.
"Alternando momentos de bebedeira e delírios artísticos, Malu tem saudade de um passado, especialmente do pensamento crítico de uma geração que sonhou em mudar o país, mas acabou cerceada pela ditadura militar."
Malu, o primeiro longa-metragem do diretor Pedro Freire, não poderia ter sido mais bem-sucedido no último Festival do Rio, onde levou os prêmios de melhor filme, melhor roteiro, melhor atriz e melhor atriz coadjuvante. Desde então, vem enchendo as salas por onde passa. O filme é um caso raro de consenso entre crítica e público, e merece a atenção que vem recebendo.
O longa conta a história de Malu Rocha, uma atriz brasileira que viveu o auge de sua carreira no teatro, no cinema e na tevê durante os anos 1970 e 1980, e depois foi morar com a mãe num subúrbio do Rio. Freire retrata a fase do ocaso profissional da atriz, que coincide com o período em que passou a manifestar os primeiros sintomas de uma doença degenerativa que lhe atacou o sistema nervoso – o mal de príon (ela faleceu em 2013, e seu corpo foi velado no Teatro Oficina).
O que torna o filme peculiar é o fato de que Malu Rocha (vivida na tela por Yara de Novaes, numa atuação impecável) é a mãe do diretor Pedro Freire. Com fortes elementos autobiográficos, a história é uma versão ficcional do que ele viveu durante a adolescência enquanto via a mãe se esvair entre planos irrealizáveis, acessos de raiva e momentos de pura doçura. Alternando momentos de bebedeira e delírios artísticos, Malu tem saudade de um passado, especialmente do pensamento crítico de uma geração que sonhou em mudar o país, mas acabou cerceada pela ditadura militar.
A história se passa no interior da casa onde Malu morou com sua mãe – interpretada pela excelente Juliana Carneiro da Cunha – e sua filha, uma jovem aspirante a atriz, vivida pela ótima Carol Duarte. As três vivem numa ciranda de amor e caos, num ambiente de precariedade material e deterioração dos afetos, que vão se esgarçando ao limite. A tensão narrativa paira no ar, enquanto sentimos a atmosfera de uma casa em ruínas.
O filme é uma declaração de amor e pesar do diretor à sua mãe, uma mulher tão fascinante quanto incômoda, que provoca sentimentos de compaixão e repulsa. O resultado é a homenagem do filho maduro que soube transformar em arte a experiência de ter vivido sob o impacto da loucura. - (Revista Piauí - Dicas).
Nenhum comentário:
Postar um comentário