quinta-feira, 31 de março de 2016

VIVA A DEMOCRACIA

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Salve a Democracia!



Hoje, 31 de março de 2016, manifestações no Brasil e diversos outros países!

Viva a Democracia!

(Localizei o mapa AQUI - onde se destaca exortação do combativo jornalista Fernando Brito).

A MOBILIZAÇÃO PELA PRESERVAÇÃO DA DEMOCRACIA


O xadrez do #NãoVaiTerGolpe

Por Luis Nassif

O fator golpe

Não vai ter golpe por uma razão: a opinião pública entendeu que a tentativa deimpeachment de Dilma Rousseff é golpe. Simples assim.
A partir do momento que se consolidou essa percepção, redes sociais e até jornais foram invadidos por manifestações do grande meio de campo que se mantinha afastado do jogo. Não se tratava mais de defender uma presidente impopular, mas a própria democracia.
Dos quatro cantos do país chegaram as manifestações, dos cantos de guerra das ruas, à volta dos cantores referenciais, dos poetas, juristas, intelectuais, artistas em defesa da democracia. A bandeira das diretas voltou a tremular, sendo oficialmente apresentada à rapaziada, que fará sua estreia política com a mais bela das bandeiras: a defesa das regras do jogo democrático.
Bem que a Globo tentou de todas as maneiras legitimar o golpe, recorrendo a um expediente indigno do exercício do jornalismo.
Primeiro, ouviu vários juristas, entre os quais alguns membros do Supremo Tribunal Federal, perguntando se impeachment é golpe. Evidente que não é: está previsto na Constituição. A questão central é: impeachment sem justificativa constitucional é golpe?
A resposta veio do Ministro Marco Aurélio de Mello: se não houver justificativa prevista na Constituição, é golpe. Aí o que faz a Globo? A repórter colhe a declaração, em uma coletiva, mas no meio do texto inclui o seguinte parágrafo:
O depoimento de Marco Aurélio diverge de outros cinco ministros do Supremo (Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski), que já disseram que o impeachment é um instrumento legítimo para viabilizar a responsabilização política de qualquer presidente da República.
É falso. Os cinco outros ministros falaram genericamente sobre a figura constitucional do impeachment. Mello analisou especificamente a circunstância de um impeachment sem justificativa constitucional. (http://migre.me/too58
É curioso esse padrão de jornalismo tendo as redes sociais como contraponto. Apenas reforça no conjunto de leitores/telespectadores as suspeitas de manipulação. E um desperdício inútil de credibilidade.
De repente, a opinião pública se viu frente a um coro cada vez mais amplo, de que o impeachment é golpe. Na ponta do golpe, um grupo de parlamentares ostensivamente suspeitos. E, pelas torneiras da mídia, os vazamentos sobre o pacto que está sendo amarrado, de conseguir o impeachment e, em seguida, o fim da Lava Jato.
Foi nesse quadro épico que o comandante Eduardo Cunha colocou no alazão o vulto de Michel El Cid Temer, abriu os portões da cidadela do PMDB e entoou um grito de guerra de três minutos antes que as tropas avançassem sobre os exércitos adversários.
E a tropa não avançou.
O fator PMDB
Até na vida pessoal há momentos de impasses que paralisam qualquer decisão. Fica-se em uma situação incômoda, mas paralisado pelo medo de decidir. Rompido o impasse, voluntariamente ou por algum evento externo, sobrevém o alívio.
É este o clima no Palácio do Planalto, depois do (suposto) desembarque do PMDB do governo Dilma. Foi um desembarque fulminante, com três minutos de aclamação e palavras de ordem contra a presidente. Entusiasmado, Michel Temer anunciou uma maratona vitoriosa por todo o país, preparando o PMDB para a nova fase de ouro. Saiu do encontro preparando-se para conquistar o Brasil. E, na porta, viu-se só.
Passado o porre, veio a ressaca. Os ministros do PMDB recusaram-se a sair do governo. Houve reunião à noite, na casa do presidente do Senado Renan Calheiros, onde o PMDB conseguiu chegar ao ponto máximo do fisiologismo: romperia com o governo, mas manteria seus Ministros. Se continuar assim, Temer conseguirá entrar para a história como o coveiro do mais longevo dos partidos brasileiros.
No Planalto, atribui-se a mosca azul de Temer a Eduardo Cunha. Enquanto em segundo plano frente a Sérgio Cabral, Cunha era um negociador hábil, atuando nos bastidores. Quando assumiu a presidência da Câmara, entrou em alfa e contaminou Temer com sua megalomania. Temer tornou-se quase uma criatura de Cunha.
Obrigado a sair da inércia, o Palácio passou a contabilizar os resultados do desembarque do PMDB. E, para sua surpresa, constatou que saiu no lucro.
O PMDB tinha 7 Ministros e garante, no máximo, 30 votos contra o impeachment, de sua bancada de 69 parlamentares.
A base ideológica do governo - PT, PCdoB, parte da Rede e do Psol - contabiliza 80 votos. A parte ideológica do PDT garante mais 10 votos. Ficam faltando 80 votos a serem conquistados nos 400 deputados restantes.
Se os partidos da base garantirem 10 votos, chega-se aos 170 necessários para barrar o impeachment. Os líderes falam em garantir de 15 a 20 votos por partido.
Sem o PMDB, o governo terá uma cota de 5 ministérios para repactuar com os demais partidos e recuperar os 20 votos que poderá perder do PMDB.
Hoje em dia, não existem partidos grandes, só partidos médios. Puxando três médios para a base - PT, PSB e PR -, dentro de uma pactuação efetiva, o governo conseguiria formar um novo bloco de maioria.
O dia seguinte
Ainda há um grande desafio pela frente, de segurar o impeachment. E um segundo grande desafio, de reinventar o governo de Dilma, caso o golpe se frustre.
Hoje, em Brasília, a sensação maior é que a sessão que votará o impeachment será similar à que votou as diretas-já. Não haverá quórum para o impeachment, mas o governo terá que apresentar uma saída para o dia seguinte.
É nessa saída que repousam as maiores esperanças em Lula.
Derrubado o impeachment, Dilma não poderá se repetir. Terá que admitir suas vulnerabilidades e acabar de vez com o estilo de "espancar ideias".
O estilo consiste no seguinte.
O Ministro aparece com uma sugestão de política pública. A presidente faz, então, um teste de stress, "espancando" a ideia para analisar sua consistência. E invariavelmente acaba liquidando com a iniciativa do Ministro, apontando - em geral com humilhação - pontos que ficaram em aberto. Esse estilo fez com que o Ministérios se encolhessem, evitando apresentar qualquer ideia para não cair  no pelourinho da presidente.
Há maneiras de montar ministérios de coalizão e definir planos de governo robustos. Basta ancorar cada Ministério em secretários executivos gestores e definir claramente as metas e foco de cada área. E abrir-se para a sociedade, para os empresários, os movimentos sociais.
Principalmente, pensar grande para enfrentar a crise econômica que se avizinha.
De qualquer modo, se o impeachment for derrotado será a prova definitiva de que o país se tornou maior que a Globo.
E a maior prova era o contraste bolivariano. Ontem, no Planalto, militantes do MTST (Movimento dos Trabalhadores em Teto) no Palácio do Planalto gritando palavras de ordem em defesa da democracia. Eram rudes, barulhentos, fazendo algazarra como deveriam ter feito os índios no descobrimento. E, no entanto, cantando com gosto o Hino Nacional e vendo na democracia o caminho para ter oportunidades. Eram cidadãos.
E nas telas da Globo e nos portões de Paulo Skaf, de Temer, de Cunha, as ameaças maiores à grande conquista democrática.
É por isso que #NãoVaiTerGolpe. (Fonte: aqui).

O BRASIL E O SUCESSO DA OPERAÇÃO DESMONTE


O processo de desmonte do capitalismo brasileiro

Por André Araújo

A luta pelas causas serve de capa a grandes aventuras políticas. Algumas causas são temas clássicos que se usam como aríetes para qualquer tipo de ação verdadeira sendo a causa a desculpa.

Todos são a favor da PAZ, uma causa nobre. Ninguém é a favor da GUERRA, uma causa torpe. Neville Chamberlain era a favor da paz, mas a História o jogou no limbo porque, sob a capa do apaziguamento, provocou um desastre político para seu País. Seu opositor, Winston Churchill, era a favor da guerra e a História o consagrou como um dos grandes estadistas do Século XX. As causas são portanto enganadoras, servem para muita coisa, nem sempre benignas.

Sob a capa de causa do ANTI-TERRORISMO, os EUA invadiram o Iraque e desarrumaram todo o Oriente Médio. A causa era boa, mas o PROCESSO de se chegar à causa foi desastroso. Causas nobres podem portanto arruinar países se os processos para atingir essas causas foram errados, excessivos, desequilibrados, mal operados.

Ninguém é a favor da corrupção, todos são contra. Mas o processo na luta ANTI-CORRUPÇÃO pode arruinar um País, custando muito mais que a própria corrupção. É fundamental, portanto, o discernimento sobre os processos que se praticam para atingir causas aparentemente nobres, porque os processos podem matar as causas a que se destinam e criar novos problemas sem resolver o objetivo inicial.

A atual luta anti-corrupção no Brasil está destruindo os fundamentos do capitalismo brasileiro. Os EUA como Pais também são contra a corrupção, mas lá os processos nem de longe tocam no resguardo ao seu capitalismo corporativo.

A Lockheed Martin, grande empresa fabricante de aviões militares, nos anos 60 praticou tanta corrupção que foi ela a razão da promulgação da Lei contra Práticas Corruptas no Exterior, a FCPA, de 1973. Mas sendo a Lockheed a razão da lei, a empresa mal foi tocada, o Governo dos EUA exigiu a troca de seu presidente, ninguém foi preso e a Lockheed segue hoje sendo uma das maiores e mais sólidas empresas dos EUA. Muito mais recentemente a Kellog, Brown and Root, uma das maiores empreiteiras dos EUA, com sede no Texas (da qual o Presidente Lyndon Johnson foi lobista a vida inteira e cujo nome consta de sua monumental biografia, por Robert Caro, em mais de mil citações; Johnson deveu à Brown and Root a fortuna de 14 milhões de dólares, que legou a Lady Bird, sua viúva), teve recentemente um processo por corrupção na Nigéria, uma propina de US$192 milhões ao ditador daquele País. O executivo Albert Stanley foi punido com dois anos e meio de prisão e o processo terminou aí, a Kellog Brown and Root não foi minimamente afetada em seus negócios.

O cuidado absoluto com a PRESERVAÇÃO de suas grandes empresas é uma característica do sistema americano de organização capitalista. Na crise de 2008, estando em risco mais de 50 bancos e grandes empresas industriais, crise causada por monumentais trapaças de Wall Street, o Tesouro americano ofereceu recursos de 700 bilhões de dólares para essas empresas e bancos, um banco (Lehman) foi deixado quebrar, os demais foram salvos, ninguém foi processado ou muito menos preso, a fraude gigantesca passou batida para que se salvasse o capitalismo americano.

Nos últimos dois dias, o sistema GLOBO, pelo Globonews, vem repetindo que o Brasil está sendo elogiado no exterior por causa de sua campanha anti-corrupção. A fala apareceu no programa EM PAUTA de 8 de março pela locução de Guga Chacra e ontem, no programa JORNAL DAS DEZ pela locução de Donny De Nuccio, âncora do Jornal. Guga Chacra citou um elogio de Dany Rodrick, professor de economia, e só. Donny não citou ninguém, disse que o Brasil está sendo elogiado e que a operação anti-corrupção vai fazer os investidores voltarem ao Brasil porque agora o pais está limpo.

È uma lenda de mau gosto. Empresários do mundo inteiro detestam investigadores e promotores, seus inimigos naturais,  e sentem afinidade com colegas empresários de outros países. É como um clube. Empresários se percebem como companheiros de outros empresários e se incomodam em ver seus colegas presos e não se sentem bem em países que os prenderam em grande quantidade e os mantêm presos; é da natureza humana. Empresários não têm simpatia por aparelhos repressivos, têm simpatia por empresários que são considerados colegas de profissão. Portanto esse papo de que o Brasil está sendo "elogiado" é politicamente correto, apenas; na verdade o Brasil está sendo PROCESSADO por todo lado nos EUA por causa da exposição excessiva e escandalosa da corrupção, o que dá argumentos para promotores americanos e gangues de advogados abutres que compram ações da Petrobras só para processar e extorquir danos morais, alimentados pela abundância de "escrachos" produzidos no Brasil e que se voltam contra nós mesmos.

Se o ambiente de corrupção afasta investidores, como a economia mexicana, com longo histórico de corrupção política, está bombando?  Não se defende a corrupção, mas os contextos precisam ser aclarados. Os primeiros empresários da Era Moderna foram os PIRATAS INGLESES do Caribe; a alma do empresário é do pirata e não do juiz, quem acha que país limpinho atrai investidor não tem a mais remota noção de negócios no mundo real.

Há também o problema geopolítico; há duas áreas no Brasil que são de grande irritação para Washington: a fabricação do submarino nuclear e a fabricação de mísseis pelo Brasil, área em que temos já tradição de 30 anos, não é uma coisa simples. Ambas as áreas foram atingidas pela Lava jato, o submarino nuclear está sendo construído pela Odebrecht Defesa e os mísseis pela Mecatron, empresa controlada pela Odebrecht, já o programa nuclear tem como principal contratante a Andrade Gutierrez, através da Eletronuclear. Todas essas áreas estão sendo atingidas pela Lava Jato.

Por coincidência, a empreiteira brasileira pioneira na expansão para o exterior, a Mendes Júnior, acaba de pedir recuperação judicial, um símbolo que cai como a sinalizar o desmonte do capitalismo brasileiro, em larga medida um trem puxado pelas grandes empreiteiras, hoje todas na linha de tiro para serem estraçalhadas.

Há séculos o imperialismo usa o moralismo como aríete de rompimento de barreiras. O moralismo é sempre o PRETEXTO para atingir fins bem menos morais. O moralismo inglês que combateu o tráfico negreiro nos Século XIX não tinha fins tão nobres, tratava-se de criar mercado para os tecidos ingleses nas Américas, para o que os trabalhadores negros precisavam receber salários, portanto não deveriam ser escravos.

O moralismo nos EUA não acabou com a corrupção, apenas a legalizou. As doações políticas por empresas nos EUA são legais e ilimitadas, foi criado um mecanismo, os POLITICAL ACTION COMMITTEES, que podem receber qualquer valor das empresas, sempre declarados e dedutíveis do imposto de renda. Já a operação de interesses junto aos políticos foi há muito tempo legalizada pelo LOBBY registrado e legal, com despesas também deduzidas dos lucros.

Mesmo assim, há no setor do orçamento militar dos EUA, que gira em torno de US$680 bilhões anuais, um imenso número de malfeitos, de roubalheiras, as famosas tampas de privada de 2 mil dólares, que são apontados em muitos livros sobre o tema. Lá não são tão limpinhos como aqui os sacristãos de fórum vendem. Só que lá eles são mais discretos e não colocam a sujeira na janela. E nos EUA a Justiça jamais supera o interesse do Estado nacional, e dentro desse interesse está a proteção ERGA OMNES das grandes corporações que são a espinha dorsal da economia americana.

As grandes empresas podem ser processadas, mas os processos não atingem a essência da empresa, nem sua solidez ou potencial de operação presente e futuro. Centenas de prisões e delações ao mesmo tempo são coisa nunca vista nos EUA e nem em qualquer outro país de economia organizada, nenhuma causa justifica desmontar ao mesmo tempo grandes e importantes empresas como se está se fazendo aqui, sem que ninguém se importe, como se isso fosse coisa normal.

Construir grandes empresas leva duas ou três gerações, quem diz que virão empresas estrangeiras no lugar das detonadas, ou que médias empresas ocuparão seu lugar, não tem a MÍNIMA noção do mundo real, simplesmente não sabe do que está falando, não conhece o âmago da economia. Uma grande empresa é uma obra complexa, não se improvisa.

Alguns poucos na mídia e na academia estão associando as operações policialescas e todo o conjunto de ações anti-corrupção com o debacle da economia, mas muitos não correlacionam. A atual recessão se deve a vários fatores, mas o clima de caça as bruxas dá uma enorme contribuição ao ambiente de desânimo e desalento, além de afetar a economia real pelo desemprego nas construtoras, o cancelamento de pedidos e projetos, o desmonte de canteiros e estaleiros, a perda de grandes players para novas concessões que são essenciais para reerguer a economia.

Ao final, corruptos ou não, são os empresários que movem a economia, e não inquéritos, processos e prisões.

O problema não é a tese pura da luta anti-corrupção, meritória por si própria. O problema está nos MÉTODOS que se usam para combater a corrupção, que podem matar o doente. O que sobra de uma grande empresa onde todos os executivos estão presos há meses, como fica o "clima" na empresa, os projetos futuros, a credibilidade perante os clientes e bancos?
Empresas que sofrem essa razia de prisões e delações são arrasadas para não mais voltarem a funcionar.

Infelizmente a mídia, por vício de escorpião, entra nessa cruzada matando os potenciais anunciantes que estão na economia produtiva; boa ou ruim, é de lá que vem seu faturamento: sem empresas não há anunciantes e não há economia. (Aqui).

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Desconfiança, insegurança jurídica, avalanche permanente de notícias negativas, desinvestimento, massacre de reputações, estado permanente de sobressalto, ausência de horizonte, Parlamento a boicotar ações e propostas formuladas pelo Executivo, bacia das almas cada vez mais transbordante...

Afinal, a que interesses serve o desmonte da economia brasileira?

TEMPOS TERRÍVEIS


Armandinho.

quarta-feira, 30 de março de 2016

É GOLPE


Este impeachment é golpe

Por Luis Nassif

A Rede Globo montou uma campanha implacável em torno do tema “impeachment não é golpe”, recorrendo a um recurso primário. Chega até o jurista e pergunta se impeachment é golpe. É o jurista obviamente responde que não, já que previsto na Constituição.
A pergunta a ser feita é “este impeachment, da maneira como está sendo montado, é golpe?”.
É golpe.
Como impichar uma presidente sem apontar uma culpa sequer, sem comprovar nenhum crime de responsabilidade?
Alguns idiotas da objetividade – parafraseando Nelson Rodrigues – desenvolveram um sofisma primário: mesmo que não tenha cometido crime de responsabilidade, o fato de não ter apoio de dois terços do Congresso é razão suficiente.
Ou seja, é golpe.
A Constituição não prevê o voto de desconfiança ao presidente. Trata-se de um instrumento do parlamentarismo, que permite ao Congresso derrubar o gabinete e ao presidente negociar um novo gabinete. Ou, em caso de impasse geral, decretar a dissolução do Congresso e novas eleições gerais.
Que fique claro, então, que qualquer expediente não contemplado na Constituição é golpe. E, na eventualidade do impeachment passar na Câmara, se o Supremo Tribunal Federal recusar a análise de mérito sobre o que for considerado crime, a ele também se aplicará a pecha de golpista. (Aqui).
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Enquanto isso, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal, dois dos (três) autores do pedido de impeachment, declararam, na comissão do impeachment, entre outras coisas, que pedalada fiscal "é crime grave". 

Uma vez que as contas de 2015 do governo federal nem sequer foram apreciadas pelo TCU, e muito menos julgadas pelo Senado, afigura-se lícito dizer que pedalada fiscal e demais itens constituem, NA OPINIÃO DOS CITADOS AUTORES E SIMPATIZANTES, crimes de responsabilidade - assim como há aqueles que discordam desse juízo.

Vale resumir: Não existe comprovado crime de responsabilidade que embase o pedido de impedimento da presidente da República, o que existe é um CONFRONTO DE OPINIÕES favoráveis e contrárias. 

Conclusão: Presentes tais circunstâncias, eventual aprovação de impeachment configurará golpe.

Nota: A conclusão acima foi corroborada pelo ministro Marco Aurélio Mello, do STF - AQUI
Dias atrás, ministros sustentaram que o instituto do impeachment é, em si, constitucional, o que é claramente evidente. A Rede Globo insiste em repetir a informação, mas silencia sobre o fato de que os ministros enfatizaram a constitucionalidade do mecanismo em si, mas até agora se abstiveram de opinar sobre impeachment sem embasamento em comprovado crime de responsabilidade, o que o ministro Marco Aurélio já fez.

NONSENSE CARTOON


Eneko.

SOBRE A NOMEAÇÃO DO EX-PRESIDENTE LULA PARA A CASA CIVIL


"Gilmar Mendes (STF) decidiu suspender a eficácia da nomeação de Lula para Ministro da Casa Civil com fundamento em suposto desvio de finalidade do ato administrativo.
Toda análise jurídica é valorativa. Não há como negar isso. Por tal razão, há regras de impedimento e suspeição para julgadores, de modo a evitar que suas paixões e seus interesses terminem dominando os argumentos jurídicos na análise.
Agora, no Brasil, juízes se manifestam publicamente com tom político claro e depois julgam as pessoas que foram objeto de suas manifestações. O juiz Sérgio Moro aceita ir a eventos claramente políticos do PSDB, mas, ao chegar lá, diz que não tem qualquer relação com o partido. No STF, o próprio Gilmar Mendes se tornou comentarista político, fazendo críticas públicas a partidos e políticos que depois julga com fundamentos questionáveis.
As normas de impedimento e suspeição estão previstas no Novo Código de Processo Civil (NCPC), que começou a viger em 18/03/2016. Como sempre, os dispositivos não conseguem abarcar todas as situações passíveis de ocorrer no mundo concreto. É preciso, portanto, realizar analogias, utilizar de princípios para entender como deve agir um julgador ao se deparar com um caso que envolve paixões ou interesses seus.
A função do Poder Judiciário é central num Estado Democrático de Direito e, portanto, não devem pairar dúvidas sobre a imparcialidade do juiz. Por isso, existem diversos dispositivos que tratam do assunto no NCPC.
O inciso I, do art. 145, do NCPC, diz que há suspeição do juiz quando ele é amigo íntimo ou inimigo da parte. Quando Gilmar Mendes surge na mídia fazendo críticas duras a Dilma, a Lula e ao PT, perde a imparcialidade para julgá-los, sobretudo num processo judicial que discute um tema político crucial. Ele pode ser considerado um “inimigo” de Lula. O fim da norma parece ser o de impedir que alguém julgue processo de um adversário seu, pois suas paixões e interesses podem levar, ainda que subconscientemente, a prejudicá-lo.
O inciso V, do art. 145, do NCPC, diz que há suspeição, também, em caso de interesse no julgamento em favor de uma das partes. Se há clara e firme posição política em favor de um lado, evidente o interesse na vitória desse lado em um determinado processo que tem enorme cunho político.
Se Sérgio Moro ainda tenta fingir que não tem lado, apesar das ligações da sua família com o PSDB e da sua ida a eventos do partido, Gilmar Mendes não faz questão de esconder que é um inimigo claro do PT, de Dilma e de Lula.
É plenamente plausível a interpretação de que será parcial o juiz quando as partes e interessados no processo tenham um lado político contrário àquele assumido pública e ferrenhamente por ele.
Um julgador pode ter preferências políticas, mas, ao manifestá-las publicamente tentando influenciar pessoas, o seu interesse se caracteriza como forte e evidente. O mesmo se dá com a presença de um julgador em eventos políticos e com a ligação de familiares a partidos.
De quebra, a advogada do processo judicial julgado por Gilmar Mendes, Marilda de Paula Silveira, é coordenadora do IDP – Instituto Brasiliense de Direito Público, do qual ele é um dos sócio-fundadores, o que indica uma relação forte, talvez íntima, entre ele e a advogada do caso.
Como disse Teori Zavascki há pouco tempo, um julgador deve solucionar problemas, e não criar novos. Se ele quer ser um ativista político-partidário, que o faça fora do tribunal. Com tantos bons julgadores no país, não há porque manter alguém num caso ao qual ele está intimamente ligado, e isso vale também para o Ministro Toffoli, quando julga as questões do PT e filiados.
Gilmar Mendes deveria ter passado o caso para alguém menos parcial. No caso de dúvida sobre impedimento ou suspeição, o parâmetro de decisão deve pesar em favor da imparcialidade.
Ao menos, o Ministro Fachin demonstrou ser uma pessoa séria e, por ter amizade com algum dos advogados que assinaram os HC de Lula, se declarou suspeito para julgá-lo. Essa é a postura que se espera de um ministro da mais alta corte do país.
Uma das provas do risco de uma forte parcialidade do julgador é a decisão de Gilmar Mendes que suspendeu a eficácia da nomeação de Lula. O único fundamento foi um suposto desvio de finalidade, que, salvo melhor juízo, não ocorreu!
Como a expressão indica, é preciso se desviar de um determinado fim que um ato administrativo tem. Se o ato for mais vinculado, aquele cujos fins estão claramente estabelecidos na lei, será mais fácil declarar um desvio de finalidade. Se o ato for extremamente discricionário, como é uma nomeação de ministro, que sequer é motivada expressamente, será muito complicado decidir por desvio de finalidade.
O ato de nomeação de um Ministro de Estado por um Presidente da República tem os seus requisitos previstos no caput do art. 87 da Constituição. O nomeado precisa 1) ser brasileiro, 2) ter mais de 21 anos e 3) estar no exercício dos seus direitos políticos. Cumpridos esses requisitos por Lula, ele deveria se tornar ministro, ao menos sob o ângulo formal.
Para uma análise substancial, é preciso verificar se o ato não foi tomado apenas na sua forma, ou seja, se a Presidenta da República não abusou do direito de nomear ministros apenas para dar foro privilegiado a Lula, ou mesmo se não simulou a nomeação.
O abuso poderia ser caracterizado se a Presidenta da República criasse, por exemplo, um cargo apenas para colocar Lula em foro privilegiado. É como no planejamento tributário abusivo, por meio do qual se realiza atos que não seriam utilizados normalmente. Há ali um exclusivo objetivo de aproveitar vantagens tributárias.
Se o ato de nomear um ministro visa exatamente a nomeá-lo para um cargo, eventual simulação seria caracterizada se fosse comprovado que esse ministro sequer tomou posse ou que, tomando posse, ele não foi trabalhar, como acontece muito no Brasil.
No caso de Lula, ele tomou posse, quer trabalhar e a Presidenta precisa dele. Qual, então, o desvio de finalidade? O argumento de Gilmar Mendes é o de que, ao nomear Lula, que é investigado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal, o objetivo seria unicamente deslocar a competência de julgá-lo do juiz federal de primeira instância, Sérgio Moro, para o STF.
Primeiro, para que houvesse desvio de finalidade, repito que não basta comprovar o interesse da Presidenta da República de deslocar a competência e fazer Lula ser julgado pelo STF, pois a finalidade do ato de nomeação está cumprida se o cargo não é apenas criado para ele, se ele é apto ao cargo existente, se toma posse e se vai trabalhar.
A despeito das provas que indicariam a intenção da Presidenta e de Lula de aproveitarem uma das consequências jurídicas da nomeação, e a despeito da sua legalidade, não há desvio de finalidade desde que o ato tenha realmente atingido os seus fins, que é nomear Lula, dar posse a ele e tê-lo trabalhando num cargo para o qual é apto.
É fraco o argumento de que o fim seria unicamente de permitir que Lula fosse julgado pelo STF, quando ele vinha sendo cogitado para integrar o governo há bastante tempo e tem os atributos para exercer o cargo. Não é o fato de que a sua nomeação lhe aproveita para fins de evitar o seu julgamento por alguém que ele entende ser parcial que causará, por si só, desvio de finalidade.  
A decisão de Gilmar Mendes leva ao absurdo de nos questionarmos se é preciso criar um percentual dos fins que estão por detrás de cada ato administrativo. Para Gilmar Mendes, as gravações telefônicas comprovam que o fim foi 100% o de fazer Lula ser julgado pelo STF.
Para alguns, o ato de nomeação tem 100% de finalidade de transformar Lula o Presidente da República e fazer de Dilma uma peça figurativa.
Para outros, há 50% de interesse em fazer Lula o “novo Presidente” e 50% de protegê-lo de Moro. Para outros, há 33,33% de interesse em dar uma oportunidade de Lula lutar politicamente após a condução coercitiva dele e outros fatos que mancham sua imagem, 33,33% de interesse em ter a experiência dele nesse momento difícil e 33,33% em vê-lo livre de Moro, mas sujeito ao crivo do STF.
Como anular um ato completamente discricionário de nomeação de ministro com base em opiniões sobre qual o real interesse da Presidenta da República por trás do ato, quando, na prática, a finalidade não foi desviada? O ato é perfeito na forma e na substância.
O que se pretende é impedir que ele emane os seus efeitos, pois parece haver uma estratégia da Presidenta e de Lula de aproveitá-los para que ele não seja julgado por Moro, mas pelo STF. Se isso é ilegal, então não poderá haver mais planejamento tributário no Brasil, pois o planejamento é um ato ou conjunto de atos perfeitos na sua forma e na sua substância, mas com foco na vantagem de reduzir tributos. É uma estratégia legal, como é a nomeação de Lula.
Apenas é possível concluir pelo desvio de finalidade se o juiz olha somente para o deslocamento de competência e esquece que Lula foi Presidente da República durante 8 anos, que está na política há muitas décadas e tem, portanto, atributos de sobra para ser um Ministro da Casa Civil, um cargo que requer, acima de tudo, confiança e habilidade política.
Se Lula tivesse sido nomeado para Ministro da Saúde, por exemplo, ainda haveria algum espaço para discussão, que, nesse caso, seria dura. Observe que, certo ou errado, é muito comum a nomeação de políticos para cargos de confiança no Brasil. Um Ministro da Saúde é alguém que deveria entender profundamente de saúde pública? Em princípio, sim. No entanto, não há uma regra nesse sentido no nosso país e desconheço questionamentos judiciais de inúmeras nomeações que são feitas pelos Chefes de Executivo.
Quando Marcelo Castro foi nomeado para o cargo de Ministro da Saúde, inúmeras pessoas falaram sobre sua inaptidão para exercê-lo, porém não tenho conhecimento de qualquer ação judicial para impedir a sua nomeação.
É preciso haver uma discussão séria no Brasil a respeito dos cargos de confiança, podendo ser criadas, talvez, normas para diminuir a possibilidade de nomeação de indivíduos desqualificados. Devem prevalecer o conhecimento teórico e a experiência prática, e não conchavos políticos. Nada disso tem a ver, no entanto, com a nomeação de Lula, que é um dos políticos mais experientes do país e que ajudaria a Presidenta Dilma no governo.
A maior parte da fundamentação da decisão de Gilmar Mendes é uma citação literária que contradiz a própria decisão. Ele cita um exemplo emblemático de um dentista acusado de “estupro de pacientes para ocupar o cargo de Ministro de Transportes, no momento exato em que o Tribunal de Justiça julgará apelação que o condenou a 20 anos de prisão”. Nesse caso, o intuito da nomeação, segundo o autor, seria claramente o de evitar julgamento pelo TJ.
Não, não seria “claramente”. Os casos concretos podem ser muito complexos. E se o dentista já tivesse trabalhado como Secretário de Transportes por 12 anos? E se a sua paixão sempre foi, apesar de graduado e ocupado inicialmente como dentista, o estudo de políticas de transporte público e mobilidade urbana, temas que estudou no mestrado, doutorado e, inclusive, em pós-doutorado no exterior?
Essa suposição serve para dizer apenas que visões preconceituosas, pré-concebidas, podem determinar o resultado da tomada de decisão sem uma maior reflexão. Não que esse tenha sido o caso do autor citado por Gilmar Mendes, que apenas tentava mostrar casos bem drásticos para servirem de exemplo a suas construções. Não discordo que, no caso do dentista, haveria boas chances de se concluir pelo desvio de finalidade, mas o caso não é “dado”, como alguns poderiam concluir.
Outro exemplo desse autor, que está lá transcrito na decisão de Gilmar Mendes, é o caso de um médico renomado, portador de títulos acadêmicos, ser convidado para assumir a Secretaria de Saúde do Estado e que responda acusação de lesões corporais leves. Nessa situação, segundo ele, é “ridículo” concluir que o objetivo seria subtrair a competência do Juizado Especial Criminal.
Parece-me que esse último exemplo se aplica ao caso em análise. Além de, como dito, Lula ser muito adequado para o cargo ao qual ele foi nomeado, ele sequer é alvo de processo judicial. O que há, até o momento, é investigações e uma proposta de denúncia não apreciada pelo Poder Judiciário. Não há ação judicial a ser obstruída.
Toda a comoção criada pelo caso decorre do pré-julgamento de que Lula seria culpado pelos crimes que alguns dos investigadores, com apoio maciço de boa parte da grande imprensa, dizem terem sido cometidos por ele.
As últimas ligações telefônicas de Lula estão todas publicadas na Internet e compartilhadas em redes sociais. Não se encontrou nenhuma prova de crime. Lula deve ser julgado como qualquer outro cidadão, porém o fato de ser um ex-Presidente da República, por óbvio, dá circunstâncias específicas ao caso. Não se trata de lhe conferir direitos ou poderes especiais, mas é preciso tomar cuidado, por exemplo, com as paixões envolvidas na análise de sua situação por investigadores ou julgadores.
Talvez, por tal razão, seja até melhor o seu julgamento pelo STF, que é o tribunal mais alto do país e tem um maior caráter político, o que não justifica um ministro como Gilmar Mendes, inimigo político de Lula, amigo da advogada e das partes contrárias, decidir a sua vida.
Se o STF não decidir no lugar da Presidenta quem deve ser os seus ministros, Lula irá trabalhar, realizará mudanças no governo e o suposto desvio de finalidade estará ainda mais espancado. Enquanto isso, a sua vida pode continuar sendo devassada, sendo que o STF pode e deve agilizar a apreciação da denúncia contra ele e, em seguida, se for o caso, julgar o processo.
Se incomoda tanto o fato de Lula não ser mais julgado pelo juiz que comparece em eventos do PSDB, dever-se-ia estar questionando o deslocamento da competência apenas, e nunca o ato de nomeação, impedindo que a Presidenta se sirva de Lula para resolver as crises política e econômica do país.
De qualquer sorte, não há porque vedar o deslocamento da competência. Não há obstrução de Justiça por dar a competência ao tribunal mais importante do país, que já julgaria a questão em última instância.
Por um lado, o tal deslocamento de competência acelera o processo e faz com que Lula tenha um resultado transitado em julgado mais rápido, o que é bom para o país.
É preciso que o Poder Judiciário tome muito cuidado ao julgar esse e outros casos, pois, ao seguir o clamor popular - que pode nem ser o clamor da maioria da população, mas é traduzido como tal por parte da grande imprensa - pode terminar ferindo gravemente direitos e gerando precedentes perigosos para o futuro de toda a sociedade brasileira."




(De Marcos de Aguiar Villas-Bôas, post intitulado "A decisão de Gilmar Mendes sobre Lula" - aqui.
Marcos de Aguiar Villas-Bôas é advogado licenciado, doutor em Direito Tributário pela PUC-SP, mestre em Direito pela UFBA, atualmente faz pesquisas independentes na Harvard University e no MIT - Massachusetts Institute of Technology. 
Em tempo: a) O ministro da Saúde Marcelo Castro - cujo partido político acaba de romper com o governo -, seria graduado em psiquiatria; b) não sei a quais eventos do PSDB o juiz Moro teria comparecido; sei de palestras que ele proferiu e homenagens recebidas em/por entidades notoriamente 'simpáticas' à citada agremiação; c) o Procurador-geral da República dirigiu parecer ao STF dando conta de que o ex-presidente poderia, sim, ser nomeado ministro da Casa Civil, MAS - por mais, digamos, heterodoxo que isso possa parecer - sem que isso implicasse em mudança de foro por prerrogativa de função). 

CARTUM DO EU SOZINHO


Jarbas.

DISSECANDO MÉTODOS: BASTIDORES OPERACIONAIS E O JOGO POLÍTICO


O xadrez da Polícia Federal na era das corporações

Por Luis Nassif

A criação da Sisbin

Nos anos 90, ajudei o então Secretário de Segurança do Ministério da Justiça Walter Maierovitch, com informações sobre as ferramentas utilizadas no mercado financeiro para lavagem de dinheiro.

Na CPI dos Precatórios, passei dias e dias, com minha coluna na Folha, desbastando cada instrumento financeiro utilizado para esquentamento de dinheiro, desde as operações zé-com-zé na Bolsa de Valores até as jogadas com títulos estaduais.
Por conta desse trabalho fui convidado pelo então Ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos para abrir um encontro em Pirenópolis (GO), juntando representantes de todos os órgãos de fiscalização – o Ministério Público Federal, Polícia Federal, Receita, Banco Central, COAF, para lançamento da Sisbin (Sistema Brasileiro de Inteligência). Estavam lá figuras que se tornariam referenciais nos anos seguintes, como o Procurador Geral Cláudio Fontelles e o diretor da PF Paulo Lacerda.
O pedido de Márcio foi para que eu “descesse a lenha” nos métodos de investigação até então implementados, que desconheciam as nuances do mercado financeiro, e explicasse alguns mecanismos do mercado financeiro para lavagem de dinheiro.
Aproveitei para conversar com alguns dos presentes e o quadro apresentado era entusiasmador. Em Brasilia haviam sido montadas salas de situação onde se reuniam representantes de todos os órgãos para estudar as estratégias conjuntas contra a lavagem de dinheiro.
Descrevi essas mudanças em coluna de 14 de maio de 2005 (http://migre.me/tnFcZ). A partir dali, começava a se fechar o cerco ao crime organizado, à ideia, que imperava desde os anos 70, de que seria impossível o cerco aos paraísos fiscais e às contas, que migrariam de um banco para outro sem deixar rastros.
Saí da reunião com a sensação de que estava sendo construído um novo país. E que o jogo político, os financiamentos de campanha convencionais, jamais seriam os mesmos.
Aparentemente, Márcio esqueceu de informar o governo.
A nova Polícia Federal

Nesse período, houve uma completa reformulação da Polícia Federal. Novos equipamentos, novos métodos de investigação e, principalmente, uma liderança serena e segura de Paulo Lacerda, que incutiu um orgulho extraordinário na força.


Na época, conversei com um consultor contratado para trabalhos de gestão na PF. Na hora de definir o objetivo, houve consenso: em 20 anos ter o mesmo nível do FBI.
A PF se aparelhou, aprendeu a fazer gestão, conquistou equipamentos modernos e, principalmente, teve acesso a parcerias internacionais armadas até os dentes com as novas tecnologias. A prisão do comendador Arcanjo – chefe da contravenção do Mato Grosso – foi um feito extraordinário. Através do GPS, o FBI orientou os agentes até o cômodo da casa onde Arcanjo se escondia.
A nova Polícia Federal – assim como o MPF – queria testar a musculatura adquirida.
Houve tentativas iniciais de invasões de escritórios de advogados. Depois, Operações de nomes vistosos, algumas discretas e bem-sucedidas – como a da Daslu -, outras polêmicas e conflituosas, como a Satiagraha e a Castelos de Areia.
Dois episódios liquidaram com essa lua-de-mel.
O primeiro, a maneira como o governo Lula atuou no caso Satiagraha, humilhando a grande referência da PF – Paulo Lacerda, na época na ABIN (Agência Brasileira de Inteligência) – e os delegados da Satiagraha. Salvou o PSDB e gerou um ódio mortal na corporação.
A segunda, a indicação de José Eduardo Cardozo para o Ministério da Justiça.
Cardozo montou uma estratégia fatal.
Na parte administrativa, deixou a PF às moscas. Não implementou um programa sequer.
No auge da guerra contra a TelexFree – o maior golpe já aplicado contra brasileiros na história – depois de muito cobrar a participação do Ministério da Justiça, Cardozo acabou me colocando em contato com um alto quadro da PF.
A primeira frase da autoridade: “Senhor jornalista, quando vier a Brasília vamos conversar para contar o que o Ministro está fazendo com a PF”.
Para manter-se no cargo sem ser incomodado, Cardozo entregou todos os anéis e dedos para a corporação.
Cardozo trouxe cerca de dez policiais federais para sua assessoria, garantiu à tropa a ampliação do poder, mantendo a presidente desinformada sobre a marcha do golpe. E há suspeitas de que tenha sido responsável por parte dos vazamentos que inundaram a imprensa no período.
Semanas atrás, policiais da PF fizeram chegar à Casa Civil um material que mostraria aparelhamento da Lava Jato pelo PSDB do Paraná. Junto com o material, o alerta para não passar o material para o Ministério da Justiça, “senão mela”. Dias depois o material saiu publicado na revista Veja. Questionadas, as fontes da Casa Civil confirmaram que o MJ havia tido acesso aos documentos. Pode ter sido coincidência; pode ser que não.
Outra figura chave foi o líder do governo no Senado, senador Humberto Costa. Apanhado na Operação Sanguessuga, Costa fechou um pacto político com a PF, ajudando a aprovar um conjunto de leis que permitiu à PF um emponderamento inédito.
lei 12.839 garantiu controle total sobre inquérito policial. Agora, tudo passa pela PF, desde inquéritos do IBAMA, INSS. Imagine-se um delegado comandando 400 investigações.
Outra foi a lei 12.850, de combate ao crime organizado e (que define a) delação premiada. Em qualquer país do mundo, a delação é acompanhada pelo MP. A lei dava essa exclusividade aos delegados.
Costa e Cardozo tiveram papel central em sua aprovação.  E se aliaram aos delegados nas discussões sobre a MP 650, que pretendia definir uma carreira única para o órgão.
Na verdade, os delegados colocaram uma faca no pescoço do governo e saíram vitoriosos.
A faca, no caso, foi um bilhete manuscrito de Alberto Yousseff que continha um mero “Dilma 17 viagem”. O bilhete apareceu em abril de 2014 e não foi encaminhado à Procuradoria Geral da República, ficou nas mãos dos delegados.
Apenas no último dia 11 de março uma reportagem da revista IstoÉ (http://migre.me/tnH8O) relatou parte da história. Segundo a revista, a contadora de Yousseff, Meire Poza, contou que, ao tomar conhecimento do bilhete, o delegado Márcio Anselmo vibrou: “Que coisa maravilhosa! “. Os documentos foram guardados no porta-malas de uma Range Tober Evoque apreendida pela Lava Jato, e que ficou a serviço da PF, e só reparaceram agora.
Terá sido esta a arma da qual se valeram delegados para forçar o governo a aprovar a MP 657/2014, tornando privativo de delegados de classe especial o cargo de diretor-geral da PF (http://migre.me/tnHnd) ? Em apenas duas semanas, a MP virou a Lei 13.047.
O feito foi comemorado pelo deputado e delegado Fernando Franceschini, que se vangloriava de ter botado “o governo de joelhos” (http://migre.me/tnHu1).
O ponto final foi o pacto em torno do helicóptero do senador Zezé Perrela, aliado e amigo de Aécio Neves, transportando 450 quilos de cocaína. O abafamento do caso teria sido fruto de um acordo entre a banda tucana da PF, em troca de segurar a Operação Acrônimo, que envolvia o então candidato ao governo de Minas, Fernando Pimentel. Chegou-se ao feito inédito de um delegado da PF soltar uma declaração inocentando Perrela, fato sem precedentes na história da PF.
Esse é o mundo sem corrupção criado nas fantasias alimentadas pela Lava Jato, a partir do momento que escolheu lado.
As novas corporações

A Procuradoria Geral da República e a Polícia Federal tiveram papel central nas armações contra Dilma. Foram parciais, em alguns momentos flagrantemente partidários, mas fogem do figurino tradicional do golpismo latino-americano, de aplainar o terreno para a oposição – embora na prática seja isso o que ocorre, ao livrar os líderes da oposição de indiciamentos.


Nos dois casos, houve uma reação das corporações para se transformar em poderes autóctones.
Tome-se o caso do PGR Rodrigo Janot. Não se tenha dúvida de que foi o grande estrategista da Lava Jato. Criou as condições para o sucesso da Operação, amarrou a cooperação internacional, alocou na força tarefa seus melhores procuradores e seus melhores recursos, monitorou passo-a-passo para não sair da ilegalidade e teve três intervenções que mostraram claramente o jogo:
1.    Ao encaminhar para a Lava Jato denúncia vaga (e incorreta) de um obscuro parlamentar do Norte, com base em reportagem da revista Veja informando que a OAS teria feito reformas no sítio de Atibaia. Duas instâncias tinham recusado ir adiante, pela precariedade das informações. Janot deu seguimento ajudando a ressuscitar a tese do impeachment, que tinha perdido fôlego no final do ano passado.
2.    Ao autorizar a liberação dos grampos com conversas informais de Lula.
3.    Ao devolver o processo de Lula ao juiz Sérgio Moro.
E, no entanto, Janot é um procurador exemplar. Não tem ambições pessoais: ao contrário, é um representante integral das ambições da corporação. Toda sua estratégia visou ampliar a influência institucional do Ministério Público Federal, blindar a Lava Jato contra as interferências que anularam operações anteriores. Temperou com um tanto de solidariedade mineira.
Não lhe peça para analisar os desdobramentos dessa atuação na vida política nacional, os impactos dessa radicalização nas próximas gerações, a abertura do precedente de um golpe legalizado (é golpe, sim), as consequências do vácuo político criado, as ameaças de retrocesso dos avanços sociais conquistados. Seu foco é o MPF, ponto. Ele não é especialista em Brasil: é em MPF.
Trata-se de uma corporação com grandes especialistas em todas as áreas do direito e com algumas contribuições inestimáveis para o avanço civilizatório. Mas a inteligência corporativa é escassa, especialmente para temas políticos e institucionais. Como declarou certa vez um ex-presidente da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), o Brasil é um oceano de corrupção que circunda a única ilha de honestidade, que é o Ministério Público. Questionar, quem há de?
Há plena convicção na corporação (com as notáveis exceções individuais) de que é possível controlar totalmente a corrupção, que arrebentar com cadeias produtivas produzirá uma economia mais forte, que criminalizar toda forma de apoio às empresas trará segurança jurídica, que criminalizar a política, a purificará. É uma segurança férrea, inamovível, questão de fé.
Mais do que um problema do MPF, reflete o desmoronamento institucional a partir do momento em que a presidência deixou de articular um projeto de país.
Em 1964 havia uma corporação com poder: a militar.
Agora, o que se tem é uma implosão do sistema político e do sistema institucional, com cada poder tratando de salvar seu latifúndio e sem um poder central capaz de articular e unificar as ações, atuar como algodão entre cristais, articular pactos entre os poderes.
Na hipótese de queda de Dilma, esse será um complicador a mais. Na parte política, o poder empalmado pelo grupo de Eduardo Cunha, armado de suas prerrogativas constitucionais. Na outra ponta, o MPF e a PF pintados para a guerra. Pairando acima o STF (Supremo Tribunal Federal), mas tão acima, tão acima, que não venha ninguém atrapalhar seu sono. E, na base, a multidão dos desassistidos, organizados por todo o país, inconformados com as janelas que se fecharão na grande noite que se prenuncia.
Daqui até 2018 há uma grande caminhada.
Em sua nova versão, mais uma vez Brasilia tenta se impor sobre o restante do país, enquadrar o país em gabinetes, monitorados por tecnologias avançadas. (Fonte: Jornal GGN - aqui).