terça-feira, 21 de dezembro de 2010
MÁXIMAS DE NELSON RODRIGUES, O REACIONÁRIO VISIONÁRIO
O amigo nunca é fiel. Só o inimigo não trai nunca. O inimigo vai cuspir na cova da gente.
Não existe família sem adúltera./Num casal há sempre um infiel. É preciso trair para não ser traído.
O homem e a mulher são dois ressentidos contra o ex-amor./Todo amor é eterno. Se não é eterno, não era amor.
Toda mulher gosta de apanhar. Menos a neurótica. O homem é que não gosta de bater.
Invejo a burrice, porque é eterna.
Só o cinismo redime um casamento. É preciso muito cinismo para que um casal chegue às bodas de prata./O casamento já é indissolúvel na véspera./O amor entre marido e mulher é uma grossa bandalheira. É abjeto que um homem deseje a mãe de seus próprios filhos.
A solução para o problema da nostalgia sexual que persegue a todos nós é a castidade./Todo ginecologista devia ser casto. O ginecologista devia andar de batina, sandálias e coroinha na cabeça. Como um São Francisco de Assis, com a luva de borracha e um passarinho em cada ombro.
O cinema não chega a ser uma arte. Daqui a seis mil anos talvez o seja./O cinema francês é como o italiano: um conto do vigário./O cinema brasileiro só dará pé quando desaparecer o Cinema Novo até o último vestígio.
As grandes convivências estão a um milímetro do tédio.
(Frase que Nelson gostaria de ver gravada em seu túmulo, sob o tradicional Aqui jaz): "Assassinado por imbecis de ambos os sexos".
Um vago decote pode comprometer ao infinito. Só o ser amado tem o direito de olhar um simples decote.
A Europa é uma burrice aparelhada de museus./O europeu ou é um Paul Valéry ou uma besta.
Hollywood é o óbvio ululante.
O sábado é uma ilusão.
Nada mais doce, nada mais terno, do que um ex-inimigo.
Jovens de todo o mundo: envelheçam./O jovem tem todos os defeitos do adulto e mais um: o da inexperiência.
Nossos marxistas são marxistas de galinheiro. Aliás, Marx também era marxista de galinheiro.
Algumas mulheres são amorais como um bichinho de avenca - ou como a própria avenca./Todas as mulheres deviam ter catorze anos.
O brasileiro é um Narciso às avessas, que cospe na própria imagem.
O biquíni é uma nudez pior que a nudez./Os magros só deviam amar vestidos, e nunca no claro./Só o rosto é indecente. Do pescoço para baixo, podia-se andar nu.
Nunca o brasileiro foi tão obsceno. Vivemos uma fase ginecológica.
Só os profetas enxergam o óbvio./Todo óbvio é ululante.
Paisagem é verba.
O palavrão está corrompido pelas mulheres.
O pecado é anterior à memória.
A plateia só é respeitosa quando não está entendendo nada.
Se todos conhecessem a intimidade sexual uns dos outros, ninguém cumprimentaria ninguém./O ato sexual é uma mijada./Sexo é para operário.
Viajar também é uma forma de solidão.
Marx e Brecht são responsáveis pela cretinização de toda uma geração do teatro./Os inteligentes estão matando o teatro brasileiro. Um dia teremos de chamar os burros para salvá-lo.
Entre o desquite e a traição, é preferível a traição, mil vezes a traição.
Toda unanimidade é burra.
O sujeito que não se considera um gênio não deve se dedicar a fazer arte ou literatura.
A prostituta só enlouquece excepcionalmente. A mulher honesta, sim, é que, devorada pelos próprios escrúpulos, está sempre no limite, na implacável fronteira./Deus me livre da virtude ressentida, da fiel sem amor.
Sou um menino que vê o amor pelo buraco da fechadura. Nunca fui outra coisa. Nasci menino, hei de morrer menino. E o buraco da fechadura é, realmente, a minha ótica de ficcionista. Sou (e sempre fui) um anjo pornográfico.
(Nelson Rodrigues. Jornalista, escritor, cronista, novelista. 23.08.1912 - 21.12.1980).
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Todas as máximas, exceto a última, foram pinçadas de 'O Melhor do Mau Humor', de Ruy Castro, Companhia das Letras, 1990, capa de Hélio de Almeida e caricaturas de Paulo Caruso e David Levine/Keystone.
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Um comentário:
O Cinema Novo não usava sangue de extrato de tomate, o verdadeiro era cedido pela delegacia mais próxima, que por burrice não investigava a finalidade da doação.
@@@@@@
Marxistas de galinheiro traçavam as galinhas de raça no "torno".
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Toda unanimidade é burra... Até que a apareceu um tal de LUÍS INÁCIO!
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