'O Fole Roncou' mapeia caminhos do forró ao historiar vozes do gênero
Por Mauro Ferreira
O nome do baiano Pedro Almeida e Silva quase
nunca é associado à história da música nordestina nos registros oficiais sobre o
forró. Mas Pedro Sertanejo - como passou a ser chamado desde que em 1956 gravou
seus primeiros discos (de 78 rotações por minuto) para a extinta gravadora
Copacabana - é figura importante na história do gênero. Não tanto como
sanfoneiro, mas por ter aberto em São Paulo (SP), em 1961, o Forró do Pedro
Sertanejo, casa de shows que reforçou o elo natural entre o povo e os artistas
nordestinos que migraram para o Sudeste em ônibus ou mesmo num já lendário
pau-de-arara em busca de emprego, sorte e oportunidade.
A real importância de
Pedro Sertanejo na história da música nordestina está corretamente dimensionada
no livro O Fole Roncou! - Uma História
do Forró, escrito pelos jornalistas
paraibanos Carlos Marcelo e Rosualdo Rodrigues. O livro mapeia os (des)caminhos
do forró ao contar a trajetória de vozes que propagaram a música nordestina -
sejam como cantores, produtores de discos ou empresários. O eixo é a vida e
obra de Luiz Gonzaga (1912 - 1989), pilar mais forte do gênero, personagem
fundamental tanto como cantor - por ser a voz que lançava e avalizava
compositores que chegavam do Nordeste sem saber que rumo tomar - quanto como
conselheiro de colegas intérpretes ainda atordoados com o cotidiano e os códigos
de metrópoles como Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP).
Mas o livro - escrito
em narrativa fluente e meio romanceada que peca somente por reproduzir diálogos
que certamente não aconteceram tal como descritos pelos autores - dá voz a
personagens pouco ou nada ouvidos nos registros oficiais. Casos do produtor
fonográfico José Abdias de Farias - fundamental para o investimento da gravadora
CBS em discos de forró nas décadas de 60 e 70 - e do cantor e compositor
paraibano Sebastião Xavier de Souza, o Biliu, lançado como compositor por Abdias
na década de 80, quando o produtor (já em fase de decadência profissional)
trabalhava na extinta Copacabana, gravadora que propagou em escala nacional nos
anos 70 a voz vivaz e os temas de duplos e maliciosos sentidos de
Genival Lacerda, outro personagem recorrente nas 472 páginas do livro. Vem de
Biliu, aliás, a definição que delimita na página 439 o significado do genérico
termo forró. "Esse negócio de que a palavra forró veio de for all é frescura. Vem de forrobodó, forrobodança... Significa festa, fuzarca, pagode... Forró é um local onde se canta tudo. Forró é tudo. Não é ritmo, nunca foi", sentencia Biliu, com autoridade e razão.
Escrito
a partir da feitura de mais de 80 entrevistas, O Fole Roncou! - Uma História do Forró também relata os fatores sociais que
impulsionaram a migração nordestina para o eixo Rio-SP e, por consequência,
acabaram dando visibilidade ao forró além das fronteiras nordestinas. Os autores
cruzam as histórias de personagens como os paraibanos Antonio Barros (compositor
de numerosos sucessos do gênero) e Jackson do Pandeiro (1919 - 1982), outro
pilar da musical Nação Nordestina. De alma paraibana, a pernambucana Marinês -
nome artístico de Inês Caetano de Oliveira (1935 -2007), a eterna Rainha do Xaxado - também é personagem de
grande presença na narrativa, dimensionada na medida de sua importância para a
música nordestina. Já a paraibana Elba Ramalho - embora citada várias vezes
quando o livro aborda a nova corrente migratória que deslocou artistas
nordestinos (Alceu Valença, Fagner, Zé Ramalho) para o eixo Rio-SP nos anos 70 -
poderia ter tido sua trajetória contada com mais detalhes por ter sido a grande
propagadora da música nordestina em escala nacional nos anos 80.
Em
contrapartida, os autores acertam ao mostrar como se criou a indústria do forró
eletrônico a partir da iniciativa do empresário cearense Emanoel Gurgel, cujo
faro comercial detectou a demanda popular por um forró mais pop e mais diluído.
Ao fabricar a banda Mastruz com Leite, Gurgel criou império que, mesmo sem ter
hoje a solidez dos anos 90, gerou dezenas de bandas genéricas e redesenhou a
história da música nordestina, mesmo sob os ataques (desferidos no livro por
personagens como o cantor cearense Alcymar Monteiro) de vozes defensoras de um
forró com pegada mais tradicional. Opiniões e interesses à parte, o
livro O Fole Roncou! - Uma História
do Forró é trabalho de fôlego. Livro
arretado e crucial para entender a criação e a evolução de parte importante (e
subestimada) da música brasileira. (Fonte: aqui).
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