quinta-feira, 19 de março de 2015
SOBRE O FINANCIAMENTO DE CAMPANHAS POLÍTICAS (II)
Os inocentes e o silêncio da mídia e dos Ministros do STF
Por Sérgio Medeiros
Manifestações dos Ministros do Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 4650, sobre a inconstitucionalidade do financiamento de campanhas eleitorais por pessoas jurídicas (que se encontra suspenso por pedido de vista do Ministro Gilmar Mendes, desde 02.04.2014)*:
“(...)autorizar as doações de empresas seria contrário à essência do regime democrático.”. Ministro Luiz Fux
“A permissão para as empresas contribuírem para campanhas e partidos pode exercer uma influência negativa e perniciosa sobre os pleitos, apta a comprometer a normalidade e legitimidade do processo eleitoral, e comprometer a independência dos representantes”, Ministro Joaquim Barbosa
“(...)o atual sistema eleitoral não serve bem ao país” Ministro Luis Roberto Barroso
“(...)permitir o financiamento de campanhas por pessoas jurídicas é conceder a quem não tem direito a voto uma forma alternativa e mais eficaz de participar do processo eleitoral”, Ministro Dias Tofolli
"(...)não se pode acreditar no patrocínio desinteressado das pessoas jurídicas. Ao contrário, deve-se evitar que a riqueza tenha o controle do processo eleitoral em detrimento dos valores constitucionais compartilhados pela sociedade”, Ministro Marco Aurélio Mello.
“(...) o financiamento de partidos e campanhas por empresas privadas, da forma autorizada pela legislação eleitoral, fere o equilíbrio dos pleitos que, em sua opinião, deveria ser regido pelo princípio de que a cada cidadão deve corresponder um voto, com igual peso e valor. “As doações milionárias feitas por empresas a políticos claramente desfiguram esse princípio multissecular, pois as pessoas comuns não têm como se contrapor ao poder econômico, visto que somente podem expressar sua vontade política por uma expressão pessoal, singularíssima, periodicamente depositada nas urnas em época de eleições”, Ministro Ricardo Lewandowski
(Obs: O Ministro Teori Zavascki, diverge, em termos, de tais posicionamentos, mas não considera inconstitucional a norma atacada).
...
Os movimentos de rua, as chamadas jornadas de junho de 2013, seguem inconclusas em um dos poucos, mas, neste caso, FUNDAMENTAL efeito (...).
Em 11.12.2013, o Supremo Tribunal Federal, inspirado por tais movimentos incensados pela mídia, iniciou o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade ADI 4650, acerca do financiamento das campanhas eleitorais por pessoas jurídicas, bem como sobre a forma como se daria em relação às pessoas físicas.
Naquele momento, em que a operação Lava Jato ainda era incipiente, o posicionamento de seis Ministros já era acerca da inconstitucionalidade de tal participação, considerada muito mais uma interferência indevida, viciando o ato livre de cidadania.
Os fundamentos esgrimidos foram de tal forma contundentes que custa crer que as eleições imediatamente supervenientes tenham ocorrido sob a égide de tal distorção constitucional – político eleitoral.
É que o reconhecimento de tal vício ocasiona tal deturpação do Sistema Constitucional, que fere de morte o contido em sua cláusula fundamental - cláusula pétrea inserta no artigo primeiro, parágrafo único, que dispõe.. todo poder emana do povo (...).
Sendo este o pilar do Brasil, enquanto Estado Democrático de Direito, estando este, envenenado, este vício se transmite imediata e de forma integral não somente ao sistema eleitoral, mas ao estado brasileiro.
Era como se o artigo tivesse sido conspurcado em sua essência, e estaria sendo exercido de tal forma que poderia ser reescrito de outro modo que nada se alteraria, era como se dispusesse:...” todo poder emana das empresas privadas (...) e em seu nome é exercido” (ai incluídas as grandes empresas de mídia).
Dentre os elementos colacionados pelo Relator Ministro Luiz Fux resulta uma conclusão, que esta sim deveria ser considerada estarrecedora: “Para o ministro, autorizar as doações de empresas seria contrário à essência do regime democrático.”
Segue excerto das manifestações do Ministro Luiz Fux, conforme publicação do site do Supremo Tribunal Federal:
...(...)Para o relator da ADI 4650, ministro Luiz Fux, a regra permite a interferência do poder econômico sobre o poder político, o que tem se aprofundado nos últimos anos.
Segundo dados apresentados em seu voto, em 2002 foram gastos no país R$ 798 milhões em campanhas eleitorais, e em 2012, o valor foi de R$ 4,5 bilhões – um crescimento de 471%. O gasto per capta do Brasil com campanhas supera o de países como França, Alemanha e Reino Unido, e como proporção do PIB, é maior do que os EUA. Em 2010, o valor médio gasto por um deputado federal eleito no Brasil chegou a R$ 1,1 milhão, e um senador, R$ 4,5 milhões. Esses recursos, por sua vez, são doados por um universo pequeno de empresas – os dez maiores doadores correspondem a 22% do total arrecadado.
“O exercício de direitos políticos é incompatível com as contribuições políticas de pessoas jurídicas.
Uma empresa pode até defender causas políticas, como direitos humanos, mas há uma grande distância para isso justificar sua participação no processo político, investindo valores vultosos em campanhas”, afirmou. Para o ministro, autorizar as doações de empresas seria contrário à essência do regime democrático.
A seguir, temos o entendimento professado pelo Ministro Joaquim Barbosa, sendo que, neste caso, causa espécie seu mutismo sobre a questão, notadamente em face de sua recente volta à arena politica.
Naquela data (recentíssima, pouco mais de um ano) seu diagnóstico aplicar-se-ia como uma luva à chamada Operação Lava Jato, no que concerne às relações das empresas envolvidas e suas doações para as campanhas eleitorais de determinados candidatos.
Repito, a absurda inércia dos demais Ministros, enquanto o país, está à beira de uma convulsão, revela-se quase atentatória às suas funções de guardiões da Constituição Federal.
Por sua absoluta pertinência, segue abaixo transcrita a referida manifestação do Ministro Joaquim Barbosa:
“A permissão para as empresas contribuírem para campanhas e partidos pode exercer uma influência negativa e perniciosa sobre os pleitos, apta a comprometer a normalidade e legitimidade do processo eleitoral, e comprometer a independência dos representantes”, afirmou o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, em seu voto. Para ele, o risco do sistema vigente é criar um desequilíbrio entre os partidos, baseado na relevância dos recursos financeiros dispendidos no processo eleitoral. Alguns empreendimentos, disse, estão interessados na atuação econômica do Estado e em dispositivos regulatórios, e esperam que essas regulações venham a se subordinar a seus interesses.
Em suas manifestações de votos, os Ministros Luiz Barroso e Dias Toffoli não discrepam de tais entendimentos, sendo cirúrgicos em suas observações:
Para o ministro Toffoli, permitir o financiamento de campanhas por pessoas jurídicas é conceder a quem não tem direito a voto uma forma alternativa e mais eficaz de participar do processo eleitoral. Ao se manifestar no mesmo sentido, o ministro Roberto Barroso disse entender que “o atual sistema eleitoral não serve bem ao país”.
Na mesma seara o Ministro Marco Aurélio surpreende por exprimir a questão em termos mais duros e claros, ou seja, não há patrocínio desinteressado, essa participação permite que a RIQUEZA controle o processo eleitoral. Segue, em parte, abaixo o texto publicado no site do STF:
Para o ministro, não se pode acreditar no patrocínio desinteressado das pessoas jurídicas. “Ao contrário, deve-se evitar que a riqueza tenha o controle do processo eleitoral em detrimento dos valores constitucionais compartilhados pela sociedade”, afirmou. Segundo ele, a pretensão da ADI é indispensável para dar fim ao monopólio financeiro das empresas e grandes corporações sobre as eleições “e alcançar-se a equidade do processo eleitoral exigida pela Constituição”.
Finalmente, ainda temos a antecipação de voto do Ministro Ricardo Lewandowski, que faz a declaração mais impactante, por sua absoluta simplicidade e pela indicação acerca da absoluta corrupção do sistema eleitoral, que em sua sistemática, no atual formato conduz as seguintes consequências: “o financiamento de partidos e campanhas por empresas privadas, da forma autorizada pela legislação eleitoral, fere o equilíbrio dos pleitos que, em sua opinião, deveria ser regido pelo princípio de que a cada cidadão deve corresponder um voto, com igual peso e valor.”
De igual forma, segue transcrição do site do Supremo Tribunal Federal sobre o posicionamento do Ministro Lewandowski:
Ao votar pela procedência da ADI 4650, o ministro Ricardo Lewandowski argumentou que o financiamento de partidos e campanhas por empresas privadas, da forma autorizada pela legislação eleitoral, fere o equilíbrio dos pleitos que, em sua opinião, deveria ser regido pelo princípio de que a cada cidadão deve corresponder um voto, com igual peso e valor. “As doações milionárias feitas por empresas a políticos claramente desfiguram esse princípio multissecular, pois as pessoas comuns não têm como se contrapor ao poder econômico, visto que somente podem expressar sua vontade política por uma expressão pessoal, singularíssima, periodicamente depositada nas urnas em época de eleições”, observou. (Fonte: aqui).
*Link para o site de noticias do STF nos quais constam as referidas declarações
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=255811&caixaBusca=N
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=255918&caixaBusca=N
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=263981&caixaBusca=N
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Acontece que o ministro Gilmar Mendes entende que a matéria deve ser tratada não pelo STF, mas pelo Congresso, razão por que retém o processo, na expectativa, provavelmente, de que o Legislativo delibere sobre a reforma política. A posição do ministro, assim, prevalece sobre a da maioria dos ministros do STF, que antes de seu pedido de vista estabelecera o placar de 6 a 1 pela extinção do financiamento empresarial de campanhas, significando que os votos restantes, incluindo o do ministro Gilmar, não mais poderiam reverter a queda da modalidade de financiamento.
Na prática, é lícito dizer que o ministro Mendes simplesmente 'revogou' a decisão do STF.
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