domingo, 1 de maio de 2022

SOBRE UM FILME IRANIANO AINDA SEM TÍTULO TRADUZIDO NO BRASIL

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A Casa Assassinada


Por Carlos Alberto Mattos

Com exclusividade na plataforma Mubi e sem título traduzido no Brasil, Chess of the Wind (literalmente, Xadrez do Vento e Shatranj-e baad no original) é um filme radicalmente diferente do que nos acostumamos a ver no cinema iraniano dos anos 1980 para cá. Foi realizado em 1976, antes da Revolução Islâmica e por esta retirado de circulação. Dado como perdido, foi encontrado pelo filho do diretor Mohammad Reza Aslani num antiquário da periferia de Teerã em 2015. Restaurado pela fundação de Martin Scorsese e a Cineteca di Bologna, reestreou na mostra Cannes Classics em 2020.

Trata-se de uma enorme curiosidade, embora não palatável para todos os gostos. Seu ritmo é vagaroso, a mise-en-scène é hierática, quando não inspirada no melodrama silencioso. As relações entre os personagens são tortuosas ao ponto da entropia. O que mais distingue formalmente o filme são os lentos movimentos de câmera que desvelam aos poucos o sentido das cenas e esquadrinham o cenário de uma mansão da alta burguesia dos anos 1920.

Ali, em ambiente lúgubre sufocado por tapetes, candelabros e lustres, uma família se engalfinha pelo controle de uma herança. O clima sugere um Lúcio Cardoso persa: uma casa assassinada, parentes matando parentes, uma protagonista presa a uma cadeira de rodas, pulsões homossexuais abafadas. 

Com a morte da matriarca, sua filha hemiplégica é oprimida pelo padrasto, que assume as rédeas do espólio. Com a parceria do noivo odiado e de uma criada mais que confidente, a moça arma um plano para se ver livre do usurpador. Mas nada sairá como planejado, já que ninguém ali é digno de confiança.

O Irã de Reza Pahlevi mostrava suas entranhas decadentes às vésperas da derrocada. Enquanto a família, enriquecida no ramo das joias, via seus dias contados, os empregados faziam uma espécie de coro, comentando com ironia as vicissitudes dos patrões. Na última cena, mais um deslocamento virtuoso de câmera conecta a década de 1920 com o ano de 1976, como a dizer que os ventos da modernidade já haviam desarrumado o tabuleiro de xadrez da velha burguesia. Três anos depois, os aiatolás decretariam outro rumo para o país. E um novo cinema iraniano ia nascer, no qual Mohammad Reza Aslani praticamente só faria curtas e documentários. - (Fonte: Carmattos - Aqui).

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