Facebook ou Faustbuch?
Por Fábio de Oliveira Ribeiro
O novo escândalo envolvendo o Facebook resultou em prejuízo econômico e ações judiciais dentro e fora dos EUA. Não é a primeira vez que Mark Elliot Zuckerberg é tragado para o centro de um furacão judiciário. Desde que criou o website, ele já se envolveu em outras disputas.
A primeira delas foi retratada no filme A Rede Social (2010) e dizia respeito à propriedade intelectual e comercial do website. Após a celebração de acordos milionários com seus adversários, Zuckerberg ficou livre para expandir ainda mais o Facebook.
Acusado por Edward Snowden de fornecer informações dos seus usuários para a NSA, o Facebook foi intensamente criticado dentro e fora dos EUA. Todavia, ele não estava sozinho. Google e Windows também foram acusados de facilitar a vida dos espiões cibernéticos norte-americanos. Após pedir desculpas e afirmar que deixaria de compartilhar dados com a agência norte-americana, Zuckerberg seguiu em frente e nós também.
Em pouco tempo o que nasceu como uma plataforma de relacionamento entre universitários norte-americanos se tornou um fenômeno mundial envolvendo pessoas de todas as classes sociais. O Facebook passou a ser utilizado por organizações políticas não governamentais e ajudou a derrubar governos. Ele possibilitou a primavera árabe e a rebelião violenta que resultou na ascensão do nazismo na Ucrania.
A percepção de que o Facebook poderia estar sendo utilizado para manipular as eleições brasileiras me ocorreu a mim pela primeira vez em meados de 2014. Na época, porém, ninguém prestou muita atenção ao que eu disse, pois todos os candidatos estavam utilizando freneticamente o website de Zuckerberg para disputar a atenção do eleitorado.
O tempo passou e confirmou minhas suspeitas. As primeiras manifestações contra Dilma Rousseff no Brasil começaram com as passeatas contra o aumento da passagem de ônibus convocadas justamente através do Facebook. É fato: a onda de ódio que assola o Brasil e resultou no assassinato da vereadora do PSOL semana passada começou e se propagou no Facebook.
A crise atual poderia ser considerada uma repetição daquele episódio envolvendo a NSA. Mas agora Zuckerberg está sozinho e ele não foi acusado de fornecer dados dos usuários a uma agência governamental dos EUA e sim a uma empresa privada que prestou serviços para a campanha de Donald Trump. A aquisição de dados da Cambridge Analytica por uma empresa russa ligada a FSB é, sem dúvida alguma um complicador. Especialmente nesse momento em que a paranoia anti Rússia tem sido alimentada pela mídia norte-americana.
O Faustbuch, uma coleção de narrativas anônimas sobre as peripécias do Doutor Fausto, foi publicado pela primeira no final do século XVI. O tema foi explorado por Marlowe na Inglaterra alguns anos depois. No século XIX Goethe publicou a versão mais refinada e festejada da saga do personagem. Fausto faz um acordo com Mefistófeles, mas o sucesso que ele alcança sempre contém as sementes do fracasso e da tragédia. Mefistófeles tem sua própria agenda e sempre proporciona a satisfação de um desejo ligeiramente diferente daquele que foi enunciado por Fausto.
Mark Zuckerberg também conseguiu algo diferente do que desejava. O mesmo pode ser dito das pessoas e dos políticos que utilizam e utilizaram o Facebook. A primavera árabe despedaçou diversos países e nenhum deles conseguiu recuperar a sanidade política e o bem-estar econômico. O mesmo pode ser dito da Ucrânia e do Brasil.
Mas não se enganem, Zuckerberg não é o único culpado. Nós mesmos fornecemos ao Facebook tudo aquilo que foi utilizado contra os nossos interesses. A rede social é fáustica porque todos nós somos fáusticos. E nem mesmo a queda da Cambridge Analytica, de Donald Trump e do próprio Facebook conseguirá modificar nossa natureza. - (Aqui).
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