Não, não sou diabética. Tampouco sou gorda. Estou com um leve sobrepeso, e toda a sociedade me diz em uníssono: você fracassou.
Andréia Sadi, apresentadora da GloboNews, que posta fotos do corpo e da “evolução” há quatro anos, sente, certamente, que não fracassou ao exibir o corpo extremamente magro.
A ditadura da magreza ganhou uma força amedrontadora no neoliberalismo: a influenciadora já correu 7 km hoje, e são 6 da manhã. Qual é a sua desculpa?
Na sociedade das academias de ginástica, a responsabilidade é sua se não obedecer exatamente ao padrão de beleza estabelecido, como se você tivesse o tempo e a vida de uma influenciadora.
Spoiler: não tem como obedecer a esse padrão se você não for uma delas.
Penso na ditadura da magreza e na minha barriga furada de Ozempic, e faço essa confissão envergonhada: todas nós fomos transformadas pelo neoliberalismo em fanáticas pela beleza — que significa, muito frequentemente, a magreza.
Andréia Sadi vai além: não basta obedecer à ditadura da magreza, é preciso dizer a outras mulheres, às vezes com palavras, às vezes com fotos de uma magreza absoluta, que não ser magra é fracassar.
Ela se expõe além da conta por likes e dinheiro e destaca que o emagrecimento “não foi da noite pro dia” para atribuir ainda mais mérito ao seu feito. Mas eu aposto que ela também fura a barriga com agulha de insulina, como todas as famosas que emagreceram recentemente fizeram.
E é por causa de gente como Andréia que gente como eu — uma trabalhadora CLT — corre atrás da magreza como se fosse um prêmio por bom comportamento.
O problema não é querer ser magra.
Querer ser magra é o efeito de uma sociedade doente, a sociedade dos influencers, onde absolutamente tudo é mérito ou demérito individual, e não fruto de uma forma de controle coordenada do corpo feminino.
O problema, então, é justamente esse: transformar a magreza em um medidor de sucesso ou fracasso de uma mulher, assim como eram o casamento e os filhos (e, em alguma medida, ainda são).
Não há diferença entre ambos: são igualmente ferramentas de controle social dos nossos corpos.
E isso é tão, mas tão profundo que eu, que sei de tudo isso, sigo e seguirei furando minha barriga com uma agulha de insulina para injetar remédio para emagrecer, porque não quero ter que suportar a sensação de fracasso a cada vez que me olho no espelho. Só confesso isso porque sei que muitas outras mulheres vivem exatamente a mesma coisa.
O “ser magra a qualquer custo” custa muito. Custa o nosso tempo, o nosso dinheiro, a nossa saúde física e mental.
Em “A Religião da Magreza”, Michelle Lelwica nos revela algo que, para mim, não é nada surpreendente, porquanto claramente observável: para muitas mulheres, emagrecer não é só um objetivo, mas quase uma questão de fé.
Michelle constata que a obsessão pelo corpo magro se tornou uma espécie de crença sagrada, com seus rituais (dietas milagrosas), pecados (carboidratos) e promessas de salvação (o peso ideal).
Ser magra não é apenas uma questão estética, muito menos uma questão de saúde: é um objetivo de vida, uma chance de remissão de qualquer fracasso, uma prova de que, sim, você treinou enquanto eles dormiam e passou fome voluntariamente. Parabéns.
Andréia Sadi faz parte dessa sujeira e com ela colabora diretamente, porque, além de explorar o próprio corpo para uma exposição lógica e desnecessária nas redes sociais, posando de heroína dos gominhos na barriga, quer que outras mulheres acreditem que também podem. E, se não conseguirem, é porque não são capazes e não merecem ser vistas como mulheres bem-sucedidas.
Esse desserviço cria mais mulheres complexadas e, na maioria das vezes, adoecidas em suas tentativas de se encaixarem.
“Fico especialmente tocada quando me param, me escrevem que — de alguma forma — se sentem incentivadas a voltar a se cuidarem”, escreveu num textão no Instagram.
E isso é se cuidar? Sacrificar a própria saúde, autoestima e tempo de vida para exibir um corpo esquelético? Supor que se cuidar é necessariamente tornar-se magra é mais um aspecto cruel do discurso de Sadi.
Pior ainda se o discurso for direcionado às mães: a gestação transforma o corpo da mulher naturalmente, e atribuir a ela a responsabilidade de não “voltar ao seu corpo de antes” é, no mínimo, perverso — sobretudo em uma fase tão delicada como o puerpério.
Isso não ajuda mulheres, como ela tenta mostrar no Instagram. Muito pelo contrário, isso destrói mulheres.
O problema, a raiz de toda a questão, é colocar a magreza como objetivo e como prêmio, o pote de ouro no fim do arco-íris, aquilo que você pode alcançar se “se esforçar o suficiente” — e convencer as pessoas de que ter um corpo extremamente magro e uma cara de doente é a sua recompensa por passar fome e furar a sua barriga.
Gente como Andréia Sadi — e tantas outras Pugliesis da vida — não é vítima, mas agente direta de uma busca violenta por se enquadrar em um padrão que sequer faz sentido: ter cara de doente e desnutrida tá na moda (e não, não é lá que eu quero chegar).
Andréia, sua “evolução” tem cara de doença terminal. Seja honesta e diga isso às coitadas das suas seguidoras."
(De Nathalí Macedo, artigo sob o título acima, publicado no DCM Diário do Centro do Mundo - Aqui.
Deixem de especular sobre a Sadi, que, simpática - e magra, é fato -, se mantém uma das líderes da ala global que não dá folga ao Lula, sempre achando uma 'peinha' que seja para destacar negativamente o presidente!).
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