sexta-feira, 7 de março de 2014
AP 470 E REVISÃO CRIMINAL
AP 470 e revisão criminal
Por Pedro Maciel
Marco Aurélio de Mello, um dos nossos ministros midiáticos, vê como pequena a possibilidade de ainda haver mudança na decisão da Corte sobre a Ação Penal 470. Foi o que ele teria dito demonstrou, quando questionado sobre a "revisão criminal" pelo portal UOL.
Apesar da reprovável manifestação do ministro sobre processo em curso temos que a revisão é possível sim, pois o legislador listou, no artigo 621 do Código de Processo Penal, os casos em que é possível recorrer ao intento revisional. Vejamos então:
"Art. 621 - A revisão dos processos findos será admitida: I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos; II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.".
Não conheço a AP 470 à profundidade, mas creio que apesar da intenção inicial do legislador fosse a de prover um rol taxativo para as hipóteses de cabimento da revisional, há espaço para uma significativa revisão.
Por quê?
Porque o Ministro Joaquim Barbosa teria omitido provas de seu relatório, fato que pode ter levado o colegiado a erro.
Quais provas?
Antes falemos, em caráter introdutório, do conhecido e comentado "Caso Dreyfus", que diz respeito a um erro no julgamento que levou à condenação do Capitão Dreyfus, oficial do Exército Francês. Sua condenação foi contestada um ano depois do julgamento quando um oficial da área de informações resolveu fazer um novo exame das provas e descobriu que nada havia para incriminar aquele jovem capitão do Exército francês. Estava claro que o verdadeiro espião que todos procuravam era outra pessoa.
Mas isso não adiantou muito. Para evitar uma revisão, começaram a surgir novas provas – fraudadas – para incriminá-lo, o que atrasou o processo por mais tempo. Condenado em 1895, Dreyfus seria liberado, por graça presidencial, pois os tribunais jamais declararam sua inocência, em setembro de 1899. Um ano antes, o oficial que havia forjado documentos para proteger os superiores foi desmascarado e cometeu suicídio.
Podemos estar às portas de conhecermos um "caso Dreyfus" aqui no Brasil, pois a pedido do réu Henrique Pizzolatto e com base na Súmula Vinculante 14 do STF (a qual autoriza dar-se aos acusados acesso aos autos para que se defendam amplamente) o Ministro Ricardo Lewandowski, no exercício da Presidência do Supremo, mantendo o caráter de "segredo de Justiça", deu acesso a oito réus ao Inquérito 2474, desdobramento do Inquérito 2245, que se tornou a Ação 470, apelidada de mensalão. Isso acontece somente agora, quase sete anos após segredo ter sido decretado por Joaquim Barbosa. O Supremo Tribunal Federal liberou para consulta o Inquérito 2474 da Polícia Federal.
Não é demais lembrar que as apurações deste inquérito foram solenemente ignoradas durante o julgamento do "mensalão" e sequer constaram do relatório de Joaquim Barbosa; estaria o conteúdo desse inquérito a trazer as hipóteses dos incisos I e III do artigo 621 do CPP?
Penso que sim. Por quê?
Em razão da relevância do conteúdo e conclusões do tal inquérito.
Dizem que o Inquérito 2474 foi uma investigação complementar, feita a pedido do Ministério Público, para mapear as fontes de financiamento do "valerioduto" na época das denúncias sobre o chamado "mensalão". E suas conclusões foram de que (a) o esquema envolvia o financiamento ilegal de campanha e lobbies privados; (b) começou em 1999, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso; (c) terminou em 2005, na administração Lula, após ser denunciado pelo deputado Roberto Jefferson.
Essas e outras informações teriam sido omitidas e sonegadas pelo Ministro Relator da AP 470. Penso que os Ministros do STF e a opinião pública tinham direito às informações do IP 2474 antes do julgamento. Por que Joaquim Barbosa as omitiu? Essa omissão caracteriza crime de responsabilidade do Ministro? Ou uma espécie de fraude processual?
Bem, o fato é que no inquérito o delegado teria indicado que (i) nunca houve 'mensalão' (o pagamento mensal a parlamentares), mas sim uma (ii) estratégia criminosa de formação de caixa 2 que começou com FHC e avançou ao governo Lula, mas que (iii) não envolveu dinheiro público (mas o alcançaria de forma voraz caso não tivesse sido interrompida pela eclosão do escândalo).
E pasmem: o relatório, assinado pelo delegado Luís Flávio Zampronha, foi encaminhado à Justiça em meados de 2007 e ignorado pelo relator ministro Joaquim Barbosa... Por quê? Que interesses o ministro defende realmente? O inquérito estava sob segredo de Justiça por determinação do hoje presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa.
O inquérito apontaria ainda a participação do banqueiro Daniel Dantas no esquema. "Pelos elementos de prova reunidos no presente inquérito, constata-se que Marcos Valério atuava como interlocutor do Grupo Opportunity junto a representantes do Partido dos Trabalhadores, sendo possível concluir que os contratos (de publicidade) realmente foram firmados a título de remuneração pela intermediação de interesse junto a instâncias governamentais".
Repita-se: as apurações deste inquérito foram solenemente ignoradas durante o julgamento do "mensalão" pelo seu relator. Por quê?
O Supremo tem a oportunidade de pôr a limpo estes esquemas e de revelar por completo a influência de Dantas nos governos FHC e Lula, na mídia e no Judiciário, desde que tenha uma atuação acima dos interesses partidários e seja menos midiático, para o bem do País. O relatório do delegado Zampronha é um bom começo para reencontrar-se com a verdade e com a Justiça.
Teria o Ministro Joaquim Barbosa sido autor de um caso de fraude jurídica histórica? A interesse de quem? Estamos diante de um "caso Dreyfus"? O tempo e a História revelam todas as fraudes (ou talvez a revisão criminal). (Fonte: aqui).
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Pedro Maciel é advogado, sócio da Maciel Neto Advocacia, e autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, Ed. Komedi, 2007.
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