segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

O MIDIOTA FRENTE AOS CONTORCIONISMOS MIDIÁTICOS


Manual do perfeito midiota - 60: O que aconteceu com a economia brasileira?

Por Luciano Martins Costa

O dileto midiota deveria estar se perguntando: “o que aconteceu com a economia brasileira nos últimos dias?”
Acontece que nove entre dez daqueles sábios que pontificam nas emissoras de rádio e TV vendem a ideia de que a crise econômica está passando.
Se não se pode ainda afirmar que aconteceu um milagre, o que esses “especialistas em tudo” estão fazendo é uma coleta seletiva de indicadores, para demonstrar que a coisa não é assim tão feia.
Curiosamente, alguns desses indicadores foram usados no ano passado para convencer você de que o mundo estava acabando. Por exemplo, naquela ocasião a queda de preços era uma notícia ruim: dizia-se que o fato era provocado pela redução da atividade econômica, “comprovando” agravamento da recessão.
Nesta semana, a queda de preços, aliás prevista pelo mercado desde meados  de 2015, passa a ser um elemento de otimismo, um “ajuste do mercado à nova realidade”.
Mas no meio dessas conjecturas explodem os juros do cartão de crédito, sobe a taxa de administração das contas bancárias – não de todas, apenas daquelas comuns, onde os assalariados e os pequenos empresários tentam se resguardar – e o dólar retoma trajetória de subida, o que pode anular o efeito da recessão sobre os preços.
E olha só que interessante: alguns analistas que condenavam as políticas econômicas vigentes no Brasil e em outros países latino-americanos até muito recentemente, chamando-as de “populistas”, usam a mesma expressão para condenar as medidas econômicas anunciadas pelo novo governo dos Estados Unidos.
Assim, Donald Trump, Dilma Rousseff e, digamos, Cristina Kirschner são igualmente chamados de “populistas” e anti-mercado.
A pesquisa Bank of America – Merryl Linch sobre economia global, publicada no dia 7 de dezembro, aparece em artigos nesta semana, e ajuda a entender como as grandes fortunas se movimentam: seu pressuposto é de que a política protecionista anunciada por Trump, e sinais de “populismo” na Europa, exigem mais flexibilidade do capital financeiro.
E adivinhe qual é uma das recomendações? – a compra de ativos em países emergentes.
Mas essa é apenas uma das muitas possibilidades que o estudo oferece aos investidores. Evidentemente, uma pesquisa como essa contém uma enorme complexidade, suas indicações são destinadas a quem administra dinheiro realmente grande e são recebidas como uma orientação geral de estratégias de investimento.
Acontece que os analistas que pontificam na mídia brasileira, principalmente aqueles que dominam a cena da chamada grande imprensa, pegam esses dados e fazem uma digestão rápida, usando-os seletivamente para justificar certas propostas do governo interino.
Por exemplo, o trecho da pesquisa que fala no provável interesse do capital internacional por ativos, é usado pelo jornalista para defender a privatização do patrimônio público, considerando que o governo precisa fazer caixa muito rapidamente para – digamos – reformar ou construir presídios.
Entende como funciona? – Primeiro deixamos explodir os presídios, depois vamos vender o patrimônio público para construir presídios.
Na verdade, nenhum desses especialistas em generalidades tem tempo sequer para ler o resumo executivo de uma pesquisa como essa, porque eles têm que estar o tempo todo produzindo – estão onipresentes no rádio, na TV, na internet e nas folhas de jornais.
O que eles fazem é catar aqui e ali argumentos supostamente bem fundamentados para defender a ideia de que um bom governo é aquele que direciona as políticas públicas no sentido do interesse do sistema financeiro.
Quem disse?
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(Fonte: AQUI).
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Sobre o termo MIDIOTA, o autor escreveu elucidativo texto, divulgado em 2015 - aqui. Um trecho:
"... Como no 'vidiota' do romance de Jerzy Kosinski que inspirou o filme intitulado Muito além do jardim, a intensa exposição à mídia, sem o contraponto do senso crítico, pode ser uma prática perigosa. O indivíduo habilitado para interpretar a narrativa e o discurso propostos pela mídia nesse papel é também capaz de questionar o sentido que a mídia propõe para os acontecimentos do cotidiano.
Um grande contingente de cidadãos em condições de distinguir os vários significados das situações que a imprensa lhes apresenta será mais senhor de seu destino e se tornará menos vulnerável a discursos manipuladores e demagógicos.
O dilema está no fato de que esse benefício depende em grande parte de uma determinação da mídia hegemônica de usar seus recursos eticamente e com grande empenho estético. O problema se complica quando a própria imprensa faz escolhas contrárias à ética, esteticamente inadequadas e fora do propósito do bem, com o objetivo de usar a conectividade social que lhe é atribuída para arregimentar adeptos a um modo de vida simbólico que contraria o interesse coletivo."
O arremate:
"...Quando dizemos que 'você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito', estamos apostando que, exercitando a observação crítica da imprensa, o indivíduo se educa para a mídia. Essa distinção de habilidades é o que faz, de uns, midialiteratos e, de outros, no ponto extremo dos que acreditam em tudo o que leem, midiotas."
Mais didático, impossível.

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Nota:

Exemplo eloquente da necessidade de acionamento de senso crítico: a cobertura midiática (GloboNews à frente) sobre Lava Jato e arredores: na manhã de hoje, o jornalista Camarote abordou durante longo tempo a real possibilidade de colaboração premiada de Eike Batista, mas observando o seguinte roteiro: sobre o partido político golpeado, explícita alusão (como no que respeita ao ex-ministro Mantega); sobre os virtuosos, referência vaga ("partidos de 'a' a 'z'), com obsequioso silêncio relativamente ao fato de o ex-bilionário haver, em interrogatório realizado meses atrás, revelado a disposição de falar sobre o PSDB, para o que entregou em mãos relação de nomes, a qual foi imediatamente recusada pelos doutos interrogadores, conforme se vê AQUI.

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