sábado, 26 de setembro de 2015

A LAVA JATO E O FATIAMENTO DAS TAREFAS DA FORÇA

"A nova inflexão do Supremo Tribunal Federal no tratamento formal dos processos da operação Lava Jato indica uma mudança de rumo importante. A "Força Tarefa", estrutura que deveria ser um grupo do Ministério Público Federal,  passou a ser vista pelo grande público como o conjunto todo - MPF,  Polícia e Juízo -, o que é incompatível com a separação de poderes do Estado de Direito. Essa “força” agiu pelo sistema de "fases", com o máximo de exposição midiática possível e completo desprezo pelas repercussões econômicas decorrentes de abalos em grandes empresas e demolição de setores inteiros, como estaleiros; a população aplaudiu sem maiores restrições e o STF manteve-se frio e deu "corda" total aos operadores a serviço de uma causa, fazendo de conta não ver que no ordenamento brasileiro, onde não há juiz de instrução, como na Itália, o juiz não pode ser paladino de causas porque sua função é julgar apenas e não combater o crime.
Quais as razões objetivas que fluem da mudança de rota do STF? Cada um pode ter sua interpretação. A minha, baseada no clima político e econômico, na dinâmica de nossa longa história de crises entre poderes, é a seguinte:
Enquanto a "Força Tarefa" argumenta que a experiência acumulada e o conhecimento das questões interligadas significa - com evidente coerência e racionalidade porque essa alegação é um fato da realidade observável - maior eficiência na condução dos processos, o STF entende que outro valor, mais alto do que eficiência, se apresenta: a construção de um poder excessivo e crescente, enfeixado por um pequeno grupo de operadores, desbalanceando a própria máquina do Judiciário por centralizar numa só comarca o julgamento de casos que tem raízes em outros Estados que não o Paraná: praticamente nenhum investigado mora no Paraná e nem os fatos lá foram praticados.
Nesse contexto, um caso como o da Eletronuclear não tem nenhum elo com o Paraná a não ser o doleiro, o que não justifica a vinculação do caso com uma Vara de Curitiba, onde não mora nenhum dos potenciais indiciados, nem a empresa, nem os supostos corruptores, nem a firma que recebeu a suposta corrupção. Não haveria então uma razão lógica para o caso ir parar em Curitiba, não há nenhuma vinculação com o local do Juízo.
A tese da "eficiência" da concentração de casos tão díspares numa só Vara de Curitiba não tem amparo no sistema judiciário brasileiro e decorre de uma narrativa de conexões que foi criada na base de opiniões, como a de que todos os casos se ligam pela Casa Civil. Trata-se de uma hipótese que não cabe dentro dos processos e sim no mundo das suposições lastreadas numa visão política equivalente por semelhança à teoria do "domínio do fato".
Além disso aparece o problema do estrelismo, dos vazamentos continuados; o Juiz Moro deu ontem uma palestra no chamado LIDE, uma "soi disant" associação de empresários que é, na realidade, um negócio de eventos de João Dória Junior, empresário ligadíssimo ao PSDB, a ponto de ser pré-candidato do partido a Prefeito de São Paulo, cenário que o Juiz deveria ter evitado pela evidente conotação partidária desse ambiente e do evento criado pelo homem do PSDB.
O STF está rearranjando com cuidado o tabuleiro dessa operação, depois de ter adotado uma postura de absoluta não intervenção nas "operações" de Curitiba, onde há episódios altamente contraditórios no campo das garantias individuais, vazamentos, prisões preventivas de legalidade discutível, delações depois de longas prisões.
Há também, em nível mais alto do que o jurídico,  a QUESTÃO DO PODER. Um grupo que pode prender sem contestação em qualquer ponto do País qualquer pessoa, mesmo as mais poderosas, passa a ter um Poder contrastante com todos os demais, o que a partir de certo ponto significa contestação aos demais poderes do País. Para complicar, o Tribunal que é a 2ª Instância da Justiça Federal de Curitiba é o 4º TRF de Porto Alegre, com merecida fama de dureza, onde nenhum habeas corpus relativo à Lava Jato teve resultado, fechando a blindagem da operação, que aparenta estar incomodando outros polos dentro da própria Justiça Federal, onde o topo da pirâmide é o STF.
A registrar a postura da "força tarefa" da GLOBONEWS, (com) Lo Prete, Merval, Camarotti, todos criticando o STF por agir como agiu, o mesmo STF que pela mesmíssima turma foi incensado quando julgou o Mensalão com suas sentenças de 40 anos de prisão.  Os argumentos de Merval pró-Curitiba baseiam-se exclusivamente na questão da EFICÁCIA, dos mais de 300 especialistas trabalhando nos processos (será tudo isso?), sem lembrar que um Sistema Jurídico não se avalia apenas pela eficácia, existem outros parâmetros muito importantes e de natureza mais elevada e finalística que qualificam uma Justiça. E não é só a eficácia; um deles é a justiça, outro é o equilíbrio, outro são as garantias constitucionais, e foi certamente usando mais parâmetros além da eficácia o que formou a decisão do STF.
Parece que agora haverá um movimento de jogar a opinião pública contra o Supremo, algo muito perigoso porque vai turvar ainda mais a crise política que já está de bom tamanho e está pondo em risco todas as Instituições."



(De André Araújo, no Jornal GGN, port intitulado "Os limites do Paraná" - aqui.
É, parece que desta vez as coisas não saíram conforme o figurino, como ocorreu na AP 470, em que o STF concentrou todos os envolvidos, independentemente de quaisquer particularidades constitucionais, como o direito ao duplo grau de jurisdição. A Suprema Corte, embora com atraso, agiu segundo determina a boa técnica jurídica. Aos intocáveis e seus parceiros, porém, resta um consolo: o principal, primordial e absoluto objetivo foi alcançado.
Quanto ao juiz, procuradores, agentes e inúmeros simpatizantes, impõe-se que, com a indispensável submissão ao STF, cumpram diligentemente as ordens dele emanadas... se bem que muitos, como o jornalista Paulo Henrique Amorim, alimentam dúvidas:

1. "Meninos da Lava Jato vão ignorar decisão do STF?" - aqui -, e

2. "Gilmar já decidiu: ele não fatia e acabou!" - aqui).

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