quinta-feira, 18 de julho de 2013

SAUDADE DO RAL (II)

Raimundo Alves Lima, o Ral.

Ral, a saudade tem gosto de lágrima

Por Ataualpa Antonio Pereira Filho (professor)

"A primeira vez a gente nunca esquece". Essa frase tão comum, eu a uso para  dizer o quanto na minha lembrança ficou o companheiro Ral, pois foi o jornalista Raimundo Nonato Alves de Lima que primeiro publicou um texto meu  na página cultural do  Jornal O Estado, em 20 de março de 1984. Guardo até hoje a página 9 desse jornal com muito carinho. Não tive a oportunidade de falar isso para o Ral. Como um operário da palavra, sei a importância do jornalismo para quem trilha no caminho da crônica. Morávamos no mesmo bairro, na Vila Operária, na antiga rua Paraim, hoje Gabriel Ferreira. 

Vim para o Rio de Janeiro em 1974, em período muito difícil politicamente. E quando voltava a Teresina, em período de férias, conversamos muito sobre a questão cultural da cidade.  Naquela época, já era visível a influência de Torquato Neto no trabalho de alguns jovens que enveredavam pelo caminho literário.

Em Teresina, quem me fez gostar de poesia foram os cordelistas do antigo  mercado que havia ali, ao lado do bar Amazonas, e o compositor do Império do Samba, o senhor Manuel Fininho, passei a gostar dessa escola de samba por causa dele. Eu sempre afirmo que saí do Piauí pela força do destino, mas o Piauí nunca saiu de dentro de mim.

A notícia da morte do Ral mexeu com minha cabeça, um turbilhão de saudade, em minha memória, um passado que ainda está muito vivo, ninguém sai da sua terra impunemente. A gente não se arrepende porque sabe que são as circunstâncias que mudam o percurso do rio pela luta da sobrevivência... Só assim tão distante que a gente sente melhor o sabor de uma cajuína e de um pedaço de doce de buriti. A saudade tem gosto de lágrima...

-Companheiro Ral, que Nossa Senhora do Perpétuo Socorro  e São José Operário o recebam na Sagrada Família.

"O Verbo encarnado. Verbo expressão. Substrato humano. Ad-verbumlugar: Universo. Contingente: animal linguístico. Falemos na língua da maioria oprimida:
Anti-poevidasia: o cogumelo atômico, a fome, nazifascismo, o Tio Sam, parasitarismo etc.
Parapoevidasia: o convite ao câncer, a propaganda de cigarro. Projeto de poevidasia: a conquista do pão de cada dia. Fanta-vidasia é o segmento mais avançado de real nesse processo de semiose, onde o signo se torna símbolo quando vivenciado.
Poevidasia é substância, conteúdo que a arte expressa trans-historicamente. Não só em versos ou em prosa, formas literárias, mas em todo espaço que ocupa, assim como a água e o ar: beba, respire esta essência vital.
Repito, se sou poeta não é pelos versos que faço, mas pela vida que vivo. Sinto-me transparente quando sou lido".

Esse pequeno texto foi publicado pelo Ral, seguido do poema "Daqui prá e de lá pra cá", retido do livro "Part-ida", edição independente que fiz na época. Eis o poema que ele ilustrou com uma foto da Elis Regina:

"Uma estrela cai/ uma estrela sobe: Elis/ Deus te guie, Deus te guie Entre um bêbado/ e uma equilibrista/ pra que uma escola/ superior de guerra?/ É preferível a paz primária./ Pra que carregar estrela no ombro? Se/ no céu, ela tem mais brilho./ Mande notícias/ dos nossos irmãos/
que partiram sem/ despedida./ Talvez eles lá estejam.../ - Gostaria de ouvir/ no rádio este canto."

A imagem que guardarei do Ral será sempre desse período em que éramos jovens, andávamos descalços jogando bola no campo da Vila Operária, mas não alheios aos momentos culturais e políticos do País. (Fonte: aqui).

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"Saudade do Ral" está AQUI.

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