terça-feira, 12 de novembro de 2019

SOBRE O APOIO PÚBLICO DE PROCURADORA BRASILEIRA AO GOLPE NA BOLÍVIA

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"O ato dela pode e deve ser objeto de repúdio e de reprimenda pelo CNMP."  -  Assim reagiria o ácido, saudoso Paulo Francis diante de tal recomendação: "Pfffffff!...". Essa irregularidade praticada pela douta procuradora nem sequer fará coçar as barbas de quem quer que seja. Afinal, desprezar a CF/88 vem sendo coisa corriqueira, desimportante, e as decisões saneadoras tomadas pela Suprema Corte têm sido espezinhadas, como se está a ver. Aliás, nessa área comumente chamada 'Quintal da Metrópole', considerando o que se passa nos rincões bolivianos, ninguém dá a mínima para o que realmente está sob a mira dos 'patrões' e seus conglomerados econômicos, conforme, por exemplo, se revela Aqui. No mais, resta a impressão de que macroeconomia e geopolítica não merecem atenção daqueles que deveriam tê-las entre suas leituras, periódicas ou constantes.


Pronunciamento... procuradora declara guerra ao sistema constitucional brasileiro 

Por Fábio de Oliveira Ribeiro 

A procuradora Monique Cheker aplaudiu o golpe de estado que ocorreu na Bolívia. Ao que parece ela já apagou o Twitter. Mesmo assim não posso deixar de comentar o incidente, pois a procuradora parece ignorar quais podem ser os desdobramentos da interferência militar na vida cotidiana de um país. Narrarei aqui um episódio que me foi contado por colega de Faculdade.
Meu amigo havia visitado Machu Picchu no Peru e estava regressando ao Brasil. Ele se encontrava na Bolívia quando ocorreu o golpe de estado de 1980. Os militares fecharam as fronteiras daquele país. Em razão disso ele ficou preso na cidade de La Paz. As Embaixadas estrangeiras passaram a ser intensamente vigiadas por policiais e soldados para impedir a fuga dos adversários do novo regime. Assim, ele foi impedido de pedir ajuda na Embaixada do Brasil.
Quando o dinheiro acabou, ele ficou salivando folha de coca e perambulando faminto pelas ruas de La Paz durante vários dias. Ele já estava começando a acreditar que morreria de fome na Bolívia quando uma empregada da Embaixada da Inglaterra o recolheu das ruas e o abrigou na casa dela. Usando canais diplomáticos a moça conseguiu entrar em contato com a família dele. Após receber a quantia que lhe foi enviada ele retornou ao Brasil quando as fronteiras foram abertas.
O golpe de estado em curso na Bolívia resultará em violência sistemática contra os índios que elegeram Evo Morales. A reação deles legitimará o aumento da repressão estatal. Os turistas brasileiros sofrerão as consequências deletérias do conflito. Com ou sem guerra civil a economia boliviana ficará em frangalhos produzindo ondas de refugiados. Os países vizinhos serão inevitavelmente afetados. As empresas brasileiras que exportavam produtos para aquele país amargarão prejuízos.
Mas nada disso parece importar a procuradora do MPF. Ela comemora a desgraça alheia sem imaginar as consequências do golpe de estado. Pior, Monique Cheker nem mesmo se deu ao trabalho de respeitar a legislação brasileira.
O art. 4º, II, da CF/88 tem a seguinte redação:
“Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
II – prevalência dos direitos humanos;”
O art. 21, item 3, da Declaração Universal dos Direitos do Homem prescreve que:
“3. A vontade do povo será a base da autoridade do governo; esta vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto.”
Numa democracia o poder sempre tem origem na vontade popular. Quando o voto é ignorado não há alternância de poder e sim a transformação da essência do regime constitucional. Ele deixa de ser democrático e se torna tirânico (baseado na força bruta) ou oligárquico (oriundo da riqueza).
Evo Morales ganhou a eleição. O mandato dele deveria ser respeitado pelo exército boliviano e não foi. O tirano que assumiu o poder na Bolívia tinha sido rejeitado pela maioria dos eleitores daquele país. Esse detalhe essencial deve ser levado em consideração pelas autoridades brasileiras. Somente assim elas demonstrariam respeito ao nosso próprio sistema constitucional. Não foi o que ocorreu.
Ao manifestar apoio ao golpe de estado na Bolívia a procuradora do MPF está sabotando a democracia brasileira. Ela também demonstrou que ignora ou despreza o texto da CF/88. Impossível dizer como essa mocinha passou num concurso de provas e títulos. O ato dela pode e deve ser objeto de repúdio e de reprimenda pelo CNMP.
Jair Bolsonaro e seu Chanceler também comemoraram a destruição da democracia boliviana. A conduta deles também é ilegal e repugnante. Mas quem vai colher os efeitos negativos dela são os empresários brasileiros. Quanto mais o Brasil se isolar ao lado de regimes tirânicos menores serão as possibilidades do nosso país exportar minérios e alimentos para os países que valorizam o respeito à democracia. Além disso, ninguém ficará surpreso ou triste se o presidente brasileiro acabar se tornando vítima da violência política que aplaude e instiga nos países vizinhos.  -  (Aqui).

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