirar o fôlego, a vida esplendorosa, enfim, que todos almejam.
O trabalho de Hollywood e da indústria de entretenimento dos EUA é incomparável. 
Sem disparar um tiro real, subjugou nações inteiras, bilhões de almas e corações, para a ideologia que evidencia o self made man, a "meritocracia", o egoísmo, a democracia representada por dois partidos quase gêmeos, a supremacia do homem branco sobre os de outra cor de pele, o destino inexorável de ser o dono do planeta.
E transformou, a bel prazer, quem nada contra a corrente, em inimigos desprezíveis, abjetos, monstruosos - alguém já viu, por exemplo, um russo que não seja mafioso, violento, um verdadeiro facínora, nessas produções hollywoodianas?
A série sobre a "corrupção" brasileira, que mereceu forte investimento publicitária em seu lançamento, nada mais é do que uma peça desse enorme mecanismo de dominação cultural - e econômica, é bom lembrar - americana.
Os seus autores apenas trocaram os papéis dos vilões - saem os russos, chineses, iranianos, norte-coreanos e muçulmanos, e entram os esquerdistas brasileiros, esses seres corruptos até a medula. 
É um enredo que dá sono, de tão batido.  -  (Aqui).

NONSENSE CARTOON


Constantin Ciosu. (Romênia).

segunda-feira, 26 de março de 2018

O HORRÍVEL CASO DE FAKE NEWS SOBRE PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA


Jurista e jornalista fazem fake news sobre presunção de inocência

Por Lenio Luiz Streck (Na CONJUR Revista Consultor Jurídico)

Para adoçar o gosto de quem costuma ler apenas o título ou o início de textos, aviso: o texto é sobre um advogado (José Paulo Cavalcanti Filho) e um jornalista (Merval Pereira), que publicaram fake news. Para usar a palavra da moda: horrível.
Ao trabalho. Sem bílis e sem mau sentimento. Escrevi, na semana passada, coluna contestando uma “pesquisa Colgate”, pela qual, dos 194 países do mundo, 193 não têm presunção da inocência como o Brasil. A “tese” foi espalhada pelo jornalista Merval Pereira, que a copiou do professor e advogado José Paulo Cavalcanti Filho[1] (ler aqui).
Outros jornais, jornalistas e jornaleiros repetiram a comédia. Horrível [sic]. Imaginemos que o professor ou o jornalista fossem médicos, e espalhassem uma notícia tipo “68 países aboliram a vacina contra o sarampo — o substituo é um chá revolucionário descoberto no Butão”. Provavelmente, a Associação dos Médicos faria um comunicado e uma advertência aos dois esculápios, censurando-os face à falsidade da notícia.
Em face da repercussão da “pesquisa” (nas rádios os locutores diziam, Brasil afora: “só no Brasil! Jurista e jornalista desmascaram a farsa da presunção” e coisas desse tipo), a OHB (Ordem dos Hermeneutas do Brasil) decidiu fazer uma nota-carta dirigida a Merval e Cavalcanti. Eis:
Aos senhores José Paulo Cavalcanti Filho e Merval Pereira.
Tendo em vista a pesquisa divulgada em diversos veículos de comunicação, afirmando que, “na ONU, 193 dos 194 países têm prisão em 1ª ou 2ª instância”, vimos repor a verdade acerca do tema. E também informar, aos que leram e acreditaram, que a tal pesquisa não existe. É fake news.[2] É fake research. O jurista e o jornalista fizeram uma coisa fake. Isso é horrível.
Como informa (aqui) o professor Emilio Peluso Meyer — Prêmio Capes de Tese em 2013 —, ‘[a] presunção de inocência aparece em inúmeras normas de Direito Internacional e, pode-se dizer, integraria o acervo hoje produzido pelo constitucionalismo em geral. Assim, o artigo 11 da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão a prevê; o artigo 14.2 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966 menciona o direito; o artigo 6.2 da Convenção Europeia de Direitos Humanos traz a norma; o artigo 8º, n. 2, da Convenção Americana de Direitos Humanos, também disciplina e garante a presunção de inocência. Em todos esses dispositivos, as normas remetem à disciplina legal para pormenorizar tal direito, por vezes utilizando a expressão ‘according to law’. Em termos comparados, inúmeras Constituições estabelecem tal direito fundamental e, de seu turno, remetem para a regulamentação legal.
Algumas Constituições associam presunção de inocência e coisa julgada. A Constituição da Albânia de 1998 exige uma decisão final para colocar de lado a presunção de inocência (artigo 30); a Constituição de Angola de 2010 fixa a presunção de inocência até que a decisão final seja alcançada pela res judicata (artigo 67, n. 2); a Constituição da Bulgária de 1991 (artigo 31, n. 3), também exige decisão final; a Constituição da Croácia de 1991, no artigo 28, menciona o julgamento final como requisito para afastar a presunção de inocência; também assim dispõe o artigo 69, n. 3, da Constituição da República Dominicana de 2010; igualmente, assim o fazem a Constituição do Equador de 2008 (artigo 76, n. 2); da Itália de 1947 (artigo 27); da Polônia de 1997 (artigo 42, n. 3); de Portugal de 1976 (artigo 32, n. 2); da Romênia de 1991 (artigo 23, n. 11); e, é claro, assim o dispõe a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (artigo 5º, inc. LVII), tratando-o como princípio da não-culpabilidade até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.”
E segue Peluso Meyer: ‘[n]o sistema jurídico estadunidense, a cláusula derivaria do sistema instituído pela Constituição de 1787. Em Coffin v. United States, 156 U.S. 432 (1895), a Suprema Corte estadunidense havia decidido e dado conformação à presunção de inocência (presumption of innocence) no sistema jurídico daquele país. Decorre da decisão o famoso adágio de que o condenado só pode ser assim reconhecido ‘beyond reasonable doubt’: este seria um efeito da prova produzida no processo, funcionando a presunção de inocência como obstáculo a ser superado e mesmo como meio de prova.’
‘É claro que há inúmeras questões contextuais a se analisar’ – continua o culto jurista Peluso Meyer – ‘e que demandam a verificação da prática dos tribunais e da legislação de inúmeros países. Entretanto, tais dados parecem questionar o que fora defendido no voto da ministra Ellen Gracie [e agora por Cavalcanti Filho e M. Pereira] no julgamento do Habeas Corpus (HC) 85.866, no sentido de que ‘Em nenhum país do mundo, depois de observado o duplo grau de jurisdição, a execução de uma condenação fica suspensa, aguardando o referendo da Corte Suprema' (p. 227). Parece haver um grau maior de complexidade na questão não captado pelo referido voto’. Veja-se que, ao que parece, Cavalcanti e Merval pegaram a tal ‘pesquisa’ desse voto da ministra. E, tanto o jurista como o jornalista, nenhum verificou a informação. Compraram gato por lebre. E o venderam.
Assim, saibam todos quanto este público comunicado virem, no ano da graça do nosso senhor Jesus Cristo de 26 de março de 2018, que não é verdade, mas não é verdade mesmo, que, dos 194 paises, só o Brasil cultua a presunção da inocência com fecho no trânsito em julgado”.
OHB (lê-se OAGAB — com acento no B) — Ordem dos Hermeneutas do Brasil, por sua presidência.
Espero que a matéria esteja devidamente esclarecida. Lamentavelmente, ambos, jornalista e jurista, caíram em uma armadilha. Como diz o psicanalista Mario Corso:
Boa parte do tempo, repetimos erros tolos. Depois que botamos algo na cabeça, aquilo organiza os dados externos para justificar a tese preliminar. Se a realidade não corroborar nossas teses, pior para a realidade.
Bom, depois de tudo isso, espero que pelo menos Merval faça uma retratação. Não se pode transformar fatos em relatos. Em pós-verdades. Claro que o Dr. José Paulo Cavalcanti Jr, sendo o professor e advogado respeitável que é, também poderia fazer o mesmo.
Post scriptum: Ainda quanto à questão de fato e questão de direito
A tese de que o segundo grau esgota a matéria fática é, efetivamente, insustentável. Querem ver? O próprio Supremo Tribunal Federal, no ano de 2016, disse o contrário.[3] Surpresa? Pois vejam o RE 306.188/PR: "Revertendo o relator do recurso extraordinário o quadro decisório formalizado na origem, há de julgar a causa por inteiro, alcançadas as despesas processuais". Bingo.
Portanto, peço que leiam a coluna da semana passada (Segundo grau esgota questão de fato? Será que no Butão é assim?) e, a ela, agreguem a carta da OAGAB, o artigo integral do jurista Peluzo Meyer e mais o julgado do STF sobre a impossibilidade de cisão entre questão de fato e questão de direito.

[1] Outra coisa que descobri pelo artigo de Cavalcanti Filho: para ele, o princípio da presunção da inocência...é um “preceito moral”. Sim. Assim mesmo. Consequentemente, como é moral, não precisa ser cumprido. Bom, isso explica o resto do artigo do aludido articulista. Além da pesquisa fake, acabou com o conceito de princípio.
[2] Quem quiser mais informações ainda, acesse minha Coluna da semana passada e leia o os comentários do leitor advogado Helder Braulino de Oliveira. É arrasador.
[3] Ver, nesse sentido, CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza. MEYER, Emilio Peluso Neder. RODRIGUES, Eder Bomfim. Desafios Contemporâneos do Controle de Constitucionalidade. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2012, p. 134.

CONJUNTURA 2018


Vitor Teixeira.

UM MERO REGISTRO


A doutrina jurídica é clara: embargo de declaração tem cunho meramente esclarecedor de eventuais omissões/obscuridades processuais invocadas pela parte interessada, não pode alterar a sentença em si, razão pela qual o despacho (unânime) do TRF4 contra o ex-presidente Lula - pena de 12 anos e um mês com prisão imediata - é definitivo em seu âmbito desde o nascedouro, e só o Superior Tribunal de Justiça (ou, em caso extremo, o STF, como se está a ver em face do pedido de habeas corpus ou mais adiante, caso o STJ indefira eventual recurso em seu campo) poderá alterá-lo ou extingui-lo, caso venha a acatar recurso que a defesa do réu interponha. Desde sempre isso é notoriamente sabido. Mas há pouco o Jornal Hoje noticiou o desfecho do julgamento, pelo TRF4, dos embargos declaratórios OMITINDO as particularidades acima destacadas, mas enfatizando a liminar concedida no dia 22 pelo STF suspendendo a execução de prisão imediata do ex-presidente, expressa na sentença 'declaratoriamente' embargada, enquanto se aguarda o julgamento sobre concessão de HC, previsto para o dia 4 de abril. Ou seja, ao não deixar claro que a sentença do TRF4 é/era definitivamente insuscetível de modificação desde a origem em sua esfera, o Jornal deixou no ar a possibilidade de a opinião pública fazer leitura diversa, até mesmo sobre 'novo incômodo' entre tribunais (como se a ratificação da sentença fosse uma 'resposta' ao que ocorreu no dia 22). Omissão, aliás, em que outros veículos, a exemplo do UOL (aqui), não incorreram.

Curioso, não? Fica o registro.

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Sugestão de leitura:
"Defesa nega inelegibilidade de Lula e diz que recorrerá de decisão", no UOL  -  AQUI.

TEMPO E CONTRATEMPO


Simanca.

ENQUANTO ISSO, NAS REDES DA DESÍDIA...


Duke.

A DESIMPORTÂNCIA DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

                   (O ator Henry Fonda faz, em 'O Homem Errado', o papel de um
                          músico confundido com o autor de um assalto a mão armada)

Destruição dos princípios: a presunção de inocência

Por Jorge Folena

Tenho sido um crítico ao realismo jurídico americano, uma doutrina relativa à teoria do direito que, a partir dos anos 20 e 30 do século XX, passou a entender que o Direito se manifesta por meio das decisões dos tribunais, em particular as Supremas Cortes de Justiça.
Para esta corrente de pensamento, o juiz não pode ser um mero aplicador das regras aprovadas pelos Parlamentos e Governos, devendo tomar as suas decisões, principalmente nos casos judiciais considerados difíceis, “de acordo com as suas preferências políticas ou morais”, como esclarece Ronald Dworkin, em sua obra “Levando os direitos a sério”.
A partir daí, ocorreu um gradativo esvaziamento na simples aplicação das regras jurídicas e prevaleceu um imenso grau de interpretação e aplicação de princípios jurídicos, que passaram a ser empregados segundo a convicção pessoal de cada juiz.
Com isto, as Cortes de Justiça deixaram de ser aplicadoras das normas jurídicas (regras e princípios) para tornaram-se criadoras de normas de Direito, que, em muitos casos, não estão previstas com clareza nos textos constitucionais nem nas demais leis e regulamentos produzidos pelas instituições políticas.
Além disso, neste mesmo embalo, os movimentos sociais e grande parcela da sociedade civil passaram a depositar as esperanças de concretização de seus objetivos nas mãos dos Tribunais, em razão da ausência de resposta política a suas demandas políticas, sociais e econômicas, o que deu origem ao fenômeno da judicialização da política.
Contudo, não será jamais nas Cortes de Justiça que os problemas políticos poderão ser solucionados, mas sim nos espaços públicos, nos parlamentos e nos governos, mediante a atuação  das pressões que somente a sociedade pode exercer sobre os políticos.
O descrédito na política, como se vê hoje por todo o mundo, traz em si o fracasso da sociedade, cujos integrantes não conseguem se organizar nem impor a ordem para fazer prevalecer seus interesses.
O que se constata atualmente é que as pessoas estão se desinteressando da vida política e permitindo que os espaços públicos sejam ocupados por indivíduos que jamais irão trabalhar para o benefício da coletividade,  pois representam os interesses dos mercados e de outros grupos privados.
Assim, é mais fácil para os cidadãos ficar acomodados, protestando à distância e entregando a solução de seus problemas nas mãos da burocracia, principalmente a judicial e aquelas constituídas pelas demais forças repressivas, como o ministério público e a polícia.
Contudo, as referidas instituições não foram criadas para serem o centro da arena política. Isto porque constituem entes estatais auxiliares, que existem para facilitar o controle e o exercício do poder pelo Estado e, sendo assim, podem agir contra os interesses da coletividade e em favor dos interesses dos grupos dominantes que se tenham apropriado da condução da política.
Quando um determinado Estado passa a ser controlado dessa forma, o que se tem observado é que os direitos liberais fundamentais, constituídos em proteção  e defesa da sociedade civil, passam a não ser mais respeitados. Assim, o habeas corpus e a própria presunção de inocência passam a ser aplicados com restrições ou são até mesmo negados em sua plenitude.
Não é crível que o habeas corpus, instrumento jurídico criado para dar proteção máxima contra as arbitrariedades praticadas ante o direito natural de ir e vir,  possa ser limitado por questões meramente formais e até mesmo morais, como se tem visto nos discursos e votos de juízes da Suprema Corte do Brasil.
Pois o habeas corpus é um instrumento processual que visa garantir a liberdade das pessoas e deve ser analisado em qualquer hipótese para se saber se um determinado indivíduo – quem quer que seja – está sofrendo uma violência por parte das instituições estatais.
Da mesma forma, não se pode limitar a presunção de inocência enquanto não transitar em julgado uma pretensão criminal contra um cidadão.
Nesse ponto, para entendimento geral, proponho que seja feita a seguinte reflexão: “se uma ação viola um direito fundamental, isto significa que, do ponto de vista dos direitos fundamentais, ela é proibida”. É o que diz Robert Alexy, na obra Teoria dos Direitos Fundamentais.
Significa dizer que o princípio da presunção de inocência não pode ser rebaixado pelo mero direito de prender. Infelizmente, por questões de política, pessoas estão sendo presas sem a conclusão do julgamento final por um tribunal superior, como asseguram as normas internacionais a que o Brasil aderiu, como o Tratado de Direitos Humanos de São José da Costa Rica.
É inaceitável que princípios fundamentais que constituem o próprio cerne dos direitos estendidos pelo Estado para garantia dos cidadãos (de qualquer cidadão!) sejam desrespeitados por representantes de instituições criadas meramente para instrumentalizar a ação do Estado na construção do bem-estar coletivo.
Isto porque o Estado não existe por si só e, se existe e manifesta qualquer ínfima medida de poder, todo o poder que detém emana de quem o constituiu em primeiro lugar: o povo, e não as instituições, que lhes devem total obediência.  -  (Aqui).
(Jorge Folena é advogado e cientista político).

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"...proponho que seja feita a seguinte reflexão: 'se uma ação viola um direito fundamental, isto significa que, do ponto de vista dos direitos fundamentais, ela é proibida'. É o que diz Robert Alexy, na obra Teoria dos Direitos Fundamentais.
Significa dizer que o princípio da presunção de inocência não pode ser rebaixado pelo mero direito de prender. Infelizmente, por questões de política, pessoas estão sendo presas sem a conclusão do julgamento final por um tribunal superior, como asseguram as normas internacionais a que o Brasil aderiu, como o Tratado de Direitos Humanos de São José da Costa Rica."

O problema, no Brasil, é que até o cidadão comum vem "agindo por conta própria", extrapolando o estilo do juiz norte-americano: condena 'de cara' o acusado da prática de crime, especialmente se esse acusado for seu oponente, e tudo, claro, à vista de suas convicções pessoais. Se acontece de esse acusado virar réu e em seguida ser condenado pela Justiça, ótimo. Mais: não interessa essa história de ter havido ou não desrespeito a esse ou aquele direito individual. Presunção de inocência? Sem essa. Está feito, dane-se. E se ocorre a 'fatalidade' de o condenado lograr algum êxito em face de eventual recurso impetrado no tribunal de origem ou na instância superior, aí a porca torce o rabo! Mas, como?! Como é que meu desafeto conseguiu essa benesse? Que absurdo é esse? Que vagabundagem é essa?! Veja-se, a propósito, o que está acontecendo presentemente.