A classe média convicta da herança de dona Marisa
Por José Carlos de Assis
Estava na sala de espera de uma médica no Rio quando minha mulher e eu iniciamos uma agradável conversa política com uma senhora aparentando 60 anos e com jeito de classe média alta. Falamos, naturalmente, sobre a profunda crise econômica, política e moral em que vivemos e sobre a responsabilidade que os políticos em geral, segundo ela, tinham a esse respeito. Notei que ela não fazia nenhuma distinção: eram todos os políticos. Todos ladrões sem exceção. A crise se devia exclusivamente a isso, o roubo dos políticos ladrões.
Tentei dar um curso mais qualificado à discussão mas não adiantou. Ao contrário, ela veio com uma verdadeira bomba: Dona Marisa, mulher de Lula, deixou uma verdadeira fortuna como herança. Perguntei como soube disso. Afinal, dona Marisa era uma primeira-dama discreta, incapaz de se meter em qualquer trapalhada. Ela não esclareceu a acusação, mas prosseguiu com um nível tal de convicção que me perguntei quantos milhares de pessoas, se ela tivesse acesso à internet, seria capaz de influir.
Fala-se em fake news. Mas esse é o caso típico de fake boatos: é o segundo nível da fofoca, um nível acima da fofoca que é apenas uma distorção da verdade. Já a fofoca de segundo nível não tem base nenhuma de plausibilidade. É mentira pura. E isso entra pela casa das pessoas sem qualquer controle já que existe uma predisposição para aceitar o uso de instrumentos de informação “modernos” colocados à mão de todos os cidadão capazes de operar um computador ou um telefone celular. A rigor, não há remédio contra isso.
Note-se que a política brasileira tem sido manipulada secularmente por meio de notícias falsas. De memória, lembro do Plano Cohen, escrito por um capitão integralista denunciando um suposto programa de tomada do poder pelos comunistas nos anos 30; e da Carta Brandi, um suposto plano, nos anos 50, tramado desde a Argentina para transformar o Brasil numa república sindicalista. Mentiras absolutas, esses foram fake boatos que ocuparam o centro da política brasileira em sua época, aceitos por muitos como verdades.
O fato é que não é a mentira, em si, que dá curso ao boato, mas o ambiente criado em larga escala em torno dela que promove sua aceitação. Veja o noticiário econômico da TV Globo: é construído principalmente por fake news. Quem não tem experiência jornalística não é capaz de entender o grau de manipulação a que está sujeito. O noticiário econômico de tevê é montado não por fatos, mas em torno de uma tema central decidido pelos editores, não pelos repórteres. O repórter apenas compõe o quadro na direção determinada pelo editor.
Tome por exemplo uma informação que circula pela manhã sobre o crescimento do PIB: o comentarista Sardenberg dirá que o aumento de 1% é um indicador de recuperação da “confiança” na economia por parte do empresariado. Um repórter entrará no jogo mostrando que uma empresa no interior paulista produziu mais do que no ano anterior, sinalizando a recuperação do mercado. A ideia geral, de cuja difusão participam outros repórteres e comentaristas, é que a economia está efetivamente se recuperando.
Se fossem honestos diriam que o aumento de 1% do PIB no primeiro mês do ano é extremamente pífio quando se compara com a contração de 7,6% em 2016 e 2017. A informação franca diria que não há fundamento estatístico para dizer que estamos em recuperação. Entretanto, é preciso criar o ambiente segundo o qual a economia está entrando nos eixos pois, do contrário, alguém poderia começar a pensar que, no final das contas, o impeachment de Dilma Rousseff foi uma estupidez.
O mesmo ocorre com o desemprego. A Globo esconde que o trabalho informal, depois da famosa reforma trabalhista que ela apoiou ardentemente, ultrapassou no último mês o número do trabalho formal. Também esconde, quando fala sobre uma pequena baixa do desemprego, sobre o aumento vertiginoso do subemprego. São legítimas fake news escondidas no noticiário factual criando um ambiente de promoção de mentira. Nesse ambiente, é natural que uma senhora de classe média elegante tenha tanta certeza de que dona Marisa deixou uma imensa herança. - (Fonte: Aqui).
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Tão perniciosas quanto as fake news são as IMPOSSIBLE NEWS, aqueles fatos que estão acintosamente quicando na pequena área, se oferecendo para serem convertidos em gol jornalístico, mas dos quais a grande imprensa 'parece' querer distância.
Nesse sentido, e para ficarmos no caso a nosso ver mais eloquente:
.Quem, afinal, deixou de ver o depoimento - AQUI - prestado mediante videoconferência por Tacla Durán, ex-advogado da Odebrecht, à CPMI da JBS levada a efeito ao final do ano passado no Congresso Nacional?
.O que pode explicar o fato de um jornal investigativo como a Folha de S.Paulo, por exemplo, 'deixar passar' o curiosíssimo sumiço de qualquer referência sobre as acusações de Tacla Durán (e até mesmo a seu nome) no relatório final da citada CPMI?
.Por que a grande imprensa está deliberadamente desperdiçando a oportunidade de ir à Espanha para tentar pôr tudo em pratos limpos, entrevistando o depoente?
Como rezava a gíria vigente nos áureos tempos do O Pasquim, Impossible News é isso aí!
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Tão perniciosas quanto as fake news são as IMPOSSIBLE NEWS, aqueles fatos que estão acintosamente quicando na pequena área, se oferecendo para serem convertidos em gol jornalístico, mas dos quais a grande imprensa 'parece' querer distância.
Nesse sentido, e para ficarmos no caso a nosso ver mais eloquente:
.Quem, afinal, deixou de ver o depoimento - AQUI - prestado mediante videoconferência por Tacla Durán, ex-advogado da Odebrecht, à CPMI da JBS levada a efeito ao final do ano passado no Congresso Nacional?
.O que pode explicar o fato de um jornal investigativo como a Folha de S.Paulo, por exemplo, 'deixar passar' o curiosíssimo sumiço de qualquer referência sobre as acusações de Tacla Durán (e até mesmo a seu nome) no relatório final da citada CPMI?
.Por que a grande imprensa está deliberadamente desperdiçando a oportunidade de ir à Espanha para tentar pôr tudo em pratos limpos, entrevistando o depoente?
Como rezava a gíria vigente nos áureos tempos do O Pasquim, Impossible News é isso aí!
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