terça-feira, 23 de setembro de 2014

J. CARLOS DE ASSIS E A COMUNICAÇÃO OFICIAL


As realizações escondidas de Dilma num Governo que não sabe se comunicar

Por José Carlos de Assis

Tenho grande simpatia pela monumental obra de progresso social sob os governos do PT. Na mesma medida, tenho restrições a sua política macroeconômica. Fazendo um balanço, fico com o lado positivo do ganho social: em nenhum outro país do mundo aconteceu nos últimos anos um desenvolvimento social tão amplo quanto no Brasil, no qual a concentração de renda diminuiu sensivelmente, o salário mínimo teve aumentos reais  consistentes, milhões de pobres ascenderam socialmente, o IDH aumentou e o desemprego caiu para os mais baixos níveis históricos.

Tudo isso aconteceu num contexto de crescente concentração de renda no mundo, sob os auspícios do neoliberalismo, e com destaque nos países industrializados avançados, notadamente nos gloriosos e ricos Estados Unidos da América e na Europa. É que os governos do PT fizeram uma mágica curiosa: sem transigir com o neoliberalismo e o Consenso de Washington (se o tivessem feito o crescimento teria sido maior), fizeram uma política fiscal moderadamente desenvolvimentista e favorável aos mais pobres. Claro, tiveram um grande auxílio na frente externa: as importações minerais e agrícolas da China.

Por que, então, há tanta oposição a Dilma numa fração significativa das classes médias? Será porque as classes médias não gostam do que ela e Lula fizeram pelos pobres? Certamente que não. Os brasileiros são generosos pela própria natureza. Se uma significativa fração deles está contra Dilma, a razão principal é que está desinformada. Este Governo padece de uma monumental incompetência no campo da comunicação social. Ele nem consegue apontar o que faz de bem, nem se defender dos que o acusam por algum mal.

A comunicação é a chave do relacionamento do governante com o povo. Lula é, sabidamente, um craque nisso. Entretanto, se acovardou diante do maior massacre de mídia que algum governante brasileiro, em todos os tempos, sofreu direta e indiretamente: o noticiário do processo do mensalão.

Com quatro horas diárias na televisão por assinatura, mais algo como uma hora por dia de manhã e à noite em cadeia de tevê aberta, durante quatro meses, era impossível que, sem réplica consistente,  qualquer cidadão brasileiro não se convencesse, seguindo as palavras do “imparcialíssimo” ministro Joaquim Barbosa,  de que o Governo do PT havia sido tomado por uma quadrilha de malfeitores.

Ao não contar a verdadeira história do chamado mensalão, uma irregularidade eleitoral chamada caixa dois de campanha, a direção do PT deixou que grande parte da opinião pública brasileira se convencesse de corrupção ativa e passiva, formação de quadrilha, pagamentos mensais de votos de deputados do próprio partido e o inacreditável “domínio do fato” que serviu para condenar Dirceu.

Ao que tudo indica, Lula confiava na Justiça do STM. E a direção do PT se omitiu na obrigação política de fazer uma verdadeira narrativa dos fatos, relegando a tarefa a cada advogado que cuidava especificamente do seu cliente, não do conjunto do processo, ou a alguns jornalistas independentes, como Jânio de Freitas, Luís Nassif, Paulo Henrique Amorim e eu próprio.

Não obstante, Lula sobreviveu ao massacre em sua reeleição. E a direção do PT achou que o assunto estava morto, no sentido de que não influiria nas eleições futuras, pelo que não era necessário um esclarecimento a seu respeito. Acertou de novo, porque Dilma foi eleita em 2010 pelo grande eleitor.

Mas para uma fração crescente do eleitorado, o mensalão resistiu no subconsciente coletivo como o símbolo máximo da corrupção no Brasil. Dilma, que está longe de ser uma boa comunicadora, e que nem de longe foi contaminada concretamente pelo mensalão, acaba sendo uma vítima indireta dele por causa do silêncio covarde do PT, que entregou sem resistência a vida, a honra e a liberdade de seus grandes líderes na construção do primeiro governo.

Coisa parecida ressurge agora no escândalo forjado da Petrobrás,  onde um bandido confesso se torna cúmplice da imprensa golpista para tentar denegrir a imagem do governo do PT. Não se vê por parte da direção do PT uma pronta resposta. O silêncio é uma espécie de confissão de culpa. Como não é uma boa comunicadora, Dilma contra-ataca com números. Os números são expressivos e convincentes. Mas tem o sabor de um poema concretista, sem emoção, ou com a emoção de pedradas. Assim mesmo ela consegue ter um desempenho fantástico nas pesquisas, confirmando o enunciado de Lenin segundo o qual “a verdade (mesmo quando não dita) é revolucionária”.

Sinto que as coisas começam a ficar favoráveis a Dilma a despeito de suas próprias dificuldades comunicativas e da incompetência brutal de seu Governo nessa matéria. Vou dar um exemplo concreto. Li há alguns dias o relatório do PPA 2013-2015, que é uma espécie de prestação de contas de doze anos de Governo realizado pelo Ministério do Planejamento. É um show de realizações nas áreas sociais da saúde, educação, combate à miséria, promoção do emprego, desenvolvimento regional etc. Não vi nada disso na comunicação do Governo. Essa TV Brasil é um instrumento inútil de prestação de contas, pretendendo apenas copiar a tevê aberta em debates insossos de uma forma caricata. A comunicação do Governo se restringe a dar dinheiro para seus detratores Veja e Globo, a discriminar desfavoravelmente a imprensa média e pequena, e a ignorar seus próprios aliados na imprensa.

Mais do que isso, a própria função do planejamento está subestimada. No Governo militar havia planejamento centralizado federal, que em seu tempo, sob Reis Velloso, teve seus méritos. Nos anos da abertura, quando prevalece o pacto democrático, isso não seria possível no formato autoritário anterior. Foi difícil e demorado encontrar um meio caminho de convergência entre o planejamento central e as demandas sociais no nível dos estados e dos municípios. É o que está acontecendo agora, com grande eficácia, na forma de planejamento participativo territorial.

No último dia 17, para minha surpresa, reuniu-se em Brasília o Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Planejamento, para tratar de planos plurianuais territoriais participativos. Dito de forma burocrática, isso não tem o menor significado. Na prática, é a efetiva democratização do planejamento, algo que só um governo popular poderia realizar. É da iniciativa de Dilma, orgânica e racional, não de Lula, geralmente inorgânico e emocional. Infelizmente, a comunicação do Governo é incapaz de refletir esse avanço no plano da ação estratégica governamental. Só tomei conhecimento do fato por acaso. (Fonte: aqui).

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