No aniversário da Rádio Vermelho
Por Urariano Mota
Antes uma breve historinha, cuja graça única é ser verdadeira. Quando não havia web, no Brasil a gente falava para muito longe somente nos microfones da Rádio Jornal, em Pernambuco. Explico: em seu início, a Rádio Jornal era anunciada, nos intervalos, por um locutor de voz empostada e cavernosa: “Pernambuco Falando para o Mundo”. Mas a coisa não era assim mais um delírio de grandeza, folclórico, cômico, da província do Recife. Não. A Rádio Jornal, de fato, começou com transmissores potentes em ondas curtas e médias, que alcançavam todo o mundo. Na época, ela era a mais moderna estação de rádio do Brasil.
É claro, não escapamos da gozação de José Vasconcellos, um comediante na época de grande fama, que numa de suas piadas contava que o pernambucano era muito modesto. Tanto, que na rádio dizia que falava para o Muuuuundo.
Mas o ridículo era outro e Zé Vasconcellos não sabia. Ou seja, todos os equipamentos da Rádio Jornal foram importados da Inglaterra, fornecidos pela Marconi´s Wireless Telegraph Company e os transmissores eram operados por dois engenheiros, um da própria empresa e outro da BBC de Londres. Esses tiveram contrato assinado por três anos para o treinamento de pessoal no Brasil. Um documento da época dizia: "No sistema utilizado pela Rádio Jornal do Commercio, de Pernambuco, nenhuma interferência é possível, nem mesmo a dos relâmpagos, raios, centelhas de bondes que perturbam as emissões de broadcasting". Nem mesmo de raios.
Para provar que era séria, olhem só a maior piada que José Vasconcelos não conhecia: desde o primeiro dia de funcionamento, uma conhecida locutora canadense, a Dra. Janet Slater Swaton, falava com sotaque britânico o "Pernambuco speaking to the world", enquanto apresentava o programa "Brazil Calling", para um público a milhas de distância. O sucesso internacional era comprovado por centenas de cartas recebidas de outros países. Imagino que a doutora Janet era esperta e acionava o seu fã-clube.
Hoje, para nosso bem, falamos para o mundo de outra maneira. Pela internet, ou mais precisamente, se falamos em áudio, em som da fala livre no Brasil, aqui pela Rádio Vermelho. O que aumenta, e muito, a nossa responsabilidade.
Sempre considerei que o primeiro grande mandamento de uma intervenção no rádio, de qualquer programa no rádio, era tratar o ouvinte com respeito, o que vale dizer: ter a consciência de que além do microfone há pessoas inteligentes, há humanos, enfim, que dividem conosco aquele momento. O segundo mandamento, portanto, é perder toda e qualquer atitude professoral, porque o privilégio que usamos naquele instante é circunstancial, e mais experiência possui o público do que sonha nossa vã imaginação.
Ainda que fale para milhões de pessoas, o locutor se dirige a um só ouvinte. Como um João Gilberto da fala.
É claro que o locutor, naquele segundo terrível em que antes se acendia uma luz vermelha no estúdio, e agora, quando o estúdio lá em São Paulo avisa para o Recife “gravando”, é claro que esse último aviso nos deixa na condição dos condenados à cadeira elétrica no momento em que nos assentamos para cumprir a sentença e um carrasco anuncia, “no ar”, é claro que o locutor, se possível, se não tem qualquer prática de fala improvisada, como eu, deve ser ajudado por um texto. Então as palavras têm que ser as mais simples, de domínio público; se for imprescindível uma estranha ao léxico popular, que se esclareça de imediato o seu sentido.
As palavras podem e devem ser repetidas, sempre que o sentido de ritmo e de compreensão exigir, sempre que forem insubstituíveis no seu significado e na sua força.
E mais importante, o que me parece um autêntico salto de gato. Devemos ter uma ideia construída desde a primeira fala até o ponto final. Em um crescendo para um tempo breve.
É claro que o locutor, naquele segundo terrível em que antes se acendia uma luz vermelha no estúdio, e agora, quando o estúdio lá em São Paulo avisa para o Recife “gravando”, é claro que esse último aviso nos deixa na condição dos condenados à cadeira elétrica no momento em que nos assentamos para cumprir a sentença e um carrasco anuncia, “no ar”, é claro que o locutor, se possível, se não tem qualquer prática de fala improvisada, como eu, deve ser ajudado por um texto. Então as palavras têm que ser as mais simples, de domínio público; se for imprescindível uma estranha ao léxico popular, que se esclareça de imediato o seu sentido.
As palavras podem e devem ser repetidas, sempre que o sentido de ritmo e de compreensão exigir, sempre que forem insubstituíveis no seu significado e na sua força.
E mais importante, o que me parece um autêntico salto de gato. Devemos ter uma ideia construída desde a primeira fala até o ponto final. Em um crescendo para um tempo breve.
Comecei no rádio com um programa aos sábados, dirigido por Carminha Pereira, ilustre diretora da Rádio Capibaribe. Ali, junto a Rui Sarinho, Marco Albertime Mariana Arraes, fizemos depois o Viramundo. Um programa de notícias. Nele, certa vez Augusto Lucena, o prefeito do Recife, quando Mariana Arraes lhe perguntou em voz suave o que eu havia escrito antes: “o Doutor Augusto Lucena, quando foi a Lisboa, levou intérprete?”. O mais augusto burgomestre do Recife, explodiu e gritou “eu não sou imbecil”. Mas isso depois de quase 1 minuto da pergunta, como a considerar se havia mesmo ouvido o que ouvira.
Mas nada se compara à experiência que temos tido na Rádio Vermelho, em primeiro lugar pela liberdade de pensamento que desfrutamos. Em segundo, pelo público de militantes que a Rádio possui a partir das páginas do site do Vermelho. Em terceiro, pela repercussão em tuítes e Face. E por último, enfim, pela universalidade e abrangência de temas, que alcançam pessoas de esquerda e democratas de todos os partidos. Que fala enfim a toda pessoa de coração e decência que ambicione a liberdade e a crítica. (Fonte: aqui).
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