A TRAGÉDIA OCULAR DE MACHADO DE ASSIS, de Hermínio de Brito Conde, é o título número 1 de dez a serem lançados pela Academia Piauiense de Letras, em parceria com a Fundação Cultural do Piauí. Nada mais justo, oportuno e útil.
O autor acompanha a trajetória do literato e burocrata, tendo como foco a sua capacidade ocular: os olhos normais da infância, o abuso ocular da adolescência, a miopia da juventude, a tragédia ocular da maturidade, os olhos malferidos da velhice.
Além do propósito de ressaltar a importância da 'higiene ocular', notadamente para os 'estudiosos e intensivos trabalhadores visuais', Hermínio nos brinda com informações e impressões colhidas a partir de certas obras de Machado e de abordagens realizadas por críticos e admiradores.
Aperitivos: 1) os olhos são uma emanação delicadíssima do cérebro (...) exposta às agressões e ao abuso; 2) o pince-nez, que Machado principiou a usar a partir dos 25 anos, revelou-se danoso, face à insuficiente graduação e má qualidade das lentes - além do desajuste para a 'vida longínqua'; 3) as anomalias oculares de Machado poderiam explicar sua brusca mudança do romantismo de 'Helena', por exemplo, para o 'espanto' do realístico 'Memórias Póstumas de Brás Cubas'; 4) Machado: miopia, neurastenia ocular, crises epiléticas (e consequente câncer da língua - e, por causa dele, subnutrição), cegueira noturna, vida gradativamente confinada; 5) Machadinho (como dizia dona Carolina), hostilizado pela família da noiva, contrária ao casamento em razão da cor parda do escritor, vê agravada sua gagueira; 6) o grande escritor, sempre às voltas com dificuldades financeiras, para fazer face às despesas de casamento teve de recorrer a 'dinheiro emprestado'; lamentava não poder oferecer a dona Carolina o conforto merecido - e trabalhava mais e mais, forçando os alquebrados olhos, até onde resistiu. "A FALTA DE OLHOS É TUDO".
A Liga Nacional de Prevenção da Cegueira enumerou 43 conselhos sobre higiene visual. Hermínio Conde os lista. Descontados os impertinentes à época e à profissão de Machado de Assis, todos foram por ele infringidos, total ou parcialmente, implicando sofrimento permanente - mas 'as suas próprias misérias participarão da consagração da fama', como vaticinou um dos seus críticos.
(Últimas palavras de Machado de Assis, sussurradas a José Veríssimo, no dia de sua morte, 20.09.1908: 'A vida é boa').
A TRAGÉDIA OCULAR DE MACHADO DE ASSIS, a despeito de pequenos escorregões da revisora, deveria ser matéria obrigatória para toda a rede escolar. Corrijo-me: todos, estudantes ou não, deveriam lê-lo.
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(A Tragédia Ocular de Machado de Assis; Hermínio de Brito Conde; coleção Grandes Textos, vol. 1; 106 páginas; prefácio de João Alfredo Lopes Braga; capa: Antônio Amaral, sobre desenho de João de Deus Neto; Halley S.A. Gráfica e Editora).
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