A maior tragédia grega
Por Arnóbio Rocha
Diante dos últimos embates entre a Troika (FMI, UE e BCE) contra o Povo Grego, o corajoso governo de Alexis Tsipras, da Syriza, coalizão de Esquerda, resolveu desafiar as imposições convocando um plebiscito que pode definir a saída da Grécia da Zona do Euro, criando um impasse sem precedente na UE, o default geral e a não aceitação de mais ajustes.
Dois anos atrás, publiquei o livro Crise 2.o: Taxa de Lucro Reloaded, em que parte do Capítulo V (o Lado B da UE) tratava justamente da questão grega. O fato novo: a eleição de Alexis Tsipras para primeiro-ministro, com a plataforma de ser contra a política de Austeridade, imposta pela Troika e os ajustes criminosos, e agora o confronto final desenhado. Pouco teria acrescentar ao texto abaixo.
A tragédia grega
Acompanhamos neste último ano o desenrolar dos acontecimentos da Crise Mundial, em particular na Europa, e nesta com especial carinho, o destino grego. As tragédias se sucederam nestes últimos dois anos ao país, uma queda vertiginosa de sua Economia, que nunca fora realmente forte, mas com a adesão ao Euro, parecia uma oportunidade de mudar o destino de um dos países mais pobres da Europa. Todos os esforços do povo grego para aderir ao Euro foram jogados fora por uma elite corrupta e entreguista. Os bilhões de Euros que aportaram no país, boa parte foi desviada para uso privado e mesquinho.
Enquanto a farra do dinheiro fácil circulava na Zona do Euro, parecia que tudo ia bem, mas a Grécia já acumulava grandes déficits fiscais; alguns culpavam (pela crise) a mal sucedida Olimpíadas, em que gastaram quase 15% do PIB do país em obras que nada mudaram a economia ou a dinâmica de desenvolvimento. O custo altíssimo e a imensa corrupção levaram rapidamente ao vermelho todas as finanças. A combinação de corrupção e ineficiência estatal, incapaz de cobrar impostos dos mais ricos, causa espécie: o setor de construção naval, quase a metade da riqueza do país, é isento de impostos com norma constitucional que o protege.
Rapidamente, após o estouro da crise em 2008, na Zona do Euro, a Grécia faliu, a exemplo de Irlanda e Portugal, os três países mais pobres do acordo. A situação grega foi a pior de todas, até agora: em apenas 2 anos o PIB do país recuou 20%, a sua dívida pública quase que dobrou, atingindo mais de 160% do PIB. O desemprego saltou de 12 aos 28,% (entre os jovens de aproximadamente 60%). No ano de 2011, nos últimos 8 meses 11% dos médicos saíram da Grécia. Em pouco mais de 1 ano se formou uma massa de sem teto em Atenas de mais de 50 mil pessoas. A fome e a miséria viraram rotina. Um empobrecimento ainda maior retrocedeu o país ao pré-Euro.
Obrigada a pedir o resgate à Troika, esta foi impiedosa: em setembro de 2011, a Alemanha (...) impôs ao povo grego um governo tecnocrata, liderado por Papademos, por coincidência um dos homens que tinham feito o último swap de contas gregas junto ao (banco) Goldman Sachs, seus ex-patrões, que deu um prejuízo de mais de 300 milhões de Euros. A intervenção e monitoramento do dia a dia da vida da Grécia apenas pioraram as condições da Economia. 6 meses depois do Governo tecnocrata, as eleições aprofundaram a crise, com nenhum grupo conseguindo formar um governo.
Foi preciso novas eleições com vitória da Direita pró-acordo, mas apesar do empenho de Angela Merkel, ameaçando diretamente os gregos a não votarem em Alexis Tsipras, da Syriza, essa obteve um resultado estupendo, dando-lhe a chance de ficar com a segunda bancada no parlamento, ganhando mais forças diante de pacote tão desumano imposto aos gregos pela Troika, como bem observou: “Vamos fazer uma oposição em benefício do povo grego. Em nenhuma hipótese vamos apoiar as medidas de austeridade. Elas não podem ir além”.
Na Grécia há uma cláusula eleitoral segundo a qual o partido que ganha a maioria dos votos nomeia 50 deputados a mais, uma coisa esdrúxula, que elevou a participação da Direita de 79 cadeira a 129, enquanto a Syriza ficou com 71 cadeiras, os “socialistas” caíram de mais de 100 cadeiras para 33. A diferença é que agora os termos do acordo com a Troika não serão assinados por todos os parlamentares, como fizeram em outubro, por exigência da Alemanha (ou todos os partidos assinavam o acordo ou não daria a ajuda), uma humilhação jamais vista, nem em rendição de guerra. Um parlamento que não aceita divergência.
O Estadão diz em longa matéria em que não demonstra tanto otimismo com a “vitória de Pirro”: ”O resultado oficial, quando confirmado, dará direito a Samaras de costurar a formação de um governo de coalizão, que deve ser integrado por Nova Democracia, Pasok, Esquerda Democrática e, possivelmente, Gregos Independentes. Os dois primeiros partidos são considerados “pró-austeridade”, por seu compromisso com os termos do programa de socorro de € 130 bilhões concedido pela União Europeia, pelo Banco Central Europeu (BCE) e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI)".
Os imensos sacrifícios impostos não serão cumpridos, os acordos precisariam de 50 anos de muito esforço e miséria para ser cumprido. Até o FMI acha que tais metas não são exequíveis, segundo o Jornal Estado de São Paulo: ” fontes do Wall Street Journal disseram que o FMI está pressionando os governos dos países da União Europeia a tomarem medidas para aliviar as exigências feitas à Grécia em troca de ajuda financeira. Segundo essas fontes, o FMI está enfrentando descontentamento entre seus países membros por causa das altas quantias que a instituição emprestou a países da zona do euro. As pressões do FMI, que têm sido evidentes nas reuniões entre seus representantes e funcionários da zona do euro, são uma reação às evidências crescentes de que a recessão profunda enfrentada pela Grécia tirou o programa de ajuda ao país do caminho estabelecido no começo deste ano. Os funcionários do FMI argumentam que a dívida da Grécia precisa ser reduzida para níveis sustentáveis antes de o Fundo liberar mais bilhões de euros para evitar que o país fique sem recursos. Segundo as fontes, a maneira mais eficaz de fazer isso seria os credores multilaterais da Grécia concordarem em perdoar parte da dívida. Mas essa proposta enfrentaria oposição firme de alguns governos de países da zona do euro, entre eles a Alemanha, que já emprestaram 127 bilhões de euros para a Grécia e estão intransigentes na posição de que os gregos não devem esperar receber mais concessões”.
Mas os outros membros da Troika (além do FMI, UE e BCE) não parecem dispostos a qualquer recuo, aliás exigem mais sacrifícios; o pacote de exigências aos gregos exigia um corte imediato de 11,5 bilhões de Euros no orçamento, o equivalente a 15% do total, apenas até setembro de 2012, uma tarefa gigantesca, impossível de ser cumprida. Uma missão da Troika esteve em Atenas (lembram quando vinham ao Brasil?) para fiscalizar o cumprimento das metas. Segundo a Agência Dow Jones, “O ministro de Finanças da Grécia, Yannis Stournaras, afirmou hoje que o país pode colocar milhares de servidores públicos em uma reserva especial de trabalho com salários reduzidos, para ajudar o governo a atingir a meta de cortar mais 4 bilhões de euros nos gastos orçamentários”.
A resposta que os gregos (obtiveram da) Troika devido estarem distantes da meta: deveriam punir mais ainda o funcionalismo público, pois “Segundo Stournaras, o governo grego ainda precisa finalizar uma quantia significativa de cortes que fazem parte do pacote de austeridade de 11,5 bilhões de euros nos próximos dois anos, exigido pela troica de credores internacionais […]. Os números não são fáceis de encontrar; os 11,5 bilhões de euros são um número significativo e nós ainda não o alcançamos. Falta cerca de 3,5 bilhões a 4 bilhões de euros”, comentou o ministro após se encontrar com o presidente grego, Karolos Papoulias, para informá-lo sobre os últimos desdobramentos econômicos e a recente reunião com a troica. O plano de austeridade precisa ser aprovado para que a Grécia obtenha a próxima parcela do segundo pacote internacional de resgate. No acordo de resgate, a Grécia se comprometeu a demitir quase 15 mil servidores públicos até o fim deste ano, ou encontrar outra forma de reduzir o funcionalismo. Entretanto, os esforços anteriores para criar uma reserva especial de trabalho, com cerca de 30 mil empregados, ficaram bem aquém da meta. No fim, apenas mil servidores foram colocados nessa reserva, enquanto outros 9 mil tiveram as aposentadorias antecipadas. Stournaras disse que não haverá demissões compulsórias de servidores públicos, mas afirmou que a ideia da reserva especial de trabalho ainda está sendo estudada. “Nós ainda estamos analisando esse assunto. As negociações estão em andamento e vão continuar até o fim de agosto (2012)”, comentou.
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O Eurogrupo, que reúne os ministros das finanças da Zona do Euro, sempre trabalha com uma Grécia fora do Euro: as últimas reuniões, em especial na última semana de agosto de 2012, as simulações de impactos na Zona do Euro com esta saída da Grécia foram analisadas, concluindo-se que pouco mudará o panorama geral. O centro, da preocupação do Eurogrupo são Espanha e por tabela Itália, a situação grega passou a ser questão menor, no fundo acham que o que tinham que fazer já foi feito, agora “lavam as mãos”.
Xenofobia explodiu na Grécia
A eleição de deputados pela extrema-direita grega, representada pelo partido Aurora Dourada, foi um indicativo de um sentimento neofascista crescente entre os gregos. A revolta se amplia contra os estrangeiros que vivem no país: calcula-se em 500 mil, quase 5% da população, a maioria vinda da África ou leste europeu, que têm a Grécia como porta de entrada. As milícias incentivadas pelo Nova Aurora atuam livremente, espancando e intimidando os “sem papéis”, viraram braço auxiliar da repressão estatal.
Para piorar a situação, segundo o site EuroNews, o Governo usa a repressão aos imigrantes como arma política, oferecendo à Alemanha, em especial, a garantia de que estes estrangeiros não mais passariam por seu território, e numa demonstração de força lançou uma ofensiva contra os “sem papéis”. De acordo com a matéria do site “A luta contra a entrada ilegal de asiáticos e africanos que fazem da Grécia a porta de entrada na Europa está a ser utilizada como arma política pelo governo de Atenas. A polícia deteve cerca de seis mil pessoas por entrarem ilegalmente na Grécia, onde há 500 mil imigrantes ilegais e 800 mil legais. 1.600 ‘sem papéis’ serão deportados para os países de origem nas próximas semanas. 4.500 agentes participam na operação contra clandestinos, com a qual o governo conservador grego tenta recuperar, como prometeu, o controlo das ruas contra a imigração ilegal. O ministro NIKOS DENDIAS pediu calma: “Peço à população que apoie esta operação para que não se voltem a produzir, em Atenas e progressivamente noutras regiões do país, cenas que são uma ofensa à nossa civilização.”
A recessão prolongada de mais de cinco anos seguidos levou os gregos ao desespero, os empregos precários, antes feitos pelos imigrantes ilegais, amplamente tolerados, agora são disputados pelos gregos, que querem expulsar os imigrantes, pois sem estes empregos acusam-nos pelo aumento da criminalidade: reportagem do Euro News diz-se que “as associações ligadas à esquerda consideram que o governo agita esse fantasma da concorrência dos estrangeiros no mercado de trabalho" [...], Tassos Anastasiades, da associação KEERFA: “Estão a tentar os propósitos racistas para desviar a atenção da população do que realmente está a ocorrer com as finanças, no quotidiano, e põe-se a culpa nos imigrantes de todas as coisas que estão mal na Grécia”.
A situação é insustentável, a relação é clara, o desencadear da Xenofobia está intimamente ligado à eleição da extrema-direita, “desde as eleições de junho, o partido de extrema direita ‘Aurora Dourado’ tem representação parlamentar pela primeira vez na história". Os ataques contra os imigrantes multiplicaram-se de forma alarmante. Diversas organizações constataram o aumento da violência racista no país. Cerca de 130 mil imigrantes ilegais entram, anualmente, na Grécia, a0 maioria pela fronteira com a Turquia, pelo Rio Evrosa. Durante a operação xenius Zeus, o governo enviou para a zona 2.500 agentes suplementares para proteger a linha de demarcação da fronteira.
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Austeridade que mata
Países inteiros, como a Grécia, foram devorados pela crise, os seguidos planos de Austeridade só fizeram piorar a economia, os números dizem muito mais, segundo o Estadão: “a economia da Grécia contraiu-se em um ritmo mais acelerado do que o estimado anteriormente, confirmando que o país permanece em recessão, em meio à queda dos gastos do governo e das exportações. Segundo dados divulgados pela agência de estatísticas Elstat, o Produto Interno Bruto (PIB) grego encolheu 6,3% no segundo trimestre deste ano, em relação ao mesmo intervalo ano passado. A estimativa inicial, divulgada no mês passado, era de queda de 6,2% no período. Ainda na mesma base de comparação, o PIB grego caiu 6,5% nos três primeiros meses de 2012 e teve contração de 7,3% entre abril e junho de 2011."
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O quadro acima relatado mostra a situação grega nos anos 2011/2. Desde então, a retração econômica acentuou-se. Daí o que hoje se observa.
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O quadro acima relatado mostra a situação grega nos anos 2011/2. Desde então, a retração econômica acentuou-se. Daí o que hoje se observa.
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