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De um ponto de vista da crítica mais convencional, não há como negar o apelo dramático do filme de Ali Abassi, todo ele pautado pela estética do tabloide e assentado nas ótimas interpretações de Sebastian Stan como Trump, Jeremy Strong como Roy e Maria Bakalova como Ivana.
Por Carlos Alberto Mattos (Titular do Carmattos)
Duas coisas me intrigam a respeito de O Aprendiz (The Apprentice), a pseudobiografia dos anos de ascensão de Donald Trump no mercado imobiliário, desde quando ele ainda podia ser chamado de Donnie Boy.
A primeira é o fato de ter sido lançado nos EUA em fins de setembro último, a pouco mais de um mês das eleições presidenciais que exatamente hoje (5/11) decidem o futuro próximo daquele país e, de certa forma, do mundo. Embora se saiba que o projeto vinha sendo gestado há cinco anos, essa estreia adquire inevitavelmente um viés político. Aqui cabe refletir sobre o que a imagem de Trump no filme pode influenciar a votação.
À primeira vista, o retrato não é favorável. Trump é visto aprendendo a ser um “matador” com o célebre advogado Roy Cohn (1927-1986), arauto do macarthismo e uma espécie de coach da direita cínica. À medida que vai se livrando dos raros pruridos éticos, Trump aparece corrompendo, chantageando, desprezando e estuprando a mulher Ivana, sendo impiedoso com o irmão fracassado e com seu guru quando decadente, além de submetido a cirurgias estéticas repulsivas. “Somos todos animais” é uma de suas máximas mais suaves.
No entanto, embutido em todo esse perfil vilanesco existe um elogio subjacente ao empreendedorismo selvagem – associado numa sequência ao prazer sexual – e à imposição de uma personalidade forte no cenário da vida estadunidense. Parece-me evidente que essas supostas qualidades podem soar como música aos ouvidos de parte do eleitorado já contaminado pela ideologia da ultradireita. Nesse sentido, O Aprendiz é, no mínimo, ambivalente.
Outro ponto que me dá o que pensar é a liberdade com que o cinema se permite apresentar os podres de uma figura tão poderosa quanto Donald Trump. Já se falou que O Aprendiz apenas reencena uma série de sátiras e memes conhecidos. Tudo bem, mas é claro que, ao passarem das redes sociais para o cinema mainstream, essas representações ganham outro status, razão pela qual houve queixas da campanha de Trump em relação ao filme. Resta saber até onde essas queixas eram sinceras ou puro teatro, uma vez que, no balanço final, O Aprendiz poderia vir a ser tão danoso quando benéfico à candidatura de Trump.
Por fim, de um ponto de vista da crítica mais convencional, não há como negar o apelo dramático do filme de Ali Abbasi (Border, Holy Spider), todo ele pautado pela estética do tabloide e assentado nas ótimas interpretações de Sebastian Stan como Trump, Jeremy Strong como Roy e Maria Bakalova como Ivana. A despeito de sua fundamental dubiedade, O Aprendiz é um entretenimento engenhoso. - (Aqui).
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Trump venceu de cabo a rabo. Quaisquer discussões - que refujam aos valores atuais da sociedade americana, incluindo, p. ex., as verbas já despendidas em face da Ucrânia em detrimento do chamado 'way of life' - soam irrelevantes.
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