sexta-feira, 22 de novembro de 2013

O EMBUSTE DOS SALVADORES DA PÁTRIA

Leandro - É muita sujeira, seu Jânio! São Cordilheiras!
Jânio - Com a industrialização de todo esse lixo, quem sabe, seu Leandro, se não salvaremos as finanças nacionais?! 

Jânio Quadros, o Homem da Vassoura, em charge de Théo. Revista Careta. 1960.

Os salvadores da pátria no tempo histórico

Por Motta Araujo

As sociedades só evoluem em civilização de forma lenta e gradual, atravessando gerações de melhoramentos de costumes, padrões, atitudes, consciência. Os Estados Unidos eram o país mais corrupto do planeta logo após a Guerra Civil, a política de Nova York criou uma expressão - "Tammany Hall" -, nome da sede do governo do Estado que é até hoje sinônimo de roubalheira pública. Muito devagar mas firmemente os padrões de governança pública nos EUA foram melhorando e hoje ao ser descoberta algum ato de corrupção o governante perde o cargo, é processado e preso em poucas semanas, como aconteceu com o governador do Illinois que negociou a vaga de senador de Obama. Não que a corrupção não mais exista, mas diminuiu muitíssimo, o controle é institucional.

O grande risco das sociedades é quando aparece o "salvador da pátria", aquele que de um só golpe vai mudar os comportamentos caçando os corruptos e eliminando a corrupção. O mundo conheceu muitos e todos eles foram  imensos desastres políticos, que produziram prejuízos maiores que guerras.

Na Itália, após 50 anos de governo da Democracia Cristã, que com todos seus erros fez uma Itália próspera, vieram os promotores da Operação Mãos Limpas, destruiram os partidos e deixaram um vácuo político que foi preenchido por algo muito pior do que a Democracia Cristã, um bandoleiro que atendia pelo nome de Berlusconi. A Democracia Cristã tinha corruptos sim, mas também tinha grandes estadistas que fizeram a Itália do pós-Guerra.

No Peru, Alberto Fujimori levantou a bandeira do moralismo, que lhe garantiu dois mandatos; no terceiro a farsa caiu, junto com Valdomiro Montesinos, seu homem forte e arrecadador de malas de dólares que distribuía a políticos vendidos, sem esquecer de filmá-los no momento da entrega do dinheiro com cameras secretas.

O Brasil também conheceu seus "salvadores da patria", os campeões da moralidade.
Jânio Quadros fez toda sua carreira política no combate à corrupção, o moralista por excelência, o "homem da vassoura" para varrer a roubalheira. Jânio nasceu combatendo a corrupção de Adhemar de Barros. Teve votações esmagadoras, chegou a Presidente com o maior percentual de votos até hoje alcançado por um candidato. Sua renúncia custou prejuízos incalculáveis ao País. O homem incorruptível nunca foi santo.

No periodo mais próximo tivemos o Caçador de Marajás, Fernando Collor. A bandeira era a luta anti-corrupção do governo anterior, de José Sarney, a bandeira do moralismo.

Seu impeachment também teve custos incalculáveis: a queda traumática de um Governo sempre traz perdas ao País e às instituições. Quanto ao combate à corrupção, era como se um simples slogan de campanha.

Mas os salvadores da pátria retornam a cada geração. O moralismo de um só golpe é uma recorrente bandeira politica que rende dividendos garantidos porque a cada geração nascem novos crédulos e ingênuos que formam o mercado político desses personagens farsescos.

Os salvadores da pátria são trapaceiros que, ao empunhar a campanha moralista, parecem cavaleiros da honestidade,  só eles são puros, todos os demais são corruptos, apontam o dedo santo para quem ousa corrigir-lhes o discurso falso mas convincente, e se impõem aos que percebem seu truque pela ousadia ameaçadora (...).

Jânio sabia se impor como ninguém, até a imprensa tinha pavor dele, ai de quem lhe ousasse cortar os passos.

Afinal, quem tem a audácia de se contrapor ao homem puro que quer salvar o país?

Recentemente tivemos um senador que carregava o estandarte do moralismo e depois descobriu-se que era também enganador de crédulos, vendia-se por uma cozinha nova de aço inoxidável dada por um bicheiro.

Jânio, o homem da vassoura para varrer a corrupção deixou, ao morrer, uma fornida conta na Suíça para sua filha, e mais 63 imóveis. Seu lema, seus instrumentos de propaganda, seus bordões e seu script nunca mudaram, sempre foi o valoroso lutador contra os corruptos, acreditaram nele até morrer e até hoje há crentes saudosos.

Por que será que as nações a cada geração se dispõem a comprar esse produto pirata de falsificação tão manjada?

É impressionante a credulidade dos povos em salvadores da pátria. Eles não só não são honestos, como não resolvem nada; as sociedades só evoluem pelo aperfeiçoamento das instituições e isso leva tempo, mas não há outro caminho. A natureza não dá saltos, as sociedades também não. Pobre do país que espera salvadores da pátria; eles costumam cobrar MUITO  CARO pela sua arrogância moralista. (Fonte: aqui).

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