domingo, 29 de janeiro de 2017

CRÔNICA MOREYRENSE


Através

Por Álvaro Moreyra

O Brasil tem superprodução de ideias. Como nenhum país estrangeiro nos importa essa mercadoria, o resultado de tantos anos perdidos só não vê quem não quer: cada vez as ideias se tornam mais baratas e a maior parte delas já se deteriorou.
Não garanto mas desconfio que a culpa é do clima. Tanto calor, tanto temporal. Tanta gente “a dizer o que entende”, a expor planos, a criticar o que se faz direito, a insistir pelo o que se faz torto. Ninguém fica quieto no que é. Não há votação nem profissões. Há confusão. Dia de S. Bartolomeu perpétuo nas cabeças.
Há anos, um homem que eu conheci, calmo, simpático, de casaco de alpaca, me declarou:
- Sabe de uma coisa? Vou deixar de ser burro!
Ideia que inventara de repente. Tentei convencê-lo de que devia continuar como era. Não convenci.
Meses depois estava excitado, carrancudo, com outro casaco, foi a Caxambu e nunca mais melhorou. Esqueceu-se das origens. Saiu dos limites.
Muitos assim, agindo em setores diferentes, criaram essa balbúrdia, essa mistura, esses boatos…
(Álvaro Moreyra, 1932. - Fonte: aqui).
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No Brasil de hoje, instado a citar ao menos uma coisa gratificante no cenário político-econômico, Moreyra, que abominava as notícias sombrias ("As Amargas, Não"), daria o 'calado por resposta', como dizia o coronel Joffre, irascível personagem do folclore político piauiense de décadas atrás.

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