Caminhos cruzados da política e da economia
Por André Araújo
Nas grandes crises do Brasil moderno, de 1930 até hoje, a economia dava as cartas para a política e vice-versa, de modo que não é possível interpretar a economia sem analisar a política.
Em 1930 foi a crise provocada pela queda da Bolsa de Novar York que derrubou os preços do café e junto com o café foi derrubado o poderoso Presidente Washington Luis, tão poderoso que quebrou o Pacto Café com Leite e impôs seu sucessor Julio Prestes de Albuquerque.
A primeira crise cambial dos anos 40, ao fim do Governo Dutra, interrompeu um clima de boa vida que secou com o fim dos dólares acumulados durante a Segunda Guerra.
De 1946 a 1949 foi uma festa de Hollywood. Meu pai vivia da importação de caminhões da marca International, nunca a família esteve tão bem, com férias nos EUA naqueles tempos de avião a pistão.
Subitamente acabaram as licenças de importação, o negócio desabou, o dinheiro acabou, abriu-se o caminho para o retorno triunfal de Getúlio Vargas, que saiu pela direita em 1945 e se reinventou pela esquerda nacionalista em 1950.
Como não havia mais dólares era preciso criar a Petrobras, a Eletrobras e o BNDES dentro de um discurso nacional-desenvolvimentista . Era a economia embalando a política como sempre.
Com Juscelino assumindo a Presidência, em 1955, em uma eleição contestada, sua única saída era o crescimento econômico a qualquer preço, o que foi feito com as encomendas de papel moeda à Thomas de la Rue & Co.Ltd. de Londres e à American Bank Note Co. de Philadelphia.
O Brasil era o maior cliente mundial das impressoras de papel moeda; trabalhavam 24 horas por dia imprimindo dinheiro para o Brasil, com o que Juscelino Kubitschek fez Brasilia e as 30 metas de desenvolvimento, inclusive a indústria automobilística, a petroquímica, a naval, o incremento da agricultura, as indústrias de televisores, geladeiras, aspiradores e liquidificadores, as novas grandes fábricas de cimento para a construção de Brasília, as primeiras grandes hidroelétricas federais, muitas rodovias, refinarias de petróleo, oleodutos.
Jango caiu por uma grande crise econômica. O primeiro PIB negativo em muitos anos, era a economia dando o lastro para a derrubada do Presidente, poucos falam que 1963 e 1964 foram anos péssimos para a economia, o que fez a cama para Jango cair não foram só os tanques. (Nota deste blog: ou Lincoln Gordon...).
O Governo militar teve uma década e meia de bom desempenho econômico, com o que o apoio do povo e das elites era enorme. Os governos Médici e Geisel eram populares e só a esquerda radical lutava contra, a massa e os empresários estavam satisfeitos, havia emprego, lucros, fábricas novas, os loteamentos a prestação e as construções de casas em mutirão com o que se criaram 600 bairros novos em São Paulo e se ergueram os grandes sistemas de abastecimento de água de São Paulo e Rio bem como seus metrôs.
O descarrilhamento da economia ao fim do ciclo militar foi a pedra de toque da redemocratização, o regime já não mais garantia a prosperidade, veio a Nova República com quadros medíocres que aprofundaram a crise, arrastada pelo provincianismo do governo Sarney, que abriu caminho para Fernando Collor.
A economia foi a maestra do tempo político.
No ciclo Itamar-FHC a mesma economia governou a política, gerou o Real, a reeleição e uma certa organização sem muita prosperidade, com um desenvolvimento medíocre, apesar da moeda estável; foi o tempo da "modernização", e não do desenvolvimento integrado.
O ciclo PT-Lula foi brilhante no primeiro mandato, sofrível no segundo e tenebroso nos governos Dilma, gerando o impeachment pela economia. Se houvesse crescimento, Dilma passava batido em seus gigantescos defeitos. (Nota deste blog: Além dos reflexos negativos da crise global, com o declínio brutal do preço e do volume comercializado de commodities, é preciso levar em conta o boicote parlamentar às iniciativas econômicas do governo Dilma).
Um dos segredos do primeiro Governo Lula foi o apoio majestoso do Governo George W. Bush, que tinha profunda admiração por Lula a ponto de convidá-lo para um fim de semana em sua casa de campo, 'como um peão desses chegou à Presidência de um grande País?', Bush não se cansava de admirar, 'esse cara é extraordinário', dizia.
Agora entra o Governo de transição com um receituário totalmente equivocado. Meirelles não tem envergadura, liderança, carisma para puxar a economia para fora da recessão, a escolha de um ultra-ortodoxo como Ilan Goldfajn no Banco Central é o arremate de chumbo; essa receita não leva a lugar nenhum porque parte de um erro profundo de diagnóstico.
Para a dupla dos carecas a inflação é o maior problema - o que está furado, o problema macro é a recessão, a inflação é acessório, mas o pior é colocar a política econômica no trilho do mercado financeiro, que jamais vai gerar empregos nem para um por cento dos desempregados.
A lógica do mercado financeiro é desgarrada da lógica da política econômica como parte da política geral e social, de nada adiante subir o rating e a inflação cair com as ruas tomadas por miseráveis. Nesse quadro político-perigoso NÃO VIRÃO OS INVESTIMENTOS, o País jamais sairá da recessão caminhando para uma senhora depressão.
A grande ilusão que foi vendida ao governo pelo PSDB-DEM é que agradando o mercado tudo volta a florir. Não vai acontecer. Não há tempo para as reformas nesse governo, é preciso esperar o novo eleito em 2018.
A única coisa que esse Governo pode fazer e estimular rapidamente a economia com grandes investimentos públicos que geram empregos imediatos, injetando dinheiro novo para criar demanda sadia. É um remédio na veia para resolver uma crise aguda que é a sobrevivência de 12 milhões de desocupados e suas famílias - coloca 4 pessoas por família, são 50 milhões de infelizes sem meios de sobrevivência, revoluções sangrentas começaram por muito menos gente sem meios de sobrevivência.
A economia está com capacidade ociosa de 40%, injetar um trilhão de Reais em dois anos nem faz coceira na inflação, se der alguma coisa é perfeitamente suportável.
O Brasil dos anos dourados de JK conviveu com inflação média no período de 36%. Hoje essa expansão monetária poderia acrescentar quase nada, uns 2 a 3% acima dos atuais 7%, 10% ao ano. Isso é o que a Índia aceitou para não parar de crescer nos últimos anos, um crescimento quase chinês, de 5 a 6% ao ano.
Ninguém desprezou a Índia por causa disso, ao contrario, é o país com rating melhor que o nosso, admirado e cortejado pelos bancos e fundos, exportador de capital, controla boa parte da siderurgia mundial e convive sem maiores problemas com inflação alta.
É impressionante a timidez dos governos dos últimos 10 anos, ninguém tem ousadia! Importaram essa porcaria chamada "meta de inflação", que encarroça nosso crescimento. Todos têm medo do Boletim FOCUS.
Em uma pesquisa em português, de piada, perguntaram aos bancos quanto eles querem de juros e aí o BC segue o "quiz" do Chacrinha: "Vocês querem quanto de juros? Então tomem, nós vamos dar!"
Ai dão a SELIC que eles querem. Não tem coisa mais estúpida no planeta. Agora a ata do Copom diz que os juros só vão cair quando se fizer o ajuste fiscal, então não vão cair nem em 10 anos, é humor negro da Casa Mal Assombrada.
É absurdo emitir R$ 1 trilhão de Reais em dois anos? Que coisa! Ninguém acha absurdo o Tesouro do Brasil pagar R$1 trilhão de juros em dois anos, o mesmo valor para nada. Imprimir dinheiro é a solução, está ai a nossa Casa da Moeda que pode trabalhar 24 horas, um pouco de inflação alivia a vida dos devedores, o maior dos quais é o Tesouro, estimula toda a economia, especialmente os pequenos negócios e faz diminuir a dívida pública, a dívida das famílias e das empresas.
Maior bizarrice é não ter inflação mas ter juros de País com hiperinflação, os bancos cobram 500% no cartão de crédito e quando a inflação baixou um pouco OS JUROS NÃO CAÍRAM.
A emissão de DÍVIDA PUBLICA é a mesma coisa que a emissão de moeda porque cria quase-moeda, que é meio circulante COM JUROS. Coisa completamente idiota, pois não emitimos moeda mas emitimos títulos públicos remunerados que também significam liquidez, MAS estéril, que não serve para nada, a não ser sustentar rentistas em Miami. (Nota deste blog: Há rentistas também no Brasil. E muitos).
É a economia que rege a política, esse governo não tem chance com essa política econômica. As reformas são necessárias, mas a base política para elas serem aprovadas está numa economia em crescimento e nunca em um ambiente de recessão sem futuro.
(Fonte: Jornal GGN - aqui).
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