quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

DA SÉRIE INDICADORES DA POLITIZAÇÃO DO JUDICIÁRIO (OU: IN FUX WE DON'T TRUST)


"A judicialização da política, compreendida como expansão da atuação do Poder Judiciário, não é um acontecimento novo, nem brasileiro. Desde o pós-guerra muitos países ocidentais democráticos passaram a adotar tribunais constitucionais como instrumento de controle dos demais poderes.
No Brasil, o fenômeno se acentuou após a Constituição Federal de 1988. Não é exagero dizer que na primeira década após sua promulgação, grande parte dos direitos postos na Carta já haviam sofrido alguma modalidade de questionamento, tentativa de restrição ou de ampliação no Supremo Tribunal Federal. Trinta e um anos depois é difícil saber qual dispositivo ainda não foi exposto a alguma alteração judicial.
A questão da judicialização sempre encontrou pontos de vista favoráveis e contrários.Por um lado, busca-se justificar a ampliação da atuação dos magistrados, como decorrência do poder de revisão judicial de ações legislativas e executivas, em razão da constitucionalização de direitos, dentro dos mecanismos de checks and balances, e com uso dos mecanismos legítimos de proteção judicial pelas minorias parlamentares, pessoas e entidades da sociedade civil organizada.
Por outro, a transformação de todas as querelas políticas em demandas judiciais tem conferido ao Poder Judiciário um protagonismo excessivo, fazendo com que juízes e tribunais adentrem a esfera da política, forjando uma tutela que cria uma democracia regida por juízes e não por leis.
Contudo, não se mostra difícil separar a proteção a bens jurídicos relevantes, sobretudo direitos fundamentais, potencializando a eficácia normativa dessas garantias, daquilo que, infelizmente, tem sido mais comum na atuação de vários magistrados, quando extrapolam os legítimos limites de seu múnus –  obrigação imposta por lei, em atendimento ao poder público, que beneficia a coletividade e não pode ser recusado, exceto nos casos previstos em lei – e assumem o papel de legislar.
A judicialização da política, compreendida como expansão da atuação do Poder Judiciário, não é um acontecimento novo, nem brasileiro. Desde o pós-guerra muitos países ocidentais democráticos passaram a adotar tribunais constitucionais como instrumento de controle dos demais poderes.
No Brasil, o fenômeno se acentuou após a Constituição Federal de 1988. Não é exagero dizer que na primeira década após sua promulgação, grande parte dos direitos postos na Carta já haviam sofrido alguma modalidade de questionamento, tentativa de restrição ou de ampliação no Supremo Tribunal Federal. Trinta e um anos depois é difícil saber qual dispositivo ainda não foi exposto a alguma alteração judicial.
A questão da judicialização sempre encontrou pontos de vista favoráveis e contrários.Por um lado, busca-se justificar a ampliação da atuação dos magistrados, como decorrência do poder de revisão judicial de ações legislativas e executivas, em razão da constitucionalização de direitos, dentro dos mecanismos de checks and balances, e com uso dos mecanismos legítimos de proteção judicial pelas minorias parlamentares, pessoas e entidades da sociedade civil organizada.
Por outro, a transformação de todas as querelas políticas em demandas judiciais tem conferido ao Poder Judiciário um protagonismo excessivo, fazendo com que juízes e tribunais adentrem a esfera da política, forjando uma tutela que cria uma democracia regida por juízes e não por leis.
Contudo, não se mostra difícil separar a proteção a bens jurídicos relevantes, sobretudo direitos fundamentais, potencializando a eficácia normativa dessas garantias, daquilo que, infelizmente, tem sido mais comum na atuação de vários magistrados, quando extrapolam os legítimos limites de seu múnus –  obrigação imposta por lei, em atendimento ao poder público, que beneficia a coletividade e não pode ser recusado, exceto nos casos previstos em lei – e assumem o papel de legislar.
É fato conhecido que a atuação de Fux sempre foi – desde que o falecido ministro Teori Zavascki era o relator da Lava Jato no Supremo – de decisões, votos e declarações em defesa da força-tarefa e do magistrado da operação, hoje ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. Não por acaso, o ex-juiz elogiou a decisão de Fux de suspender parte de uma lei que foi sancionada pelo presidente do governo ao qual pertence.
Em 2018, enquanto juiz, Moro e os membros da força-tarefa operaram de todas as formas para impedir o ex-presidente Lula de conceder entrevistas, em flagrante desrespeito ao seu direito constitucional. Em 2019, como ministro da pasta da Justiça, Moro trabalhou contra a inclusão do juiz de garantias na nova lei e pediu o veto a Bolsonaro, que não veio.
Quando escreveu no seu Telegram, a frase “In Fux we trust”, em mensagem no diálogo com o coordenador da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, Sérgio Moro sabia o que dizia. O alinhamento entre o hoje vice-presidente do STF e o modus operandi da operação Lava Jato, e as demandas e posições do próprio Moro é evidente. E indica não cogitar dos limites da Constituição, das normas em geral, da jurisprudência ou do respeito à independência entre os poderes.
A confiança de Moro e Dallagnol em Fux, a sugerir que seria o ministro capaz de adotar procedimentos incoerentes e apartados da legalidade, compactuando com os desvios praticados pela Lava Jato, nos impele, como sociedade, a questionar se podemos também confiar nele, como juiz imparcial e isento para proferir seus julgamentos.
Fux representa o limite ultrapassado por um membro do Tribunal de cúpula de um poder que não possui qualquer regulação, sendo imune a canais de controle democrático. Faz parte da parcela de juízes que construíram uma autoimagem blindada pela opinião pública, construída sob um suposto combate à corrupção. Homens públicos que se sentem e agem como se tudo pudessem, potencializando os conflitos entre as instituições e internamente a elas, e fazendo crescer as contendas e incertezas sobre qual é a aplicação do Direito a ser adotada.
Fux é um juiz movido por interesses estranhos ao ideal democrático de respeito aos direitos e à Carta Constitucional, mas afeito a dar respostas rápidas e simplórias a questões profundas quando lhe convém, sem qualquer preocupação em aclarar os fundamentos jurídicos e estabelecer os parâmetros sobre os quais elas se assentam, mas apenas de explicitar sua vontade pessoal.
Suspender a aplicação de parte de uma lei por uma liminar já foi um absurdo na decisão de Toffoli. Reformar a decisão para tornar a suspensão por tempo indefinido, em plantão judicial, mostra irresponsabilidade com o cargo que ocupa e arrogância desmedida.
Quando o resultado de uma decisão judicial depende menos da aplicação do Direito, de forma ética, e mais da vontade do julgador, movida por interesses, sejam seus, de outras pessoas ou grupos, tem-se a politização do Judiciário em seu grau elevado, que recebe, como consequência, o descrédito na Justiça e a ruína de um dos pilares da democracia."



(De Tânia Maria de Oliveira, post intitulado "In Fux we don't trust", publicado no Brasil de Fato - Aqui.

Tânia é advogada, historiadora e pesquisadora. Membra do Grupo Candango de Criminologia da Unb - GCcrim/Unb. Membra da Coordenação Executiva da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia - ABJD).

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