segunda-feira, 20 de maio de 2019

DE COMO O BRASIL BATEU DE FRENTE COM A LITURGIA DIPLOMÁTICA

(GGN)
Uma diplomacia em pedaços
Por André Araújo (No GGN)
Relações internacionais de um grande país só têm sentido como expressão de um projeto geopolítico de inserção no mundo. Esse processo exige planejamento de longo prazo, que os países-potências praticam com profissionalismo. Foi George Kennan, um dos grandes diplomatas do Século XX, quem criou o escritório de planejamento estratégico do Departamento de Estado americano, do qual ele foi o primeiro diretor.
Kennan, em 1949, então Embaixador em Moscou, traçou as linhas desse grande plano estratégico em relação ao mundo bipolar com a chamada “doutrina de contenção”. Deveria ser, daí em diante, a política dos EUA em relação à URSS, que teve sucesso até a desintegração do regime soviético, em 1990, prevista por Kennan em 1949.
Relações internacionais de um grande país jamais devem ser improvisadas ou produto de simpatia ou ideologia, sempre devem ter uma finalidade.
AS VISITAS PRESIDENCIAIS
Visitas presidenciais só frutificam se forem planejadas com longa preparação, seis meses é o prazo mínimo para definição de uma agenda com chance de resultados. Ao contrário do que muitos pensam, Chefes de Estado só FINALIZAM tratativas já amadurecidas antes pelas chancelarias e pelos diplomatas do escalão avançado de preparação da visita. Presidentes só formalizam acordos já fechados antes pela diplomacia, essa é a regra da arte diplomática definida na sua versão moderna no Congresso de Viena de 1814 e pelas sucessivas Convenções de Viena sobre diplomacia.
É uma arte de REGRAS, conhecidas como ”protocolo diplomático”, que se aplicam, inclusive, durante e após grandes conflitos, rendições em raise campagne (Nota deste Blog: desconhecemos o significado da expressão) , armistícios, tratados de paz, tudo se organiza através de protocolos diplomáticos universalmente aceitos, assim como a situação de embaixadas, as visitas de dignatários, os acordos e as complexas relações entre países, para proteção das fronteiras, dos nacionais, das empresas, dos meios de transportes, dos céus.
No protocolo do Departamento de Estado dos EUA há cinco níveis de visitas presidenciais, sendo a mais alta a ”state visit” e a mais baixa a “private visit”, todas com protocolos específicos onde até o traje do jantar de gala é previsto com detalhes como a cor da gravata.
OS PRESIDENTES DO BRASIL NOS EUA
Na República de 1891, o último Presidente ainda eleito e não empossado a visitar os EUA foi Júlio Prestes. Getúlio Vargas nunca visitou os EUA mas Dutra teve visita de Estado em 1949. JK foi só uma vez, em 1956, visitando Eisenhower em Key West na Flórida. Goulart esteve em 1962, discursou no Congresso e teve jantar na Casa Branca, gravata preta.
Depois Arthur da Costa e Silva em 1967, Médici em 1971 (visita de Estado), Figueiredo em 1981 (visita de Estado), Sarney em 1986; Collor esteve três vezes, Itamar uma vez, FHC 5 vezes, Lula 8 vezes, Dilma 2 vezes. Não relacionei visitas específicas para participar de Assembleias da ONU em Nova York, uma vez que não são consideradas visitas oficiais aos EUA.
VISITAS IMPROVISADAS DÃO PÉSSIMA IMPRESSÃO
Visitas presidenciais improvisadas, sem agenda, sem preparação, sem pautas que tragam resultados ao Brasil, causam péssima impressão no País visitado e não produzem qualquer ganho quer prático, quer institucional, expõem a instituição presidencial à banalização, à desimportância.
Liturgia é fundamental nas relações diplomáticas, protocolo é respeitado e esperado, nível da delegação é um ponto fundamental no resultado da visita.
Uma visita de importância deve ser preparada com MUITA antecedência, seis meses é o prazo mínimo, e sua qualidade é medida pelo nível da recepção, que é regulado pelo País anfitrião. Se este conferir nível 1, de “State Visit”, é sinal da importância que dá ao País visitante.
Um convite do Congresso é outro sinal de importância. O Congresso ou, se for na França, a Assembleia Nacional convidar o Chefe de Estado a proferir um discurso é sinal da importância que dá ao País e respeito à figura do Chefe de Estado visitante.
É absolutamente fora de qualquer regra diplomática um Chefe de Estado sequer demonstrar simpatia ou preferência por LADOS na política do País visitado. O Chefe de Estado visitante precisa ser FRIO nesse campo, porque os lados mudam e se o visitante apostou no lado errado isso prejudica profundamente os interesses do País visitante.
No momento o Presidente do Brasil já apostou publicamente nas eleições americanas pela reeleição de Trump e, na Argentina, na derrota de Cristina Kirchner, dois países fundamentais para nossas relações diplomáticas, se ganhar o outro lado o Brasil perde MUITO.
Hoje o nível das relações internacionais do Brasil, por causa dos quesitos clima, direitos humanos, refugiados, questões de gênero, questões de ideologia, caiu talvez no seu ponto mais baixo dos últimos cem anos, ao que se  acrescenta a ausência de qualquer linha reconhecível de política externa a não ser mostrar simpatia por regimes de ultra direita, o que automaticamente queima o Brasil na maioria dos centros de poder do mundo global, nos organismos multilaterais da elite global, centros de decisões fundamentais para questões econômicas, de comércio exterior.
Mais ainda, ser contra a agenda global TRAVA investimentos da elite das grandes corporações, que hoje subscrevem códigos de sustentabilidade, respeito a direitos humanos, a gêneros, se o Brasil for CARIMBADO como país fora da linha global isso vai rapidamente ISOLAR o Brasil para o primeiro time dos investidores mundiais.
É uma diplomacia em pedaços, de baixa qualificação, de nenhuma agenda e apenas tolerada pela dimensão e importância do País.

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Foi então que o senhor Presidente do Brasil se dispôs a, praticamente de supetão,  visitar Dallas (à falta de Nova York...), mandando às favas a liturgia diplomática. Patética foi a cena em que ele 'brilhou' sozinho, sentado ao lado da cadeira vazia em que Mike Pompeu, Secretário de Estado norte-americano e 'o' outro 'homenageado' no evento, deveria estar. Antes, a assessoria do ex-presidente norte-americano George W. Bush dera conta de que a visita de Bolsonaro a ele, ao contrário da versão vendida por outros, nem sequer havia sido objeto de prévio agendamento; ou seja, tudo feito pela equipe Bolsonaro na maior improvisação possível. Ridículo exposto, nada mais precisa ser dito.

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