Situação econômica faz com que poucos brasileiros protestem contra a corrupção
Tatiana Farah (O Globo)
A primavera dos brasileiros já passou. Essa é a opinião de especialistas ouvidos na quarta-feira pelo GLOBO, que apontaram como grandes momentos de mobilização as Diretas Já, nos anos 80, e o Fora Collor, nos anos 90. O movimento contra a corrupção, que tem saído da internet para ganhar as ruas como aconteceu ontem em diversas cidades brasileiras, no entanto, está longe de ser uma nova primavera.
- Nossa primavera foi o momento das Diretas, quando 1,5 milhão foi às ruas. O que são cinco mil pessoas reunidas em São Paulo ou 13 mil em Brasília? É muito pouco. Sem organicidade, esse movimento não vai crescer. As manifestações ganham força se tiveram algo orgânico, como partidos e sindicatos - afirma o cientista político Carlos Mello, do Insper.
Professor titular de Ética e Filosofia Política na Universidade de São Paulo (USP), Renato Janine Ribeiro afirma que um problema para a mobilização do país contra a corrupção é que as pessoas são contra a corrupção, mas dos partidos alheios:
- O problema na luta contra a corrupção é que ela está tomada pelos partidos. E é uma lástima que as pessoas usem isso contra o partido oposto.
Para Janine Ribeiro, não se pode comparar o movimento contra a corrupção com movimentos como a Parada Gay:
- Na Parada Gay, todos estão celebrando a vida. Quando se está lidando com uma coisa suja, como a corrupção, não há toda essa euforia. Acho essa comparação inoportuna e um tanto moralista.
Janine Ribeiro, Carlos Mello e o cientista político David Fleischer, da UnB, apontam que o momento econômico brasileiro colabora com a desmobilização:
- A economia é um fator para a desmobilização. Quando a economia está positiva, com aumento do salário médio e menos desemprego, isso alivia a barra dos brasileiros que, por natureza, são mais pacíficos e conciliadores - diz Fleischer.
Para Fleischer, uma mobilização de massa precisa contar com "o elemento da opressão financeira", como tem ocorrido na Espanha, na Inglaterra e nos Estados Unidos.
- Nós já tivemos nossas primaveras, como as Diretas Já e o Fora Collor. Eram momentos em que os brasileiros não estavam aguentando mais.
Janine Ribeiro lembra que, nesses momentos, o Brasil estava com graves problemas econômicos e que a indignação nas ruas não era apenas política.
- Infelizmente, parece que o ponto crucial, o determinante, é a situação econômica. Realmente, eu gostaria que tivéssemos derrubado Collor pela corrupção e não pela crise econômica, mas não foi isso o que ocorreu.
Segundo Carlos Mello, em momentos de crise econômica, "a corrupção passa a ser intolerável".
- Mas o momento é desmobilizador, com desemprego de 6% e com algum crescimento econômico.
Na Espanha, na Inglaterra e nos Estados Unidos, a crise empurrou as pessoas para as ruas. Agora, aqui, estão exigindo espírito cívico demais para um mundo que não tem mais esse civismo - diz Mello.
Para Mello, não se pode dizer que os brasileiros não saem às ruas simplesmente porque na Espanha os "indignados" tomaram as praças.
- Os espanhóis se mobilizam agora, mas aguentaram 40 anos de regime franquista - afirma Mello.
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