.
Juntando as peças do dia 14.03.2018 na vida de Bolsonaro
Por Luis Nassif
Em jornalismo, usamos uma técnica para coberturas complexas. Consiste em juntar todos os elementos concretos e, assim que possível, montar uma narrativa plausível que os encaixe.
Para ouvir a versão nas palavras do próprio analista, clique Aqui.
Este Blog opta por cientificar-se do assunto, enquanto aguarda o desfecho do processo.
Juntando as peças do dia 14.03.2018 na vida de Bolsonaro
Por Luis Nassif
Em jornalismo, usamos uma técnica para coberturas complexas. Consiste em juntar todos os elementos concretos e, assim que possível, montar uma narrativa plausível que os encaixe.
A partir daí, a cobertura vai filtrando as informações, para focar naquelas essenciais para comprovação ou correção da narrativa em curso.
A teoria do fato de Bolsonaro
Entendido isso, vamos a uma teoria do fato sobre como foi o dia 14 de março de 2018, dia do assassinato de Marielle, na vida de Jair Bolsonaro.
Primeiro, vamos aos fatos objetivos:
- Um twitter de uma jornalista respeitável, Thais Bilenky, no dia 14 de março, informando que Bolsonaro seguiria para o Rio por estar com problemas de intoxicação.
- O depoimento do porteiro do Condomínio Vivendas da Barra, dizendo (que) ligou para Bolsonaro para obter autorização para a entrada de Elcio Queiroz no condomínio. E a anotação no papel indicando a casa de Bolsonaro como destino.
- A sessão da Câmara mostrando que, naquele dia, Bolsonaro estava lá, participando das sessões.
- O sistema de telefonia do condomínio, que permite transferir ligações para celulares.
- Posteriormente, vazamentos aos Bolsonaro de trechos da investigação de interesse deles, mais a identificação de dois promotores como bolsonaristas ativos, mostrando acesso da família às investigações.
Teoria do fato
Em cima desses dados, vamos formular uma hipótese – repito, hipótese – sobre o que teria ocorrido naquele dia.
- Bolsonaro articulou uma reunião com Ronnie Lessa (do Escritório de Crime) e Elcio Queiroz para o dia 14, no Condomínio Vivendas da Barra.
- Preparou um álibi para faltar à sessão daquele dia na Câmara Federal. A jornalista Thais Belinski foi informada de que ele iria voltar para o Rio de Janeiro por um problema de intoxicação alimentar. Era um álibi curioso: viajar intoxicado, podendo descansar e ser tratado em Brasilia.
- Naquele dia, trocando ideias com assessores, Bolsonaro se deu conta de que a ida para o Rio de Janeiro poderia expô-lo. Assim, decidiu ficar na sessão da Câmara, onde apareceu sem nenhum sinal de quem estava intoxicado. A reunião no Condomínio foi mantida com os demais participantes.
- Ao chegar ao condomínio, Élcio deu o número da casa de Bolsonaro. O porteiro ligou para o celular anexado ao número, Bolsonaro atendeu em Brasília e autorizou a entrada. E Élcio rumou para a casa de Ronnie Lessa, que fica na mesma rua da casa de Bolsonaro, cerca de duas ou três casas depois.
- Quando a reunião foi identificada, após perícia no celular de Ronnie Lessa, os Bolsonaro foram informados por aliados infiltrados nas investigações, que atrasaram a perícia a fim de permitir que as provas fossem alteradas.
Repito: é uma hipótese de trabalho.
Motivação
Conforme já divulgado, Bolsonaro era radicalmente contrário à intervenção militar no Rio de Janeiro, que considerava uma maneira de fortalecer o governo Temer e preparar a chapa Temer-Rodrigo Maia para as eleições de 2018, reduzindo a possibilidade de uma intervenção militar ampla.
Um dos modos de operação dos porões, quando Silvio Frota foi alijado da disputa pelo poder, era planejar atentados e imputar à oposição.
Apurou-se que, dias antes do assassinato de Marielle, Ronnie Lessa pesquisou no Google figuras críticas à intervenção militar. E fixou-se no nome de Marielle, que havia sido indicada para uma comissão na Câmara de Vereadores, para fiscalizar a intervenção.
As investigações
Desde o início, se afirmava que as investigações esbarravam em “gente poderosa” no Rio, por isso não avançavam. Até agora, oficialmente a “gente poderosa” que apareceu foi um conselheiro do Tribunal de Contas do Município, o tal Brazão. Isso em um estado em que ex-governadores, conselheiros do Tribunal de Contas do Estado, deputados federais e estaduais foram presos. É factível supor que toda a manipulação da Polícia Civil e, especialmente, do Ministério Público Estadual foi por influência de Brazão. A cada dia fica mais nítida a influência do bolsonarismo sobre promotores estaduais.
A elucidação do crime demandaria perícias e investigações isentas. Quem as fará? A cada dia que passa aparecem mais promotores bolsonaristas militantes em funções chave na investigação interminável.
Há duas maneiras dos promotores atuarem politicamente.
- Encontrando um suspeito concreto, que assuma o crime e libere Bolsonaro das suspeitas.
- Não encontrando, adiando a investigação indefinidamente.
Qual seria a alternativa? A Polícia Federal de Sérgio Moro.
O porteiro está sendo acusado de obstrução de justiça. Sérgio Moro encaminhou a denúncia à Procuradoria Geral da República. O caso caiu nas mãos do procurador Douglas Araújo, tido como “bolsonarista ferrenho”, segundo o Valor Econômico.
Insisto, é uma teoria do fato, uma narrativa que permite encaixar os principais elementos até agora divulgados. Quem tiver uma hipótese melhor, que as apresente, antes que calem-se para sempre as testemunhas. - (Aqui).
Nenhum comentário:
Postar um comentário