Supremo elimina presunção de inocência em decisão que vale para todo o País
Do Site Justificando
Em julgamento realizado (ontem), 5, o Supremo Tribunal Federal confirmou o pressentimento da comunidade jurídica e manteve o entendimento de fevereiro deste ano, quando a Corte eliminou a presunção de inocência e permitiu cumprimento da pena a partir de decisões da segunda instância. Diferentemente da primeira decisão, que foi proferida em um caso singular, desta vez na Ação Declaratória de Constitucionalidade 43 proposta pelo Partido Ecológico Nacional, a decisão tem efeito geral.
O julgamento havia começado no primeiro dia de setembro, com sustentações orais de entidades de classe e organizações de direitos humanos, as quais fundamentaram que a Constituição era clara em desautorizar a decisão da Corte, além do que o julgado contribuía para a confusão de entendimento nos tribunais e no hiper encarceramento. Naquela ocasião, o relator do caso, ministro Marco Aurélio, já havia acolhido os argumentos e decidido pela execução da pena apenas após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Entretanto, a esperada posição da maioria da Corte prevaleceu no dia de (ontem), em divergência puxada pelo ministro Edson Fachin, o qual entendeu que o artigo do Código de Processo Penal e o entendimento do Supremo, apesar de claramente opostos, não eram incompatíveis.
Outros ministros seguiram a divergência por argumentos práticos, e não constitucionais, como o caso do ministro Barroso, que criticou a estratégia de advogados para protelar a prisão –“É mais puxado para o ridículo do que para o ruim”. Já Gilmar Mendes ironizou a preocupação de advogados com a presunção de inocência, “a resposta, nem precisa dizer, é Lava Jato”. Para ele, os presídios vão melhorar, já que vão receber “visitas ilustres” de Curitiba.
Já o ministro Luiz Fux chegou a afirmar que existe “um direito fundamental da sociedade em ver a aplicação da lei penal” e, por isso, seria necessário interpretar contra a literalidade da Constituição.
O julgamento quase surpreendeu pela virada de voto de Dias Toffoli, que mudou o entendimento adotado em fevereiro, mas, com a confirmação dos demais, o placar final terminou em 6 x 5, pela eliminação da presunção de inocência prevista na Constituição e no Código de Processo Penal.
Apesar do entendimento do
Supremo, a Constituição prevê no Art. 5º LVII que “ninguém será
considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória”.
A grande maioria dos órgãos de direitos humanos é contra tal decisão. Para o promotor de justiça do Ministério Público de Goiás, Haroldo Caetano, “trocando em miúdos, o Tribunal que outrora foi o guardião da Constituição, fará valer aquela máxima policial: ‘é inocente mas vai preso assim mesmo’.“
Já Elmir Duclerc, promotor de justiça e professor na UFBA, demonstrou sua indignação – “A qualidade técnica de alguns votos dos Srs. Ministros sobre a presunção de inocência é simplesmente pavorosa. Lembrou-me a ‘Escolinha do Professor Raimundo’, com o perdão dos humoristas. Se tivessem juízo não deixavam transmitir esse vexame“, escreveu.
O Justificando, em fevereiro, gravou um vídeo sobre o tema, externando sua posição:
(Para ver o vídeo - e ler comentários suscitados -, clique AQUI ou AQUI).
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Muitos exultaram em face da decisão, por 6 X 5, da Alta Corte. O juiz Moro, entre outras particularidades, destacou o fato de que, com a medida, resulta demonstrada a tese de que "no Brasil não existem castas". Concordamos plenamente (vide nota, abaixo): suspeitos poderosos se valem da presunção de inocência para, mediante a interposição de infinitos recursos, procrastinar o alcance do trânsito em julgado das decisões condenatórias. O que nos permitimos ponderar é o seguinte: Por que, afinal, não agir como procedeu o ministro César Peluso em 2011, ao apresentar a seus pares no STF proposta (que seria encaminhada ao Congresso) visando a eliminar boa parte do acervo de recursos judiciais, o que, na prática, por abreviar significativamente o trâmite judicial, surtiria em muitos casos o mesmo efeito da decisão de ontem - com a particularidade de que a proposta em questão resultaria de PEC Proposta de Emenda Constitucional?!
(Note-se que o presidente da Câmara, como a Globo mostrou, 'vibrou' em vista da decisão da Suprema Corte...).
Nesta data, comemora-se o centenário do nascimento de Ulysses Guimarães, o 'Senhor Constituição', que, em 5 de outubro de 1988, afirmou:
"Não é a Constituição perfeita, mas será útil, pioneira, desbravadora. Será luz, ainda que de lamparina, na noite dos desgraçados."
Permitimo-nos indagar: Como reagiria Ulysses Guimarães diante da forma flagrantemente inconstitucional como a Carta Magna foi, na prática, alterada por seu 'Guardião'?!
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Nota: Relativamente à existência, ou não, de castas, cumpre observar: os endinheirados podem comportar-se como casta, uma vez que detêm condições de bancar custos diversos em todos os âmbitos. Já os pobres, contam, na esfera jurídica, com a assistência de defensores públicos; mas, regra geral, o atendimento é precário, e há unidades da federação que nem sequer contam com defensoria pública. De onde se conclui que o Brasil tem ao menos duas castas: ricos e pobres. Isso é o óbvio do óbvio, mas, como dizia um velho amigo, precisa ser tido.
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