segunda-feira, 29 de junho de 2015

LAVA JATO, JUSTIÇA E JUSTIÇAMENTO

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há um afã muito grande de se chegar a um bom resultado na percepção criminal. E em dados momentos se percebe a flexibilização de uma máxima segundo a qual, em direito, o meio justifica o fim. Não posso simplesmente potencializar o que eu quero alcançar e atropelar normas existentes. Falo de normas que implicam para todos nós, cidadãos, segurança jurídica. Esta deve prevalecer, não pode ser atropelada.


Uma das queixas dos advogados de defesa dos envolvidos se refere à decretação das prisões preventivas. Acha que tem havido abuso?
A prisão preventiva deve existir como exceção, não como regra. E ela tornou-se – estou falando de forma geral, no universo jurídico – regra. Talvez para dar uma esperança vã, uma satisfação à sociedade.


Onde está o erro?
Tendo em conta a morosidade do processo crime, se prende para posteriormente apurar, quando se deveria primeiro apurar para, selada a culpa, prender para a execução da pena. Aí, é claro, já considerado o princípio que é muito caro a todos, que é o princípio da não culpabilidade. Afinal, alguém só pode ser considerado culpado depois que haja um título condenatório, não sujeito mais a modificação na fase de recurso. Eu fico preocupado quando há essa inversão de valores. Prendem-se pessoas que não apresentam periculosidade e pessoas que, de início, não estariam interferindo para embaralhar a investigação.

Muitos juristas questionam a forma como ocorrem os processos de delação premiada. Anteontem, um ministro do governo falou em “vazamento seletivo” das delações. O questionamento é procedente?
Me preocupa muito a questão da delação. Por norma, ela deve estar retratada num ato espontâneo. No processo atual, o número de delatores já revela algo estranho, pois parece que 15 já delataram. É muita delação… Não cabe, eu digo sempre, prender para, fragilizando o ser humano, ater-se à delação. Não se avança culturalmente dessa forma. Não cabe ter-se, como já afirmei antes em um artigo – mas atenção, aí não me refiro a um caso concreto – não cabe ter o justiçamento. Lembro-me de que, nesse artigo, citei Machado de Assis por uma frase muito interessante: ele diz que a melhor forma de se ver o chicote é tendo o cabo à mão. E o chicote muda de mão. Mas não posso deixar de cumprimentar a Polícia Federal, o Ministério Público e até mesmo, é claro – e aí temos recursos para corrigir algum extravasamento – até mesmo o juiz Sergio Moro.


“Corrigir extravasamentos” significa a possibilidade de se reformar algumas decisões do juiz em instância superior?
É mais ou menos isso. E ressalto que, às vezes, o órgão investido do ofício de julgar tem de adotar uma postura contrária aos anseios populares – até mesmo o povo está submetido às regras constitucionais legais. Esse órgão nem sempre marcha de forma majoritária, às vezes fica na minoria. Mas o dever precípuo é com o direito posto. Temos realmente a oportunidade de corrigir erros de procedimento, erros de julgamento via recursos e também habeas corpus. É necessário considerar o tempo para lograr uma correção de rumos.


Em seu entender, tem razão o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ao defender o direito de empresas hoje envolvidas na Lava Jato a participar de futuras licitações do governo, uma vez que elas ainda não sofreram nenhuma condenação?
Essa é uma decorrência natural do princípio da não culpabilidade. Precisamos conciliar o formal com a realidade. De nada adianta forçar a mão, afastando precocemente, de forma açodada, essas empresas dos contratos administrativos – e ter-se logo adiante a formação de outras empresas, até mesmo com capital das empresas anteriores. O que se precisa é concluir o julgamento. Em suma, o ministro Cardozo está sendo estritamente fiel ao figurino, que é um figurino constitucional. Ele não está querendo proteger esta ou aquela empresa. Está falando da preservação de princípios.


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(De Marco Aurélio Mello, ministro do STF, em entrevista a Sonia Racy, do Estadão; "Segurança jurídica deve prevalecer sobre o atropelamento das normas" - aqui.

A espetacularização processual apresenta uma peculiaridade: todo o empenho em mostrar serviço, forçando a realidade, 'estimulando' delações, condenando previamente, atrai, sim, os holofotes, mas cai por terra quando o bom senso se instala e a instância superior se manifesta.

É certo, porém, que certos frutos que já tenham sido colhidos subsistam, como a desmoralização de determinada agremiação política. Aliás, há quem considere que muitas vezes é exatamente esse o propósito inicial...).

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