domingo, 25 de agosto de 2019

XADREZ DE MORO, DALLAGNOL E BOLSONARO, E A BUSCA DO INIMIGO EXTERNO

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Enquanto isso, 'G7 aceita ajudar o Brasil a combater as queimadas, diz Macron' (Aqui), e 'Bolsonaro enquadra Moro e diz que pode vetar qualquer coisa que ele fizer' (Aqui). No mais, só mesmo o desprezo que a Constituição Federal continua a merecer das emissoras líderes: nenhuma alusão pode ser feita a ela nas abordagens sobre a Lava Jato, que, ao fim e ao cabo, prevalece erga omnes, sob o aplauso entusiástico de alguns dos Guardiões da Carta Magna.


Xadrez de Moro, Dallagnol e Bolsonaro, e a busca do inimigo externo

Por Luis Nassif 

A enorme confusão em que se transformou o governo levou o presidente Jair Bolsonaro e o Ministro da Justiça Sérgio Moro a duas ações com um mesmo objetivo: recriar a figura do inimigo externo, como forma de tentar se fortalecer internamente.
No caso de Bolsonaro, com uma fantasiosa ameaça nuclear, endossada pelo general Villas Boas. No caso de Sérgio Moro, colocando os delegados moristas para novas invasões de residências e tentativas de intimidação de advogados, valendo-se do indefectível depoimento de Antônio Palocci.

Peça 1 – a guerra do meio ambiente

Há tempos Bolsonaro tenta criar um clima de guerra, como maneira de fortalecer seu controle sobre seus seguidores. Não conseguiu avançar no plano interno, devido à falta de disposição da oposição em partir para o enfrentamento. Encontrou no meio ambiente o caminho correto, com agressões a mandatários europeus.
Vamos entender um pouco a lógica grotesca de Bolsonaro.
Passo 1 – o Mercosul fecha acordo comercial com a União Europeia. Bolsonaro não tem a menor ideia sobre as consequências desse acordo, mas saúda efusivamente os negociadores e se apropria do mérito da operação.
Passo 2 – é alertado por Donald Trump de que o acordo poderia comprometer o futuro acordo com os Estados Unidos. Submisso, passou a torpedear o acordo com a União Europeia em sua parte mais delicada, os compromissos com o meio ambiente, ponto central para o fechamento do acordo.
Passo 3 – Como é um completo sem-noção, foi aumentando o tom das críticas aos mandatários europeus, atacando Angela Merkel, da Alemanha, Emmanuel Macron, da França, a Noruega, e entrando até o pescoço na escatologia, visando criar motivos para a não concretização do acordo.
Passo 4 – a intenção de provocar um impasse com os europeus foi explicitada pelo general Hamilton Mourão, ao dar uma de Bolsonaro e atribuir os tremores de Merkel a um suposto medo de Trump.
Passo 5 –  para ampliar mais ainda o confronto, deu carta branca ao suspeitíssimo Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, para desmontar completamente a estrutura de fiscalização do IBAMA.
Passo 6 – animados pelas palavras de Bolsonaro, fazendeiros do Pará estimularam o “dia do fogo”, que acabou promovendo uma queimada cujas cinzas chegaram até o extremo sul do continente (clique aqui).
Desfecho – com a eclosão das queimadas na Amazônia, o desatino de Bolsonaro criou o maior problema diplomático brasileiro desde a ditadura, com ameaças diretas ao agronegócio e aos investimentos externos no país, obrigando-o a um recuo.

Peça 2 – a criação do inimigo externo

Há algum tempo, seus filhos tuitaram mensagens sobre supostas ameaças nucleares ao Brasil, em função do problema ambiental. E o indescritível general Villas Boas  endossou as pirações.
Com uma clareza dificilmente vista, estamos assistindo a mais um país europeu, dessa vez a França, por intermédio do seu presidente Macron, realizar ataques diretos à soberania brasileira, que inclui, objetivamente, ameaças de emprego do poder militar.
Logo em seguida, Bolsonaro incendeia a discussão com suas afirmações estapafúrdias sobre a Amazônia e o meio ambiente, somadas a ações concretas do Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, de desmonte da fiscalização ambiental.
O mesmo Villas Boas saúda os brasileiros que estão desmistificando a questão indígena e ambiental, colocando corretamente no mesmo balaio Ricardo Salles, Aldo Rebello.
Finalmente, o Jornal Nacional introduz novos componentes políticos no debate, ao comparar indevidamente afirmações de Lula e Bolsonaro sobre a questão ambiental.
De qualquer modo, a afirmação do presidente francês Macron satisfez todos os lados. Ele atende a seu eleitorado. Fornece a Bolsonaro o álibi para a melhor das guerras, uma guerra de retórica em que não haverá a possibilidade de se ter presidente deposto nem militar derrotado ou preso. E deturpa completamente a noção de soberania da Amazônia, com responsabilidade ambiental.

Peça 3 – o reforço do inimigo interno

Hoje, o procurador Deltan Dallagnol deu uma longuíssima entrevista à Gazeta do Povo, de Curitiba, lamentando o pouco caso com que a mídia passou a tratar as operações da Lava Jato. Entendeu corretamente que o fio virou e, agora, o que dá manchete são os vazamentos do Intercept. E repetiu várias vezes as conclamações para a população voltar à rua, expediente que ajudou a dobrar a espinha flexível do ex-Procurador Geral da República Rodrigo Janot.
Particularmente curioso é o seguinte trecho, seja lá o que signifique:
“A grande verdade, e aí eu sigo o filósofo John Rawls, é que a maior parte daquilo que você alcança na vida vem por fatores aleatórios, como a visibilidade da Lava Jato. Ainda que você tire todo o meu mérito na Lava Jato, ainda assim, se você olhar outros fatores que levam ao sucesso na vida, eles são aleatórios – como a família que você nasceu, como os talentos que você herdou e assim por diante. E o que ele coloca é que isso [a diferença entre o sucesso de alguns e insucesso de outros] deve ser tratado como uma política pública de redistribuição de recursos, sem desestimular a atividade econômica. Mas isso deve ser resolvido por política pública e por tributação. Eu pago mais de 30% do valor sob tributos dessas palestras. Existe uma redistribuição de valores, e o fato de você ter que tratar isso por políticas públicas ou tributação, não impede, não torna imoral, algo que é bom para a sociedade. Às vezes, as pessoas tem uma ideia de que servidor público não pode ganhar recursos. Pode sim. Não existe nenhuma regra moral que condene você ganhar recursos e até enriquecer, se for o caso.”
Enquanto isto, Sergio Moro acionou a juíza Gabriela Hardt para mais uma ofensiva. A invasão da casa de André Esteves, do Banco Pactual, visou constranger a revista Veja, em sua parceria com o The Intercept, cuja venda foi bancada por apoio financeiro do BTG Pactual.
Avançou-se também sobre o advogado de Lula, José Roberto Batochio. Como o Ministério Público não endossou o pedido da Polícia Federal de Moro, de invadir a casa de Batochio, a juíza concedeu uma invasão no prédio onde tem escritório, para recolher dados sobre visitas registradas.
Ao mesmo tempo, a Lava Jato tenta  recriar o clima de caça às bruxas como forma de constranger o Supremo Tribunal Federal (STF), que proximamente irá analisar a questão da suspeição de Moro no julgamento de Lula.

Peça 4 – desdobramentos

A ofensiva da juíza Hardt visou afrontar o Conselho Nacional de Justiça e o próprio Conselho Nacional do Ministério Público em um momento em que são pressionados a tomar atitudes contra as arbitrariedades da Lava Jato.
O resultado será o fortalecimento da Lei Contra Abusos de Autoridades e o enfraquecimento de projetos visando conferir autonomia à Polícia Federal. Afinal, como dar autonomia a um poder que não consegue controlar os esbirros autoritários de seus membros?
Ainda não caiu a ficha da parte saudável da Polícia Federal e do MPF sobre os prejuízos que essas arbitrariedades trazem às respectivas corporações.

A ofensiva da Lava Jato apenas acelerará as medidas de controle nas instâncias superiores. E demonstra que a operação perdeu o fôlego que tinha, em convocar manifestações e intimidar chefias.
Nas próximas semanas, continuará a desmoralização da Lava Jato pelo Intercept, de Sérgio Moro por Jair Bolsonaro, e de Bolsonaro por ele e filhos.  -  (Aqui).

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