quinta-feira, 1 de outubro de 2020

MORRE QUINO, CRIADOR DA MAFALDA E O MAIS INTERNACIONAL CARTUNISTA DA LÍNGUA ESPANHOLA

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Uma querida amiga: "Quino PRESENTE!"
Eu: "É, amiga, partiu Quino. Graças a Deus sua filha é eterna!"

                   
(Bairro San Telmo, Buenos Aires)

Por Alex Grijelmo

Morreu o cartunista mais internacional e mais traduzido da língua espanhola, e talvez também o mais cativante: Joaquín Salvador Lavado, o Quino. Ele nasceu em 17 de julho de 1932 em Mendoza (Argentina), e tinha 88 anos. Residia na mesma cidade, cuidado por seus sobrinhos desde que se mudou para lá em novembro de 2017, após a morte de sua esposa, Alicia Colombo. O nome de Quino ficará para sempre associado à mais famosa das suas personagens: Mafalda, garota sábia e respondona.

Os pais de Joaquín Lavado eram espanhóis de Fuengirola (Málaga) e emigraram para a Argentina na década de 1930. A família pobre vivia em um círculo muito fechado, a tal ponto que o menino Quino falava em andaluz até os primeiros seis anos. 


A morte de seu pai o surpreendeu com apenas 14 anos, e ele temperou essa ausência com as aparições fantasmagóricas que ele acreditava ver de vez em quando. Mesmo depois de se casar com Alicia, o pai ainda aparecia para ele, fumando (“ele ainda ignorava que fumar não faz bem”), e olhava com orgulho para o cartunista porque o menino não tinha se saído tão mal. Quino costumava lembrar dessas visões: “Eram aparências muito agradáveis.”


Tacho. 

Joaquín Salvador Lavado sempre quis ser cartunista. Decidiu ainda criança, aos três anos, quando um tio, designer gráfico, começou a fazer desenhos para entreter ele e seus irmãos. Quino ficou surpreso com todas as coisas que poderiam sair de um lápis. Mais tarde, ele estudaria Belas Artes na Universidade de Cuyo, maior centro de educação superior da província de Mendoza. Não terminou o curso, mas conseguiu assimilar os conceitos básicos de desenho e proporções.


Nascimento da Mafalda


Um primeiro emprego como desenhista publicitário levou-o a criar Mafalda em 1962 graças a máquinas de lavar e frigoríficos. Quino foi encarregado de de um anúncio que consistia na produção de histórias em quadrinhos para jornais que retratassem a vida de uma família usando eletrodomésticos Mandsfield. E dessa sequência fonética surgiu o nome Mafalda.

Os jornais rejeitaram essa publicidade, por se confundir com seu próprio conteúdo, e os personagens criados por Quino ficaram na gaveta. Porém, ele recuperou a história em 1964, não mais comercialmente; e assim a tirinha de maior sucesso em língua espanhola apareceu pela primeira vez no jornal portenho Primera Plana, antes de conquistar os jornais de todo o mundo. Mais tarde, os livros dos personagens venderiam milhões de cópias e seriam traduzidos para o francês, inglês, japonês, chinês..., em mais de 30 idiomas.

Mafalda também foi ao cinema, com um longa-metragem de 75 minutos realizado na Argentina. Mas Quino não ficou satisfeito, pois ao sair da estreia ouviu alguns dizerem: “Mas essa voz não é da Mafalda!” Então, ele transferiu a história para o cinema mudo. As experiências seguintes, lideradas pelo grande Juan Padrón, especialista cubano em animação, deixaram de ter diálogos. Eram novas piadas baseadas nas próprias cenas. Desta forma, Mafalda ofereceu ao público a voz que todos teriam imaginado.

Dessa turma (Manolito, Susanita, Libertad, Guille ...), Quino sempre teve seu filho preferido, o ingênuo idealista Felipe, ao longo de sua vida.

Em 1973, nove anos e 1.928 tiras após a sua criação, Quino decidiu que não desenharia mais a Mafalda, exausto pela própria personagem e pela tirania da entrega diária ao jornal. E então começou uma criação ainda mais ambiciosa, com desenhos meticulosos, detalhados e igualmente brilhantes, que muitas vezes mostravam a opressão dos poderosos e o olhar inteligente dos oprimidos. O EL PAÍS SEMANAL publicou esses desenhos na década de 1990.

Em uma delas você pode ver uma senhora oferecendo café aos convidados enquanto uma menina brinca entre eles. E a anfitriã esclarece: “Ela é filha de gente humilde por aqui. E compramos as roupas e os brinquedos para ela porque a amamos como se fosse da família”. As roupas que a menina usa: o uniforme de empregada com boné, e em volta dela os “brinquedos”, também no tamanho certo para sua idade: uma vassoura, um ferro de engomar, um espanador e um esfregão.


Seus livros continuaram a ser vendidos às centenas de milhares, mas competindo na memória coletiva com os de Mafalda e com os milhares de chaveiros, cadernos, adesivos, emblemas e toalhas que reproduzem a sua imagem; e com o carinho que a personagem desencadeou em milhões de pessoas.  -  (Carta Maior - Aqui).


*Publicado originalmente em 'El País'

(Nota
Duas das fotos acima e o desenho final são do arquivo deste Blog).

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