sexta-feira, 20 de novembro de 2015

A ORIGEM DO ESTADO ISLÂMICO


A primavera gerou o ISIS

Por André Araújo

Os velhos colonialistas franco-britânicos do Acordo Sykes Picot, Sir Mark Sykes e Georges Picot,  nunca tiveram ilusões quanto ao Oriente Médio. Uma vasta civilização baseada na religião, na etnia e nos clãs. Os caminhos da sobrevivência por todo o Oriente (e se quiser por toda a Ásia) não têm nada a ver com a cultura greco-latina e com o iluminismo que antecedem e lastreiam o conceito de democracia moderna. Absolutamente nada.
Em territórios onde um clã ou seita tem como maior objetivo matar o clã ou seita vizinha, aparece um ditador que impede que um mate o outro, isso é o máximo que se pode esperar. Saddam era terrível, mas sob seu regime sunitas governavam mas era permitido aos xiitas e aos curdos viverem se ficassem quietos. Enquanto isso o Iraque era um Estado uno e definido, relativamente organizado e com projeto de desenvolvimento e educação que ao longo do tempo frutificaria.

Muhamar Kaddafi reuniu três regiões que, por milênios, eram de clãs antagônicos, e transformou em um Estado conhecido como Líbia, que já tinha existência  no tempo dos romanos, depois como colônia da Itália moderna e por alguns anos como um reinado anárquico sob um rei inexpressivo (Idri I). Os próprios italianos, que fizeram da Líbia uma colônia em 1911, arrancada dos turcos, não a governavam como um território uno e sim em três províncias. Kaddafi construiu um Estado. Era um monstro, mas esse Estado era definido e ele impedia que a Cirenaica liquidasse com a Tripolitania e que uma tribo não passasse pela espada o pescoço da outra; enquanto isso, desenvolvia um plano de modernização e de educação.

A ideia absurda que veio junto com a segunda invasão do Iraque, de que lá seria possível implantar uma democracia de estilo ocidental, deu em um imenso fracasso; não havia base alguma para esse projeto.

Terceira tentativa foi deslanchada no Egito, o que acabou jogando novamente o reino dos faraós na mão dos militares, verdadeiro poder de fato desde a deposição do Rei Farouk em 1952. Uma falsa primavera que não podia dar em nada.

Quarta e trágica tentativa, na Síria: ao se tentar desestabilizar e derrubar um ditador moderado (pelos padrões da região), de educação britânica e casado com uma vice presidente do Banco J.P.Morgan, gerou-se  a (destruição) do País e a maior onda de refugiados do pós Segunda Guerra. O projeto de derrubar Assad foi um desastre total que está alterando a geopolítica regional e por desdobramento o próprio sistema mundial de pesos e contrapesos, abrindo espaço para protagonismo da nova Rússia, algo que terá implicações a longo prazo, graças à estupidez da diplomacia americana na região.

O mais complicado subproduto da cegueira da política externa dos EUA foi o desmonte institucional do Iraque a que se seguiu à invasão de 2003. Se Saddam era insustentável, a primeira coisa a fazer era um acordo com o Exército, uma força de 450.000 homens, cujo Alto Comando também estava farto de Saddam. O primeiro governador americano, Paul Brunner, não teve a inspiração de manter no lugar o Exército e a Polícia, preferiu dissolver as duas corporações. Dessa dissolução nasceu o atual Estado Islâmico, composto basicamente por sunitas que eram militares ou policiais de Saddam.

O principismo da política externa americana quando ataca é arrasador. É uma miopia absoluta, sem o refinamento cultural dos franceses e ingleses, que sabiam lidar com as lideranças locais, com todas as suas diferenças. Os ingleses governaram a Índia (que incluía o Paquistão e o Bangladesh de hoje) com quatro regimentos, o resto era feito por acordos políticos; quando os britânicos jogavam um marajá contra o outro, empregavam soldados Gurkas e Siks como mercenários contra os demais indianos. Era um poder baseado na inteligência, na astúcia e na negociação.

Os americanos não sabem ter esse manejo fino. Desmontaram o Iraque e hoje não sabem remontá-lo, no processo criaram o ISIS.  Porque os americanos implicaram com Bashar al Assad? Porque Assad é aliado do Irã e o Irã é o maior inimigo de Israel. Com base nisso, para agradar Israel é preciso combater Assad, no processo implodiram a Síria e Assad continua no palácio presidencial em Damasco, o Irã continua seu aliado e agora precisa ser convocado para ajudar a apagar o incêndio. Os iranianos são xiitas, o ISIS é sunita e isso pode cimentar uma aliança Rússia-EUA-Irã, algo absurdo há apenas um ano atrás, mas essa é a constante do xadrez do poder mundial, o inimigo de ontem pode ser o aliado de hoje.

Foi-se o tempo dos grandes estrategistas e diplomatas americanos, com visão ampla de processos históricos, homens como George Keenan, Dean Acheson, John Mc Cloy, Averrel Harriman, Edward Stettinius,  Cordell Hull, George Marshall, Dwight Eisenhower, John Foster Dulles. Hoje é uma mediocridade impressionante, burocratas mais ativistas de movimentos liberais, cheio de princípios e ideias de reformar o mundo sem noção da crua realidade histórica.

O Estado Islâmico é subproduto de todos esses erros e sua extirpação vai custar muito caro, será obra de profissionais.


Acima , porta aviões atravessando o Canal de Suez. (Fonte: aqui).

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A propósito, Noam Chomsky, professor estadunidense de linguística e filosofia no MIT (Massachusetts Institute of Technology, EUA), declara em vídeo - AQUI - que "Invasão do Iraque pelos EUA é a raiz do terrorismo".

Enquanto isso, a Câmara de Deputados dos Estados Unidos aprova projeto de lei que dificulta entrada de refugiados no país... - aqui

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