"Vergonhoso e criminoso o texto “Racismo de negros contra brancos ganha força com identitarismo”, publicado na Folha de São Paulo de hoje (16/01/22). O artigo de Antonio Risério promove um ataque ao movimento negro e utiliza de narrativas de supremacistas brancos para construir a tese do "racismo reverso".
Segundo o autor, o movimento negro promove um “neoracismo” identitário contra asiáticos, brancos e judeus. A tese é fantasiosa: não existe racismo reverso, na medida em que nunca houve escravidão reversa, genocídio da população branca ou imposição da cultura e da religião dos povos africanos e indígenas ao homem branco.
Risério chega a afirmar que “não devemos fazer vistas grossas ao racismo negro” e que negros contam com "instrumentos de poder para institucionalizar o seu racismo". Só não explica quais seriam esses instrumentos em um Brasil que continua a apresentar crescimento de 14% no encarceramento em massa de negros, enquanto diminui em 19% o número de brancos, segundo o Anuário de Segurança Pública de 2019; em que negros são 78% entre os mais pobres no país, segundo IBGE; em que recebemos, em média, 17% a menos do que brancos com as mesmas origens sociais, de acordo com o estudo da PUC-RS; e em que brancos recebem 68% a mais que os negros em geral. Em qual Brasil Antonio Risério vive? Não existe o "racismo preto antibranco" que ele afirma com tanto afinco! Existe a luta dos movimentos negros por igualdade material e pelo respeito às diferenças.
O jornal e o autor -- um homem branco irrelevante -- utilizam-se dos corpos pretos, das nossas histórias e das nossas formas de luta para construírem engajamento, cliques e receita. Em nome do lucro, o racismo é legitimado no jornal de maior circulação nacional. E o pior: não é a primeira vez que isso ocorre naquele espaço. Se não mudarmos nossa postura, certamente não será a última. Apenas a título de exemplo, o mesmo autor já escreveu que Abdias do Nascimento e Kabengele Munanga, dois dos maiores intelectuais pretos que esse país já produziu, seriam “delirantes”. E o jornal não hesitou em publicar.
Esse comportamento da Folha não é pontual: há poucos meses, em 29/09/2021, o jornal publicou a coluna racista de Leandro Narloch, intitulada “Luxo e riqueza das 'sinhás pretas' precisam inspirar o movimento negro”, gerando uma enxurrada de críticas e o incômodo das duas únicas pessoas negras que integravam seu conselho editorial. Como resultado, uma delas se desligou do conselho: a filósofa Sueli Carneiro. O advogado Thiago Amparo, que permaneceu no espaço, declarou seu descontentamento com o jornal ao publicar um texto racista em suas páginas. Já o veículo sequer ficou constrangido com o escândalo criminoso.
Basta! Em nome de um suposto pluralismo, a Folha promove o racismo -- enquanto for lucrativo -- dando palco à Casa Grande. Chega! Nossos corpos não estão à disposição dos interesses da branquitude e do capital. Nossa luta não está à venda!
O ano de 2022 será estratégico para o movimento negro. Temos a tarefa de tirar um presidente fascista, genocida e racista do Palácio do Planalto. Ao mesmo tempo, temos que defender a continuidade da política de cotas nas universidades públicas, que vai ser rediscutida no Congresso Nacional. Não há mais tempo para tolerar o racismo. Não há espaço para dar vez e voz aos que lucram com a desigualdade racial. É hora de nos aquilombarmos e exigirmos uma resposta: ou a Folha se retrata e toma providências concretas ou nós -- pretos, pretas e aliados da luta antirracista -- boicotamos seu conteúdo."
(De Thaíse Pacheco, texto intitulado "O racismo da Folha exige retratação ou boicote", publicado no site Brasil 247 - Aqui.
Thaíse Pacheco é Militante do Movimento de Moradia, Pedagoga e Mestranda em Educação na USP. Concluiu o Ensino Médio através do EJA - a Educação de Jovens e Adultos - e chegou à Faculdade através do ProUni. Atualmente, é Coordenadora Pedagógica do Instituto Direito e Periferia. Nas redes, pode ser encontrada no @thaisedaquebrada.
Cumpre aguardar os desdobramentos).
Nenhum comentário:
Postar um comentário