"'Claro como o sol' - aqui, reproduzido do blog Racismo Ambiental - é o título de um artigo escrito pelo filósofo Vladimir Safatle, no qual ele destaca a diferença estrutural entre cinismo e hipocrisia. A hipocrisia, diz ele, é o mascaramento de intenções e, por meio de proposições corretas, mascara intenções inconfessáveis. Há uma contradição que precisa ser escondida, enquanto no cinismo as contradições expostas não surtem efeito nenhum. É nessa linha que, sem fazer referência expressa ao capitão do mato da Farsa Jato, ele realça o sentido oculto da corrupção de um juiz que usa a justiça para favorecer um candidato e, ao final, tem como recompensa um cargo público.
Retomo o texto do filósofo, a propósito do candidato Coiso ter saído vitorioso na fraude eleitoral de 28 de outubro passado. Trato por fraude o que seria um pleito eleitoral, não necessariamente por imaginar que urnas tenham sido fraudadas na contagem dos votos. Mas, também não imagino que não possa ocorrer fraude, pois, dizer que urnas são imunes à violações faz parte do cinismo e da hipocrisia de que fala o filósofo. Não custa lembrar que o FBI (Polícia Federal dos EUA), por exemplo, está oferecendo U$ 3 milhões pela captura de Evgeniy Bogachev o cibercriminoso mais procurado do mundo. Leia-se, por violação de sistemas tidos como seguros e invioláveis.
Uso termo fraude e não aceito a pecha de mimimi de derrotado, pois sempre desconfiei dos sete monges extraterrestres, acima do bem e do mal, que guardam o segredo das urnas. Quem seriam esses seres sem partido, sem religião, sem preferência por candidatos, fiéis a um conceito democrático e republicano, pouco importa quem seja o governante de plantão? Hummm... Sei não!
Digo, pois, de forma imprecisa e conceitual, o que todos sempre souberam mas que a combinação do cinismo + hipocrisia nunca quis admitir. A chave da fraude eleitoral, no caso, não diz respeito à contagem de votos, mas sim esteve na mão do carcereiro do ex-presidente Lula, lá na republiqueta de Curitiba. Ao mesmo tempo, esteve nas mãos dos juízes eleitorais e dos ministros da dita corte suprema, que fraudaram a lei para prender o candidato favorito. Do mesmo modo, vadiou nas mãos da mídia corporativa que fabricou/fomentou o ódio ao Partido dos Trabalhadores e de forma cínica e hipócrita fingia não ter candidato e até sem fingir. Aliás, com a mesma hipocrisia e cinismo, logo se tornará aliada do fascismo em ascensão.
O Coiso foi um candidato de plástico envolvido e urdido numa rede de farsa, desde os primórdios do golpe. Teve o dedo de Steve Bannon, como pontuado neste GGN, criador de uma nuvem de fumaça antes, durante e depois da campanha, de forma a torna imprecisa qualquer avaliação que se faça do Coisopata. Mas, embora tudo tenha sido farsa, formalmente o Coiso venceu por que teve mais votos, parte deles com a ajuda do seu cabo eleitoral Sejumoro.
Inspirado nessa aparente relação promíscua Coiso/Moro, o filósofo Safatle discorreu sobre cinismo e hipocrisia. Ao contextualizar suas reflexões trouxe à baila a indicação de Sejumoro para o ministério da Justiça. Entretanto, a relação Coiso/juizeco versus cinismo/hipocrisia recebe um nome bem diferente no Art. 319 do Código Penal. Trata-se de prevaricação, ou seja, um crime praticado por servidor público, movido por interesses pessoais.
Prevaricar significa faltar com deveres funcionais. No Brasil, o direito define como “retardar ou deixar de praticar indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa em lei para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”. Lato senso é também uma forma de corrupção.
A postura de Sejumoro sempre causou perplexidade no mundo jurídico. Além das quase 300 conduções coercitivas já consideradas ilegais pelo STF, entre elas a do ex-presidente Lula, o magistrado promoveu a divulgação criminosa de conversas da presidente Dilma Rousseff (resolvida no Conselho Nacional de Justiça com um pedido de desculpas). Nesse último caso, estivesse, por exemplo, nos Estados Unidos, teria ido para a cadeia. Mais recentemente, ele atropelou decisão do desembargador Rogério Favreto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). Sem contar que às vésperas das eleições permitiu e ou se omitiu diante da divulgação de colaborações premiadas feitas por Antônio Palocci, já rejeitadas pelo Ministério Público por falta de prova.
O que pretendia o tal juiz ao tomar aquela atitude às vésperas das eleições? Pelo acima exposto, aquele barnabé judicial exerceu às turras uma miríade de ativismo judicial sem precedentes numa democracia. Era como se seus abusos fossem prenúncios dos abusos prometidos pelo Coiso. Enquanto isso, passivamente, muitos ingênuos viam naquilo “erros menores”, acolhidos para a preservação de bens maiores - como se o Estado de Direitos em si e a própria Democracia fossem bens menores. Foram muitos os indicadores da ocorrência de sentimentos pessoais, dado essencial para caracterizar o crime de prevaricação.
A melhor doutrina ensina e assim tem acolhidos os tribunais, que a prevaricação exige a demonstração do especial fim de agir, caracterizado pelo animus de satisfazer interesse ou sentimento pessoal.
Juntando a farsa do golpe, a farsa eleitoral, as manipulações de Bannon tudo pode ser ou não ser. Mas, ao que consta, Sejumoro aceitou o convite do Coiso para ser ministro da Justiça. Cinismo e hipocrisia à parte, se ainda existia dúvidas quanto às condutas erráticas daquele magistrado, mais que nunca seus atos receberam a indelével chancela de terem sido praticados para atender sentimentos/interesses pessoais.
Se ainda resta alguma credibilidade no Ministério Público Federal e no Poder Judiciário, essa conduta aparentemente criminosa precisa ser levada a sério. Sejumoro prevaricou o tempo todo. É isso, STF?"
(De Armando Rodrigues Coelho Neto, post intitulado "Coisas do Coiso. Sejumoro prevaricou o tempo todo. É isso, STF?", publicado no GGN - aqui.
Armando Rodrigues, jornalista e advogado, é delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo.
Independentemente de ter havido, ou não, prevaricação por parte do ínclito magistrado, convém ter em mente, sempre, o que disse meses atrás o então corregedor e atual presidente do STJ, João Otávio de Noronha: 'O Brasil precisa de muitos Moros'. Quem espera algo diferente do que sempre se tem visto?).
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