domingo, 21 de setembro de 2014

MUSSUM FORÉVIS


Ótimo livro lembra que Mussum foi também original no samba

Por Mauro Ferreira

O cantor e compositor Almir Guineto costuma ficar com todo o crédito pela introdução do banjo na roda de samba. Mas o fato é que o cantor, percussionista e humorista Antônio Carlos Bernardes Gomes (Rio de Janeiro, 7 de abril de 1941 - São Paulo, 29 de julho de 1994), o Mussum, também teve participação decisiva na criação do instrumento resultante da interação entre o banjo e o cavaquinho. Foi de Mussum, aliás, a ideia de acoplar as cordas do cavaquinho ao banjo para amplificar o som do instrumento, usado pioneiramente nesse novo formato em Samba Exportação (RCA Victor, 1971), quarto álbum do grupo carioca Os Originais do Samba.

O relato da invenção de Mussum é feito na página 142 da excelente biografia do artista, escrita pelo jornalista paulista Juliano Barreto e recém-lançada pela editora Leya para lembrar os 20 anos da morte do músico eternizado como humorista no imaginário nacional. Mussum Forévis - Samba, mé e Trapalhões é alentada biografia deste carioca hoje mais lembrado por ter composto o quarteto Os Trapalhões com Renato Aragão, Dedé Santana e Mauro Faccio Gonçalves (1934 - 1990), o Zacarias.

Dono de texto fluente, o autor reconstitui a vida de Mussum com a profundidade esperada de uma biografia. Para estudiosos da história da música brasileira, o livro presta valioso serviço ao documentar a trajetória do grupo Os Originais do Samba, formado nos anos 1960 por músicos que circulavam nos morros do Rio de Janeiro (RJ). Juliano Barreto mostra que o grupo teve peso na cena musical nacional entre a segunda metade dos anos 1960 e a primeira da década de 1970.

Descendentes de um grupo chamado Os Sete Modernos, Os Originais do Samba surgiram em 1965 a partir de violento racha no grupo anterior. Mussum tocava reco-reco n'Os Originais. De início, o grupo atuou na noite carioca, participando de espetáculos do produtor e empresário gaúcho Carlos Machado (1908 - 1992) quando este já começava a ser destronado como o rei da noite carioca. Mas foi na cidade de São Paulo (SP), na era dos festivais, que Os Originais começaram a ser notados e levar público para seus shows. Sempre antenada, Elis Regina (1945 - 1982) orquestrou um convite para que o grupo a acompanhasse na defesa de Lapinha (Baden Powell e Paulo César Pinheiro, 1968) na primeira Bienal do Samba, festival produzido pela TV Record em 1968. Daí em diante, o grupo viveu uma fase de consagração, gravando na RCA, a partir de 1969, uma série de álbuns que consolidaram seu estilo próprio de cantar e tocar samba com um suingue que encantou os executivos gringos da indústria fonográfica na França, no Midem de 1971, quando Os Originais foram - ao lado do cantor  paulista Jair Rodrigues (1939 - 2014) - a principal atração brasileira da feira internacional do mercado de discos. Atento ao suingue personalíssimo do grupo, Jorge Ben Jor - então no auge do sucesso - deu em 1969 um samba, Cadê Tereza?, que impulsionou as vendas do primeiro álbum d'Os Originais. Outros discos e sucessos se seguiram - como Do lado direito da rua direita (Luiz Carlos e Chiquinho, 1972), Esperanças perdidas (Adeilton Alves e Délcio Carvalho, 1972) e Tragédia no fundo do mar (Assassinato do camarão) (Ibrain e Zeré, 1974) - a ponto de Mussum ter dúvidas se devia aceitar o convite para ingressar no programa Os Trapalhões, na TV Tupi, e dedicar mais tempo à carreira de humorista que havia começado meio por acaso nos anos 1960.

Aceitado o convite, o tocador de reco-reco - como Mussum se denominava - passou a ser cada vez mais, e para sempre, humorista. Adicionados ao progressivo declínio d'Os Originais do Samba a partir da segunda metade dos anos 1970, os crescentes compromissos assumidos com Renato Aragão e Cia. levaram Mussum a sair - a rigor, a ser saído pelos colegas, irritados com seus constantes atrasos - do grupo que ajudou a fundar e pelo qual lutou nos tempos das vacas magras.

A biografia de Juliano Barreto retrata Mussum sem reverência excessiva. Juliano Barreto ressalta a espontaneidade do artista - que circulava em todos os ambientes sem pose e sem afetação, cativando as pessoas com o carisma e simplicidade já conhecidos dos habitantes do Morro de Mangueira - sem deixar de expor no (ótimo) livro todos os matizes da personalidade do artista. (Fonte: aqui).

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