segunda-feira, 10 de outubro de 2016

SOBRE A CAMPANHA PELA PEC 241


Campanha pela PEC do teto usa dados errados

Por Paulo Moreira Leite

O esforço para ajudar a dupla Michel Temer-Henrique Meirelles a aprovar a PEC 241, que congela gastos públicos por 20 anos, atingiu o nível de um massacre, destinado a desqualificar a crítica e as possíveis vozes contrárias. A base de sua argumentação é que o Estado brasileiro assiste a uma explosão da dívida pública, que teria atingido níveis apocalípticos.
 
O problema é que se trata de uma noção errada, apoiada em dados tecnicamente falsos, que se destinam a lubrificar a aprovação de uma medida que só interessa ao capital financeiro e grandes rentistas.

"Teto de gastos é  remédio indispensável," diz o título de um anúncio de quatro páginas publicado nos jornais (...). "O Brasil tem jeito", repete a FIESP, procurando assumir um tom paternal, no final da propaganda.

Em artigo assinado, o banqueiro Roberto Setúbal, presidente do Itaú, afirma: "A dívida pública acelerou e ultrapassou 70% do PIB, acima da média de 50% de outros países emergentes."

Para colocar dados reais numa discussão que não pode realizada de forma irresponsável, pois a aprovação da PEC irá gerar consequências particularmente nocivas ao país, lembro aqui trechos de um texto publicado neste mesmo espaço, em 19 de setembro, com o título: "Com medo do debate, governo apressar PEC de Meirelles." Ali se informa que o núcleo da argumentação a favor da PEC, que denuncia um endividamento de 70%, está longe de corresponder à realidade.

Acho de grande utilidade para alimentar um debate produtivo e bem informado. Vamos lá
 
"Quem se der ao trabalho de ler um artigo de  Felipe Rezende  (Valor Econômico ,15/9/2016, página A 11)  irá encontrar uma argumentação demolidora contra a PEC 241/16. Professor assistente de Economia em Genebra, a base técnica de Rezende é irrespondível.

Para começar, ele vai direto ao ponto: o volume da dívida bruta em relação ao PIB. Mostra que se os números de 2016 são altos – a proporção é de 69,5% do PIB – ainda são bastante confortáveis quando se compara com 2002, quando representavam nada menos do que 76% da riqueza bruta do país e ninguém achou necessário falar numa ditadura fiscal prolongada.

Sem fazer associações políticas com os governos de plantão em cada época, que seriam inteiramente desfavoráveis à gestão de FHC, Rezende discute o que interessa hoje, que é a tentativa de criar uma situação de alarme apocalíptico. Fala de "críticos (que) pregam de forma genérica e arbitrária que a elevação recente da dívida pública levaria ao calote ou a uma aceleração inflacionária."  

Nada disso, explica o professor, que faz uma lição de casa indispensável. Estudando a origem do aumento da divida, demonstra que o plano Meirelles tem como base uma confusão imperdoável entre economia real e contabilidade formal. Lembra que a dívida cresceu num período em que a transferência de títulos públicos para bancos federais atingiu 9,3%, uma operação de impacto real nulo sobre as obrigações do governo. Foi uma troca de papéis e não uma transferência de riqueza. Explica: "embora contabilmente essas operações tenham ampliado a dívida bruta, o impacto na dívida líquida foi neutro -- já que esta subtrai os ativos financeiros das obrigações do governo." A conclusão do professor merece manchetes garrafais:

– Assim, escreve, a dívida líquida do setor público permanece nos menores níveis históricos. Por exemplo: em julho de 2016 era de 42,4% do PIB, enquanto em janeiro de 2002 correspondia a 52,3% do PIB.

É isso aí, meus amigos. Os anos de gastança de Lula e Dilma, que produziram a mais ampla distribuição de renda da história recente de nosso capitalismo, foram mais austeros do que o período FHC.

Depondo no Senado em defesa da gestão financeira do governo Dilma, o professor Luiz Gonzaga Belluzzo disse que quem criticava a presidente por ter realizado uma gestão temerária das finanças públicas não sabia do que estava falando. "Em minha opinião ela errou por ter sido responsável demais", disse Belluzzo.

Os números de Felipe Rezende lhe dão razão. Se é tarde para reverter a deposição criminosa de uma presidente, ajudam a entender a necessidade de rejeitar um programa de impor uma recessão de 20 anos ao país. (Aqui).

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Sem contar que a referida PEC, caso aprovada nos moldes propostos, implicará - além do congelamento dos montantes anuais destinados a saúde, educação e investimentos públicos - o engessamento, pelos próximos 20 anos, da política orçamentária de futuros governos, o que a torna  flagrantemente inconstitucional.

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