terça-feira, 21 de julho de 2020

PRÓXIMOS ANOS SERÃO CRUCIAIS PARA A DEMOCRACIA, DIZ CHICO BUARQUE A METALÚRGICOS DO ABC

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Sindicato faz “live” na véspera da posse. Lula enfatiza papel histórico da entidade para pensar em novo modelo econômico. E atual presidente afirma que a desigualdade é o principal problema brasileiro 

                             Chico Buarque / Lula / Wagnão: defesa da democracia  
                             e do combate às desigualdades no país

Por Vitor Nuzzi

“Os próximos três anos serão cruciais para a nossa democracia”, afirmou o cantor e compositor Chico Buarque, em mensagem de saudação à nova direção do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. A entidade organizou uma live neste sábado (18), véspera da posse formal. Também encaminharam vídeos o compositor Gilberto Gil e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que comandou o sindicato de 1975 a 1981. Mas ele lembrou que sua primeira posse, ainda como diretor, foi em 1969.
Chico tem ligações com os metalúrgicos do ABC. No início dos anos 1980, ele compôs Linha de Montagem, para a trilha sonora do documentário de Renato Tapajós. O filme, exibido pela primeira vez no próprio sindicato – e quase apreendido pela Polícia Federal – narra as origens das greves operárias na região e o enfrentamento com patrões e ditadura (que se confundiam).
O também compositor e cantor Gilberto Gil lembrou que este é um momento, em todo o mundo, contrário à organização sindical. “Na contramão de um esforço que vem desde os primeiros heroicos sindicalistas americanos, que chegou até o trabalho extraordinário que os metalúrgicos fizeram no ABC, estabelecendo um novo momento das relações trabalhistas no país”, disse Gil. Ele desejou que se inicie um novo período de fortalecimento da atividade sindical.

Eleição virtual

No total, são 193 diretores, eleitos em comitês sindicais em 55 fábricas, além do comitê dos aposentados. O segundo turno foi realizado também de forma virtual, devido à pandemia. O atual presidente, Wagner Santana, o Wagnão, trabalhador da Volkswagen, foi reeleito para os próximos três anos. Vários ex-presidentes do sindicato participaram da live. Wagnão lembrou que é o 13º presidente da entidade, criada em 1959.
“Devo muitas coisas ao sindicato e à categoria metalúrgica do ABC”, disse Lula, lembrando da data de sua primeira posse, 24 de abril de 1969, como diretor de base na Villares. Para ele, Wagnão assume naquele que será, talvez, o pior momento da economia “desde o descobrimento do Brasil”. Será preciso pensar em como será o mundo do trabalho pós pandemia. “Vamos ter de pensar muito. Existe outro modelo econômico, outra forma de governar o país. O povo não é problema, o povo será sempre a solução. O Brasil não é do Bolsonaro, é de 210 milhões de seres humanos.”
A mensagem do ex-presidente se concentrou também no atual governo. “Gostaria de ter palavras só de esperança, mas não é possível. É difícil falar de esperança quando você tem quase 77 mil mortes, mais de 2 milhões de infectados, e quando você tem um presidente que age com total irresponsabilidade no tratamento e no cuidado com a vida.” Para Lula, seria possível salvar pelo menos metade das vítimas “se tivéssemos um presidente que não tratasse o ser humano como algoritmo, se respeitasse os cientistas”.

Papel histórico

Ele afirmou ainda que o auxílio emergencial só saiu pela mobilização social e pelo esforço da oposição. “O presidente queria dar só 200, o PT queria que fosse um salário mínimo e no Congresso nós conseguimos chegar a 600 reais.”
Ao falar do “momento delicado” do país, Lula lembrou que o governo tem poder (e deveria) emitir dinheiro novo para sustentar a economia. E destacou o papel histórico dos metalúrgicos, afirmando que desde 1978 – “Quando fizemos a primeira greve, na Scania” – o sindicato tem papel determinante nas conquistas e na democracia.
Wagnão homenageou seus antecessores, citando particularmente a Ford, que encerrou atividades em São Bernardo do Campo no ano passado. Alguns presidentes do sindicato saíram de lá, como Jair Meneguelli, sucessor de Lula e que depois se tornaria o primeiro presidente da CUT, e, mais recentemente, Rafael Marques, que antecedeu Wagnão.

Crise e golpe

O presidente reeleito lembrou que, ao final do governo Lula, a categoria somava 109 mil trabalhadores na base, ante os atuais 64,6 mil. Observou que a crise não é de hoje, mas acrescentou que o governo tentará usar a pandemia como justificativa para sua incompetência em lidar com a situação. Em 2016, avalia, a crise foi “potencializada” para viabilizar “o golpe na Dilma”, referência ao impeachment da presidenta Dilma Rousseff.
O desafio é manter os empregos e recuperar potencial econômico da região do ABC. “O que nós assistimos nos últimos anos foi a destruição das políticas regionais que tanto defendemos”, afirmou. Ele citou as tentativas de “destruição” do Consórcio Intermunicipal, que reúne as sete cidades do ABC.
Além disso, é preciso considerar o trabalhador em todas as suas dimensões, inclusive como cidadão. “Quase metade da nossa categoria não tem plano médico, depende do SUS”, disse Wagnão. Ele também enfatizou a “característica solidária” da categoria, que décadas atrás doava dinheiro para cisternas e coletava alimentos para o Nordeste, e agora se mobiliza para ajudar moradores de rua no período da pandemia.

Combate à desigualdade

A desigualdade, enfatizou Wagnão, é o principal problema brasileiro. “A covid não segrega. A desigualdade social gerada pelo ser humano, sim.” Segundo ele, dois terços das pessoas que morrem em consequência da covid-19 ganham até três salários mínimos. O sindicalista também criticou a política de acesso ao crédito durante a crise, afirmando que “80% das empresas que procuram as linhas de crédito que foram anunciadas pelo governo federal não conseguem”.
Assim como Lula, ele afirmou que o governo deve emitir “dinheiro novo” neste momento de crise econômica profunda. “O que move a economia é crédito e consumo.” Segundo o dirigente, existe um “debate ideológico sobre o papel do Estado” no Brasil, onde muitas vezes se quer deixar a solução dos problemas para o “rei” mercado. “O que não podemos admitir é que 1% da população tenha 50% das riquezas e 70% do patrimônio.”
O atual presidente da CUT, Sérgio Nobre, funcionário da Mercedes-Benz, e o ex-prefeito de São Bernardo Luiz Marinho (que também presidiu o sindicato e a central) defenderam a mudança de governo. “Não há possibilidade de falar em recuperação da economia, do emprego, sob o governo Bolsonaro”, acentuou Marinho.
Os presidentes do PT, Gleisi Hoffmann, e do Psol, Juliano Medeiros, também encaminharam saudações, entre outras lideranças. Além deles, mandaram mensagem o ex-ministro Fernando Haddad, o presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Iago Montalvão, o líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) João Paulo Rodrigues, o escritor Frei Betto e o padre Júlio Lancellotti.  -  (Rede Brasil Atual - Aqui).

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