terça-feira, 17 de dezembro de 2019

ABRAM ALAS PARA O PROJETO CHICAGO

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O apocalipse: Modelo exportador agro-mineral, eliminação de tarifas de produtos industrializados, extinção da saúde pública, extinção da universidade pública, fim do sistema de aposentadorias com recursos do Estado, fim do programa de moradia popular, fim da agricultura familiar, privatização total de serviços e equipamentos públicos, eliminação dos encargos sobre folha de salários, etc., etc., etc. O Estado Mínimo em sua mais singular tradução.
'O Projeto é um todo organizado e racional, operado em etapas.' 

Projeto Chicago - o plano econômico em curso 

Por André Araújo 

Há uma percepção errada na esquerda sobre a inexistência de um projeto econômico no atual governo. É um projeto mais amplo, de natureza economicista pura, que opera em conexão com plataformas de natureza ideológica definida.  Vamos a algumas linhas desse PROJETO CHICAGO, gestado por gente que circulou na escola de economia da Universidade de Chicago nos anos 1980 e que, como acontece em cérebros sem densidade cultural anterior, absorvem ensinamentos como pregação religiosa não sujeitos a reflexão, revisão e reciclagem. As aulas de Friedman nos anos 70 e 80 hoje nos EUA são matéria de arquivo no museu das ideias, depois da crise de 2008 houve uma completa reversão dos ensinamentos de Chicago, a quem se atribuiu a crise.
O neoliberalismo dos anos 80 foi enterrado pela elite empresarial americana conforme relatei em artigo anterior sobre o manifesto do BUSINESS ROUNDTABLE (reproduzido por este Blog - Aqui), conclave das 200 maiores corporações globais, colocando um ponto final na visão ideológica do neoliberalismo dos anos 80, considerado causador de tensões sociais insuperáveis nos próprios EUA e com reverberação mundial na Europa e na América Latina, não atingindo a Ásia onde culturas ancestrais criaram uma moldura de proteção familiar própria e onde ideologias exóticas, como o neoliberalismo, não tem porta de entrada.
Os pontos principais desse Projeto, já em execução por etapas são:
1.MODELO EXPORTADOR AGROMINERAL – A economia brasileira deve se concentrar em mineração, agricultura e pecuária de exportação, não precisa de indústria porque é possível comprar produtos industrializados mais baratos no exterior. O agronegócio pode absorver com folga preço mais elevado de fertilizantes e agrotóxicos que passarão a custar mais em Reais, quem não pode suportar preços mais altos de fertilizantes é a agricultura familiar, mas essa, segundo o projeto, deve desaparecer, não tem lugar no projeto porque é possível importar frutas e vegetais do exterior.
Quando o Presidente Trump disse que o Brasil está manipulando o câmbio para desvalorizar o Real, ele estava certo porque é disso que se trata e ele dispunha de informações seguras do Federal Reserve Bank de Nova York, o braço internacional do banco central americano. Nenhum indicador da economia brasileira justifica a alta inesperada da moeda americana: o Boletim FOCUS, que é a média dos prognósticos dos economistas do mercado financeiro, indicava no começo do ano um dólar de fim de ano de R$3,78, nada se alterou tanto para o dólar chegar a R$4,25, as reservas internacionais  do País continuam altas, o Banco Central opera largamente no mercado de câmbio com swaps cambiais e mercado spot,  pode levar a cotação para onde quiser.
Está clara a manipulação para desvalorizar o Real com objetivo de remunerar o exportador principal do País, o agronegócio, ao mesmo tempo que prejudica toda a população pela alta do preço dos combustíveis. Já na outra via da exportação, o modelo torna mais cara a carne brasileira que tem que atender preferencialmente ao mercado externo, mais lucrativo que o doméstico; a população pobre terá dificuldade para comprar carne.
2.ELIMINAÇÃO DE TARIFAS DE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS – É o sonho da “economia aberta” embutida no neoliberalismo puro, resgatando a memória de Eugenio Gudin, avô dessa visão de economia, para quem o Brasil não deveria ter indústria, “isso é coisa para a Bélgica, nós devemos viver do café”, que era o agronegócio daquele tempo. O plano de eliminação de tarifas contraria toda a lógica do governo Trump, que usa tarifas para defender a indústria e os empregos industriais, a China. A Índia, a Russia, a França apenas citando alguns, tem claras políticas industriais que incluem proteção tarifária. Mas os neoliberais puros tem tal fé na economia aberta que acham que vale a pena eliminar tarifas sem contrapartida, quer dizer, vamos importar livremente mesmo de países que impõem tarifas aos produtos brasileiros, o que já acontece hoje com os EUA, importamos etanol americano com tarifa zero enquanto os produtos brasileiros para os EUA, inclusive o etanol e o açúcar são tarifados, assim como o aço e o alumínio, agora Trump ameaça com sobretarifa acima da taxa normal, já fez isso com importação da China e ameaça a França com sobretarifa de 100%.
3.EXTINÇÃO DO SUS E DA SAÚDE PUBLICA – Cortes de verbas na saúde já estão em curso, na extinção do seguro obrigatório de veículos, só isso, retira R$6 bilhões do SUS, mas deixa a cargo do SUS o atendimento a acidentados nas estradas, agora sem seguro. A linha dessa decisão segue a extinção do seguro saúde nos EUA e no Chile, exemplo muito admirado pelos formuladores do atual projeto econômico. O sentido econômico é poupar recursos para atender ao serviço da dívida pública, prioridade central do projeto econômico, quem quiser atendimento de saúde que pague, se não puder, fique sem saúde.
O quadro já é bem conhecido, hospitais lotados e sem condições de atendimento, doentes em macas nos corredores, cirurgias urgentes agendadas para 6 ou 8 meses à frente, faltam remédios, médicos e enfermeiros que não recebem em dia, o atendimento em regiões remotas pelo MAIS MÉDICOS desmontado para não se organizar mais. A precarização da saúde economiza verba e melhora o ajuste fiscal, o custo humano é irrelevante para os neoliberais das cavernas, já está precificado e ao final faz parte do Projeto, como veremos.
4.EXTINÇÃO DA UNIVERSIDADE PÚBLICA – Já em curso por uma série de ataques do Ministro da Educação à universidade pública gratuita, o objetivo final é a extinção desse tipo de instituição, citam os EUA, mas esquecem que lá existem importantes universidades públicas como a Universidade da Califórnia.
Assim como no caso do SUS, o fim da universidade pública ou, na primeira etapa, da gratuidade, economizaria enormes recursos para o resgate da dívida pública. A ideia é que toda a educação superior seja direcionada para escolas particulares a preços de mercado, tirando o Estado do ensino superior e pesquisa, dos programas de bolsa de pós graduação e mestrado, a ideia é que educação superior deve ser para a elite que pode  pagar, embora, curiosamente, os autores do Projeto tenham estudado no exterior à custa do Estado, exatamente o programa que querem extinguir.
5.FIM DO SISTEMA DE APOSENTADORIAS COM RECURSOS DO ESTADO – A Reforma da Previdência aprovada não é o que o Projeto Chicago pretendia ao final. O objetivo é a APOSENTADORIA POR CAPITALIZAÇÃO, onde as empresas e o Estado não investem nada, só o empregado, que deve poupar para se aposentar. Já está em curso drástica redução de despesa no INSS através de um “programa de combate à fraude” pelo qual já foram cortados 277.000 benefícios. O número é espantoso porque é inimaginável que se ache tantas fraudes em menos de três meses, muitos casos são irregularidades formais ou pessoas que não souberam que precisavam se apresentar, cortou-se a granel para fazer economia, deixando pobres à míngua, não há ricos na pista do INSS. A ideia é prosseguir nos cortes de benefícios e retardar ao máximo a concessão de novas aposentadorias, já está em curso essa política, tudo com grandes resultados em economia sempre na linha de cortar do pobre e não no andar de cima, esses são sócios do Projeto.
6.FIM DO PROGRAMA DE MORADIA POPULAR – Outro dreno de recursos públicos, segundo o Projeto, o Estado não deve gastar recursos nessa área onde a Caixa é a principal financiadora com dinheiro do FGTS, que deve ser extinto. Os bancos tampouco têm interesse nesse segmento, financiam apenas imóveis para o setor de alta renda. Os programas de moradia popular, segundo o projeto, têm um caráter socialista e devem ser extintos, o mercado deve atender se quiser e puder o segmento de moradia popular, considerando-se as “milícias” que controlam territórios como parte da solução de mercado, elas constroem e alugam moradias em territórios dominados e a tolerância a essa pratica já indica um roteiro para a moradia popular sem o Estado.
7.FIM DA AGRICULTURA FAMILIAR E TITULAÇÃO DOS ASSENTADOS DA REFORMA AGRÁRIA – A agricultura familiar demanda crédito rural subsidiado, o que é contra a visão de economia de mercado, além do que ocupa áreas em torno de cidades que poderiam ser usadas para condomínios fechados para a classe alta, em áreas mais distantes podem ser destinadas ao agronegócio. Já os assentados da reforma agrária devem ter seus títulos de propriedade porque assim seria facilitada a venda de suas terras para o agronegócio, já que sem crédito e sem apoio do Estado esses assentamentos serão inviáveis.
Para desestímulo da agricultura popular deve-se acabar com a COBAL, os estoques reguladores, o seguro de safra e todo o tipo de garantias aos agricultores, o agronegócio não precisa de garantias do Estado porque opera diretamente com o exterior através das tradings agrícolas e da Bolsa de Chicago.
8.PRIVATIZAÇÃO TOTAL DE SERVIÇOS E EQUIPAMENTOS PÚBLICOS – Rodovias, aeroportos, metrôs, hospitais públicos, terras públicas inclusive da Amazônia, todas as estatais, tudo o que o Estado tem como bem com valor econômico deve ser privatizado com o mínimo de regulação, para dar retorno para os investidores. Especialmente interessantes para a privatização deverão ser os serviços de abastecimento de água em todo o país. A PETROBRAS E a ELETROBRAS obviamente serão privatizadas, depois o BANCO DO BRASIL e a CAIXA, o BNDES não tem como ser porque não é um negócio, mas já está sendo esvaziado com transferência de todos os seus recursos para o Tesouro, ao fim restará apenas o edifício-sede.
O Projeto não se impressiona com o fato de que todos esses serviços nos EUA, Canada e Europa são públicos. Nos EUA, água e esgoto são estatais, na maior parte da Europa também. A água sendo privatizada vai ter um preço muito mais alto, o que será bom para que o povo economize água.
9.ELIMINAÇÃO DOS ENCARGOS SOBRE FOLHA DE SALÁRIOS – Com a desativação da indústria pela abertura irrestrita de importação restam na economia os empregos no setor de serviços. O projeto considera imprescindível a eliminação dos encargos que o empregador paga hoje sobre a folha, como aposentadoria, seguro desemprego, Sistema S, FGTS, etc. O empregador deve pagar apenas o custo do trabalho a ser negociado livremente com o trabalhador nas condições de mercado, não devendo existir salário mínimo. Como há muito desemprego os custos do trabalho deverão cair, o que vai reduzir custos nas empresas, ajudando a manutenção de uma inflação baixa e mantendo alta a lucratividade do setor de serviços.
10.Segundo o Projeto, a economia brasileira não precisa de mais de 40 milhões de pessoas para funcionar, os 170 milhões excedentes são dispensáveis e significam um peso e não um ganho para a economia. São necessários executivos, secretárias, tratoristas, garçons, babás e cozinheiras, médicos, portuários, motoristas, atendentes de call centers, enfermeiras e policiais, sobram os demais que não estão nessas funções. A economia brasileira seria muito mais eficiente com uma população estável de 40 milhões de pessoas adequadas à economia de mercado.
O fim do SUS e do atendimento de doenças pelo Estado, o fim do sistema de aposentadorias pagas com recursos públicos, só vale aposentadoria por CAPITALIZAÇÃO, o fim dos empregos industriais, a mortalidade por balas perdidas com cobertura de “exclusão de ilicitude”, devem se encarregar de diminuir o estoque da população excedente. A inexistência de empregos viáveis para esse estoque de população vai precarizar a saúde e deve produzir a mortalidade necessária para o equilíbrio populacional, uma vez que não há espaço no campo e menos ainda nas grandes cidades para  essa camada sem instrução, sem aptidões, uma economia agrário-mineral e sem industrias simplesmente não tem ocupação economicamente viável para essa massa de pessoas irrecuperáveis para o sistema de mercado, dependentes integralmente da assistência do Estado, quem paga é a economia sadia dos 40 milhões de brasileiros de classe média e alta que não tem porque suportar o peso da população excedente, o Projeto é racional nesse aspecto.
O economicismo não tem amortecedores éticos, políticos, culturais ou morais, é só economia funcionando sob as regras puras de oferta e procura, o que é a essência do neoliberalismo selvagem, segue a mesma lógica dos galeões ibéricos que transportavam escravos da África para as Américas, quando um cativo ficava doente era jogado ao mar e assim se economizava comida. É a lógica do Projeto Chicago, sem a população excedente se economiza na saúde, no saneamento, nas prisões, na polícia, o Estado fica mais leve e enxuto, o País mais limpo e seguro. Essa é a essência do Projeto e todas as decisões da área econômica já em curso levam a seus objetivos claros e bem formulados, mas ainda tem muita gente que não entendeu a lógica.
Soluções extraordinárias já estão sendo aplicadas ao meio ambiente, com autorização na prática das queimadas, extração de madeira, plantação de cana na Amazônia e no Pantanal, garimpos e mineração em terras indígenas, na área de educação com a campanha contra universidades públicas, na área da cultura com nomeações anti-culturais  nos órgãos de promoção e apoio à cultura, na área do trabalho com a retirada gradual de direitos e amparos aos trabalhadores, na área da saúde com diminuição programada dos recursos do SUS, na área de segurança pública com licença para tiro livre em zonas densamente povoadas, provocando mortes em série no meio da população excedente. O Projeto é um todo organizado e racional, operado em etapas.
Os pontos mais polêmicos do Projeto Chicago são embutidos e disfarçados em decretos, medidas provisórias e atos administrativos simples, não são explicitados e, por isso, existe a impressão de que não há plano econômico em curso, que é falso. Há um plano sendo executado com método e técnica do qual é sócio e parceiro o chamado “mercado financeiro” e parte do empresariado que será beneficiado pelo Projeto e que se apresenta com entusiástico apoio de parte da população que, por intuição, acha que vai se beneficiar com essas soluções. A História já conheceu cruzadas semelhantes.  -  (GGN - Aqui).

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