sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

FMI: MUDANÇAS EM PERSPECTIVA (OU NÃO)

J Bosco.

Crítica à desigualdade social ganha espaço no FMI

Por Sérgio Lamucci

A preocupação com a desigualdade, tema que não era prioridade, começou a ganhar espaço na agenda do Fundo Monetário Internacional (FMI). Em discursos recentes, a diretora-gerente do Fundo, Christine Lagarde, tem alertado para a ameaça à estabilidade econômica e social representada por uma distribuição de renda muito desigual. Na terça-feira, por exemplo, disse que há "evidências firmes" de que essa questão pode afetar o ritmo e a sustentabilidade do crescimento, baseadas em parte em pesquisas do próprio FMI.

Ontem, o FMI divulgou um estudo apontando que um menor nível de desigualdade tende a levar a um crescimento mais rápido e duradouro. Além disso, políticas de redistribuição de renda, envolvendo taxação e transferências, parecem em geral ter um impacto positivo sobre a expansão da economia. Apenas casos extremos teriam efeitos negativos. "Os efeitos diretos e indiretos da redistribuição - incluindo o impacto resultante da menor desigualdade - são em média pró- crescimento", afirma o estudo, que analisa uma ampla base de dados de países desenvolvidos e em desenvolvimento, distinguindo a desigualdade de renda antes e depois da incidência de impostos diretos e subsídios.

Na terça-feira, ao falar na Universidade de Stanford, Lagarde disse que "a desigualdade crescente e a exclusão econômica podem ter efeitos perniciosos". Para ilustrar, citou entre outras fontes números da ONG Oxfam, como o de que as 85 pessoas mais ricas do mundo têm patrimônio equivalente ao da metade mais pobre da população mundial.

A preocupação com a desigualdade é mais um passo gradual do FMI na direção de uma agenda mais flexível. A antiga oposição a controle de capitais foi abandonada nos últimos anos, embora o Fundo considere que essa medida em geral deve ser específica, transparente e temporária, sem prescindir de ajustes macroeconômicos. A defesa ferrenha da austeridade fiscal também faz parte do passado. No ano passado, o Fundo recomendou a países avançados, como os EUA, que reduzissem o aperto das contas públicas no curto prazo, para não prejudicar a frágil recuperação econômica.

Em teleconferência, Jonathan Ostry, um dos três autores do estudo divulgado (...), disse que o trabalho não tem "implicação direta" sobre o aconselhamento de políticas e desenho de programas do Fundo. Como de costume, o relatório adverte que ele reflete a opinião dos autores, e não necessariamente a visão ou as políticas do FMI. Há, no entanto, uma óbvia expectativa de influenciar o debate, e a publicação do estudo foi autorizada pelo economista-chefe da instituição, Olivier Blanchard, um dos principais responsáveis pelas mudanças na orientação do FMI.

Segundo o estudo, a desigualdade é um "determinante robusto e poderoso" tanto do ritmo de crescimento de médio prazo quanto da duração do ciclo de expansão. "Seria um erro focar no crescimento e deixar a desigualdade cuidar de si mesma, não só porque a desigualdade pode ser eticamente indesejável, mas também porque o crescimento resultante pode ser baixo e insustentável", diz o texto.

O estudo lembra que há controvérsia na literatura econômica sobre a questão de crescimento e políticas redistributivas. O efeito negativo da redistribuição é o tema central de um livro famoso do economista Arthur Okun, de 1975. Há, porém, trabalhos com conclusões diferentes, sugerindo que investimento público em infraestrutura e gastos em saúde e educação podem ser ao mesmo tempo pró-crescimento e pró-igualdade. Em estudo de 2011, Ostry e Andrew Berg, outro dos autores do trabalho, já haviam mostrado a relação forte entre igualdade e sustentabilidade do crescimento econômico. (Fonte: aqui).

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