domingo, 24 de dezembro de 2017

O PENTÁGONO E OS DISCOS VOADORES

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Dwight Eisenhower, quando presidente dos EUA, teria tido três encontros com ETs, conforme revela um ex-assessor (aqui)? Qual a eventual ligação entre John F. Kennedy, discos voadores e a tragédia de Dallas, em agosto de 1963 (aqui)? Enquanto teorias da conspiração se proliferam, eis que a imprensa oficial dá conta de que o governo norte-americano teria despendido, durante algum tempo, 22 milhões de dólares para investigar o fenômeno UFO, informação que se agrega a muitas outras - não divulgadas da imprensa oficial - sobre investimentos da espécie, matéria, aliás, já do conhecimento do público aficionado no assunto. Cientistas diversos e céticos em geral, por sua vez, tratam de desmontar expectativas (e factoides, claro). A exemplo de Carlos Orsi, abaixo. Não obstante, vale lembrar o que Shakespeare pôs na boca de um de seus personagens: "Há mais coisas entre o Céu e a Terra do que nossa vã filosofia consegue imaginar, Horácio". Ou não, como diria Caetano. 


O Pentágono e os discos voadores

Por Carlos Orsi

Deu no New York Times: durante cinco anos deste século, entre 2007 e 2012, o Departamento de Defesa dos Estados Unidos gastou U$ 22 milhões de seu "black budget" -- o orçamento secreto usado para financiar coisas, bem, secretas -- com algo chamado Programa de Identificação de Ameaças Aeroespaciais Avançadas. Em linguagem normal, um departamento secreto de caça a discos voadores.

O dinheiro e o departamento apareceram graças a uma aliança de três senadores (dois democratas e um republicano) interessados em ufologia.  O principal artífice da ideia foi Robert Reid, do Partido Democrata de Nevada. Parece haver uma certa afinidade entre os democratas e a ufologia, amis ou menos como há entre republicanos e criacionismo: John Podesta, estrategista de campanha de Hillary Clinton, é um crente de teorias de conspiração envolvendo alienígenas.

O programa financiado por Reid não representa a primeira vez que militares americanos se interessam por óvnis, claro. De 1952 a 1969, o Projeto Blue Book da Força Aérea coletou diversas supostas aparições de naves alienígenas, apenas para concluir que a esmagadora maioria não passava de maus entendidos -- o planeta Vênus, a Lua, balões, aviões, etc. Mais cedo, em 1953, um comitê de cientistas reunido pela CIA já apontara que não havia realmente nada de interessante acontecendo.

Mas se os meados do século passado foram uma época de expansão do papel do Estado, os anos 2000 existem sob um zeitgeist diferente, e o  Programa de Identificação de Ameaças Aeroespaciais Avançadas optou por terceirizar suas atividades para a iniciativa privada. O empreiteiro contratado, aponta o NY Times, foi o empresário Robert Bigelow, cuja firma Bigelow Aerospace trabalha desenvolvendo hábitats espaciais infláveis. Vale a pena notar que a firma de Bigelow é baseada em Las Vegas, e o senador que achou dinheiro para o programa representa o Estado de Nevada, onde fica Las Vegas.

Uma vez tendo recebido sua missão secreta, Bigelow decidiu contratar Harold Puthoff para ajudá-lo. Puthoff é um engenheiro elétrico cuja maior contribuição para a ciência foi deixar-se engabelar, de forma humilhante, por Uri Geller, nos anos 70. Com direito a artigo na Nature. De acordo com o Times, o programa fez o que programas assim sempre fazem -- coletou depoimentos, imagens e materiais estranhos não-especificados.

O mundo da ufologia sempre viveu muito próximo ao limite entre fraude e fantasia. Por exemplo, Kenneth Arnold, o autor da observação seminal de 1947  que deu origem à moderna onda de interesse em objetos voadores não-identificados, não relutou muito em tornar-se parceiro de Ray Palmer, da revista Fate, um editor inescrupuloso que nunca se preocupou em separar fato de ficção e que logo se pôs a sensacionalizar a história. Casos como Roswell e os círculos de plantação seguem padrões semelhantes.

Nada disso quer dizer que as pessoas não vejam coisas estranhas no céu. Mas pesquisas como a do Projeto Blue Book e várias outras que se seguiram mostram que apenas um resíduo mínimo de casos, de poucos pontos porcentuais, fica sem explicação após investigações competentes. Isso não significa que esses casos sejam inexplicáveis, apenas que não foi possível encontrar dados suficientes para dar conta deles. E nada justifica saltar para a conclusão de que são naves de outro planeta.

Como bem lembrou Neil DeGrasse Tyson em um de seus grandes vídeos que viralizaram na internet, o fato de um objeto ser "não identifiicado" quer dizer que não sabemos o que ele é, não que sabemos que ele veio da galáxia de Andrômeda.

Até por conta disso, muito da investigação contemporânea sobre esses fenômenos tem se debruçado sobre suas causas e condicionantes psicológicos, sociais e econômicos. Afinal, por que uma luz esquisita no céu é interpretada como uma nave alienígena e não como um anjo, um dragão ou um fenômeno meteorológico raro? Existem bons livros a respeito, como How UFOs Conquered the World: The History of a Modern Myth, ou o brasileiro A Invenção dos Discos Voadores.

Trabalhos como o conduzido pelo Programa de Identificação de Ameaças Aeroespaciais Avançadas encaixam-se no que os falantes da língua inglesa costumam chamar, de modo um tanto quanto pejorativo, de lunatic fringe, a "franja lunática", os extremistas com ideias malucas que vivem nas zonas limítrofes de campos de discurso ou investigação mais sérios.

Talvez um dos fenômenos mais interessantes (alarmantes?) do mundo contemporâneo é o estado de trânsito livre que existe entre os vários mainstreams e as diversas fringes: você pode ser do mainstream político (senador da República) e estar na fringe científica, ou vice-versa. Esses fluxos ajudam a reduzir preconceitos e estereótipos, mas também põem o orçamento público ao alcance de quem está disposto a gastar tudo o que puder para fazer a realidade concordar com suas fantasias.  -  (Fonte: Blog Carlos Orsi - aqui).

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