quarta-feira, 11 de novembro de 2015

BREVE ABORDAGEM HISTÓRICA: QUANDO REINOU O ESTILO JK


A revolta de Jacareacanga e os anos dourados de JK

Por André Araújo

A crise que levou Getúlio ao suicídio em 24 de agosto de 1954 foi a culminância de um conflito ideológico entre grupos políticos que desde a primeira queda de Getúlio, em outubro de 1945, lutavam pelo controle do Estado brasileiro. De um lado os herdeiros de Getúlio formados por seus ex-interventores nos Estados e parte do Exército, de outro a reação democrática, que via em Getúlio e seus herdeiros a encarnação do autoritarismo.

Projetado para a eleição de 1955, o conflito tinha de um lado a UDN, partido que congregava os anti-getulistas históricos com sua franja militar minoritária no Exército mas muito forte na Aeronáutica e na Marinha, e de outro lado os herdeiros do getulismo nos dois partidos criados por Getúlio, o PSD, que reunia os "coronéis", fazendeiros, industriais, dirigentes patronais, a grã-finagem do Rio, chefes de clãs políticos do Brasil ainda rural e os interventores getulistas,  os sindicatos operários no PTB, a ala nacionalista do Exército comandada pelo general Newton Estillac Leal. No centro uma larga faixa da população brasileira que apenas queria progesso e tranqulidade, ter emprego e casa própria, escola para os filhos e alguns direitos, a maior parte do Exército, o chamado grupo legalista, distante dos dois grupos ideológicos, congregados em torno do Marechal Odilo Denys e do ainda general Henrique Teixeira Lott.
Juscelino teve uma eleição difícil porque o clima político resultante da morte trágica de Vargas era pesado. A ala civil anti-getulista, representada por Carlos Lacerda e a ala militar representada pelos generais alinhados à direita que se formou na volta da FEB, mas especialmente pela Aeronáutica, protagonista dos acontecimentos que levaram ao suicídio de Getúlio, não aceitavam Juscelino como presidente eleito porque viam nele e no seu vice, João Goulart, uma continuidade do getulismo, visto por eles como uma central de corrupção. Lacerda esbravejava que Juscelino não podia ser candidato, se eleito não devia tomar posse, se empossado devia ser derrubado. O temor da direita era tal que Benedito Valadores, maior prócer político de Minas e do PSD, tentava fazer JK desistir da candidatura, por temor que ele tinha do Exército não aceitá-lo antes ou depois da eleição.
A posse de Juscelino foi garantida pelo grupo centrista do Exército na figura de seu nomeado Ministro da Guerra, General Lott, que tinha absoluto controle da hierarquia do Exército, era um super autoritário e de rígida disciplina.
Tomando posse em 15 de janeiro de 1956, Juscelino foi surpreendido por uma perigosa revolta de oficiais da Aeronáutica em 10 de fevereiro de 1956, portanto nem um mês depois da posse. Um grupo de oficiais chefiados pelo Major Haroldo Veloso e pelo Capitão José Lameirão, com liderança na Força, voou do Campo dos Afonsos no Rio para a Base Aérea de Jacareacanga no sul do Pará e de lá assumiu o controle das cidades de Santarém, Belterra, Cachimbo, Itaituba e Aragarças.
O Governo mandou um contingente da Aeronáutica ir prendê-los e não foi obedecido: havia uma situação de motim, a Revolta de Jacareacanga era apenas o estopim. Com firmeza e sem vacilações do Presidente, JK era autoritário e sabia comandar, (e) finalmente depois de 19 dias conseguiu-se debelar a revolta e os insubordinados foram presos.
Instalado um IPM (inquérito policial-militar) do qual resultariam fatalmente longas penas de prisões - motim é crime gravíssimo em qualquer Força -, Juscelino surpreendeu o País ao enviar lei ao Congresso anistiando os revoltosos. Não era por razão de fraqueza, mas, ao contrário, de poder. Juscelino controlou a revolta e podia agora ser magnânimo, mas por quê?
JK era um estadista e tinha visão de Estado, de País e de futuro. Tinha um vasto plano de desenvolvimento com 30 metas audaciosas e uma meta síntese, a construção da nova capital. Um processo contra militares iria envenenar o ambiente político, a tendência da mídia era fazer os revoltoso virarem heróis, as forças da direita iriam usar os presos como símbolo.
JK era muito mais perspicaz do que seus inimigos. A anistia e soltura humilhou os revoltosos, como se o Governo desprezasse a revolta como coisa menor. Deu certo, Juscelino foi visto logo depois como magnânimo ao perdoar seus inimigos demonstrando que estava tão senhor da situação que não temia ataques contra seu poder.
Abstraindo seu formidável plano de desenvolvimento, o que ressalta em Juscelino é o exercício pleno do poder, autoritário sem hesitação ao combater, depois era generoso. Em outros episódios demonstrou não ter medo de nada. Ameaçado por Lacerda em um pronunciamento na TV Tupi que, segundo Lacerda anunciava, iria derrubá-lo do poder, Juscelino mandou o Ministro da Justiça, Armando Falcão, que não tinha medo de assombração, ir à emissora e lacrar por três dias os transmissores, com base no Código de Telecomunicações que permitia ação do Governo em caso de ameaça de perturbação da ordem pública por uma emissora. Não teve medo de Lacerda, da UDN ou de Assis Chateaubriand, dono da emissora e mais poderoso do que foi depois Roberto Marinho.
Os anos dourados de JK só foram possíveis porque ele acreditava que sem criar um clima de otimismo, de crença no futuro jamais seus planos de desenvolvimento poderiam dar certo; um clima de inquéritos, processos, prisões e perseguições iria envenenar o ambiente e desviar o foco do País de seu objetivo mais nobre e de desafios mais importantes.
Esse foi o grande erro de Jânio Quadros, seu sucessor, eleito com esmagadora maioria: quando todos esperavam um novo ciclo de realizações, Jânio começa seu Governo com inquéritos, punições e processos, gerando um clima ruim, pesado, pessimista; não podia dar certo e não deu, o morcego e o corvo juntos criaram nuvens sulfurosas contaminando o País.
JK sempre soube que sem um clima de otimismo nenhum líder puxa o entusiasmo do povo para um caminho de união nacional em torno de um objetivo claro, o cheiro de enxofre que vem de cruzadas justiceiras envenena o ambiente e mata qualquer visão de progresso e crescimento; a única finalidade da História é nos dar lições mas poucos aprendem. (Fonte: aqui).

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