sexta-feira, 17 de novembro de 2017

A MORTE DO REITOR DA UFSC: ESQUECIMENTO, NÃO (IV)

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No dia 11, publicamos a matéria número III sobre a trágica morte, em 02.10, do reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo, da Universidade Federal de Santa Catarina (AQUI). Indo lá, o leitor terá acesso aos tópicos II e I. Cumpre lembrar que as matérias numeradas abrangem dois posts ou mais. Como dissemos, a morte do reitor Cancellier entrou para a história do Brasil, em vista das circunstâncias que a cercaram, razão pela qual não pode cair no esquecimento.
A seguir, texto de Kiko Nogueira, publicado no Diário do Centro do Mundo, no qual se manifesta sobre trabalho publicado pela Veja acerca "do tormento do reitor que, levianamente acusado de integrar um 'esquema criminoso', foi preso, banido do campus e derrotado pelo peso da humilhação".


Dois meses depois da prisão do reitor da UFSC, a Veja tenta lavar as mãos na tragédia

Por Kiko Nogueira

Nesta terça, dia 14, (completaram-se) dois meses da prisão do reitor Luis Carlos Cancellier.
Na edição desta semana, a Veja resolveu dar oito páginas sobre o assunto e uma carta ao leitor intitulada “Os erros e a tragédia”.
A matéria “Crônica de um suicídio” questiona a atuação da Polícia Federal, do Ministério Público e da Justiça Federal na tragédia que culminou no suicídio de Cancellier.
Uma chamada menciona “os erros de investigação que humilharam o reitor da UFSC.”
A reportagem não traz nada que você não tenha lido no DCM, a não ser a história de um garçom que teria encontrado o reitor e recebido um beijo de adeus.
“Não há no inquérito nenhum indício ou acusação de que o reitor fosse membro do ‘esquema criminoso’, nem mesmo a descrição do que poderia vir a ser esse ‘esquema criminoso'”, lê-se.
A Veja tenta limpar a barra depois de transformar policiais federais e procuradores em super herois chefiados pelo semideus Sergio Moro. Sempre exaltou os poderes plenipotenciários das “autoridades”.
Ao longo dos últimos quatro anos de Lava Jato, deu alentado espaço para o punitivismo e a egolatria dessa gente. Em agosto, por exemplo, Dallagnol aparece afirmando que “a revisão de prisões é algo catastrófico”. 
Fora algumas capas com Moro, todas elas laudatórias. 
Numa entrevista de 2015, a delegada Erika Mialik Marena declarava o seguinte à revista: “Acreditamos que o que foi produzido até aqui no âmbito da investigação policial tem consistência suficiente para levar a bons resultados no futuro”.
“A operação já é uma referência”, garante.
Erika é a coordenadora da operação Ouvidos Moucos, que investigava Cancellier. Em dezembro, aceitou convite para se transferir de Curitiba para a Superintendência de Santa Catarina. O nome Lava Jato é atribuído a ela.
Mandou prender Cancellier. Depois questionou a soltura dele, determinada pela juíza Marjorie Cristina Freiberger. De acordo com Erika, ele tentava “obstaculizar (sic) investigações internas”.
O ex-senador e advogado Nelson Wedekin fez um belíssimo discurso na solenidade fúnebre em tributo a Cancellier.
“Não se passa o país a limpo assim, senhores e senhoras. Digo de novo o que já escrevi: os senhores, as senhoras, estão jogando o bebê fora junto com a água do banho”, falou.
Wedekin acusou “uma imprensa que primeiro atira e só depois pergunta quem vem lá, quando e se pergunta. Uma imprensa que toma como verdadeira, em princípio, a palavra da autoridade, não mediada, não contextualiza”.
Continuou: “De blogueiros, ativistas e pessoas ‘comuns’ que, raivosos, expelem argumentos chulos, pensamentos prontos, clichês preconceituosos, manifestações de atraso, ignorância, e ódio, muito ódio nas redes sociais. Mãos de quem confunde moral com moralismo de baixo custo, que a todos rotula, por método, costume e um certo prazer sádico”.
As mãos da Veja estão sujas do sangue de Cancellier e não há água ou tinta que consigam lavá-las. A crônica é de um assassinato e a Veja é cúmplice.  -  (AQUI).

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Nota: Desconhecemos o inteiro teor da matéria produzida por Veja, visto que não somos assinantes da publicação. 
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ADENDO em 19.11
Transcrevemos (do Conversa Afiada - AQUI) partes de artigo de André Singer publicado na Folha de S. Paulo, edição de 18.11, a qual faz referência à matéria de Veja a que alude o presente post:

"(...) Já está patente que  o sucesso da Lava Jato resultou em excessos incríveis, como os que levaram ao suicídio, no mês passado, o ex-reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, Luiz Carlos Cancellier.

De acordo com extenso relato da revista "Veja" (15/11), insuspeita de esquerdismo, o então reitor permaneceu, em setembro, 30 horas numa cela da penitenciária de Florianópolis, após ter sido algemado, ter os pés acorrentados e, nu, ser submetido a revista íntima.

As razões da prisão, ligadas a um obscuro processo que corria na UFSC antes da eleição de Cancellier, eram tão incompreensíveis que, no dia seguinte, uma juíza a revogou e escreveu: "No presente caso, a delegada da Polícia Federal não apresentou fatos específicos dos quais possa defluir a existência de ameaça à investigação e futuras inquirições".

A delegada em questão havia sido coordenadora da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. Tudo indica que, inebriados com o poder obtido graças à aprovação geral, alguns delegados, procuradores e juízes passaram ao exercício do puro arbítrio. Dezoito dias depois do episódio, Cancellier se matou.

Como escapar das garras da corrupção sem cair na tirania dos funcionários? A operação iniciada no Paraná teve, entre outros, o mérito de expor graves problemas dos Legislativos no país. Mas é uma ilusão achar que, fora deles, isto é, eliminando-se a representação, avançaremos."

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