sábado, 13 de dezembro de 2025

O IMPÉRIO DA ARROGÂNCIA E DA VIOLÊNCIA DE TRUMP

O último memorando do presidente sobre a Estratégia de Segurança Nacional trata a liberdade de coagir outros países como a essência da soberania dos EUA. É um documento sinistro que, se prevalecer, voltará para assombrar os próprios Estados Unidos 

Jeffrey D. Sachs no Common Dreams


A Estratégia de Segurança Nacional (NSS) para 2025, recentemente divulgada pelo presidente Donald Trump, apresenta-se como um plano para renovar a força americana. Mas ela se equivoca de forma perigosa em quatro pontos.

Primeiro, a NSS está ancorada na grandiosidade: a crença de que os Estados Unidos desfrutam de supremacia incomparável em todas as dimensões essenciais do poder. Segundo, baseia-se numa visão marcadamente maquiavélica do mundo, tratando outras nações como instrumentos a serem manipulados em benefício dos EUA. Terceiro, apoia-se num nacionalismo ingênuo que descarta o direito internacional e as instituições multilaterais como obstáculos à soberania americana, em vez de reconhecê-las como estruturas que ampliam a segurança dos Estados Unidos e do mundo.

Quarto, sinaliza uma intimidação crescente no uso que Trump faz da CIA e das Forças Armadas. Poucos dias após a publicação da NSS, os EUA apreenderam, de forma descarada, um petroleiro que transportava petróleo venezuelano em alto-mar — com o frágil argumento de que o navio teria violado previamente sanções americanas impostas ao Irã.

A apreensão não teve caráter defensivo nem buscou evitar qualquer ameaça iminente. Também não há qualquer respaldo legal para apreender embarcações em alto-mar com base em sanções unilaterais dos EUA — essa autoridade cabe somente ao Conselho de Segurança da ONU. A ação, portanto, foi um ato ilegal destinado a forçar uma mudança de regime na Venezuela. Ela ocorre logo após a declaração de Trump de que havia instruído a CIA a realizar operações secretas no país para desestabilizar o governo.

A segurança americana não se fortalece agindo como um valentão. Pelo contrário: ela se enfraquece — estruturalmente, moralmente e estrategicamente. Uma grande potência que intimida aliados, coage vizinhos e despreza regras internacionais acaba isolada.

A NSS, em outras palavras, não é apenas arrogância no papel: ela está rapidamente ganhando forma na prática.Para ser justo, a NSS contém momentos de realismo há muito esperados. Reconhece implicitamente que os Estados Unidos não podem — e não devem — tentar dominar o mundo inteiro e admite que alguns aliados arrastaram Washington para guerras dispendiosas que não atendiam aos interesses reais do país. Retira-se também — ao menos retoricamente — da ideia de uma cruzada entre grandes potências. A estratégia rejeita a fantasia de que os Estados Unidos podem ou devem impor uma ordem política universal. 

Mas essa modéstia dura pouco. A NSS logo reafirma que os Estados Unidos possuem “a maior e mais inovadora economia do mundo”, “o sistema financeiro líder mundial” e “o setor de tecnologia mais avançado e lucrativo”, tudo sustentado pelas “forças armadas mais poderosas e capazes do planeta”. Essas afirmações não são apenas declarações patrióticas; funcionam como justificativa para usar o domínio americano a fim de impor condições a outros países. Parece claro que as nações menores arcarão com o peso dessa arrogância, já que os EUA não podem derrotar outras grandes potências, especialmente porque elas têm armas nucleares.

(...) 
A grandiosidade da NSS está ligada a um maquiavelismo sem disfarces. A pergunta que o documento faz não é como os Estados Unidos podem cooperar com outras nações para benefício mútuo, mas como a influência americana — sobre mercados, finanças, tecnologia e segurança — pode ser usada para arrancar o máximo possível de concessões.

Isso fica mais evidente na seção dedicada ao Hemisfério Ocidental, que apresenta um “Corolário Trump” à Doutrina Monroe. Segundo a NSS, os EUA garantirão que a América Latina “permaneça livre de incursões estrangeiras hostis ou controle de ativos estratégicos”, e que alianças e ajuda serão condicionadas ao “enfraquecimento da influência adversária externa”. Essa “influência” refere-se claramente a investimentos, infraestrutura e empréstimos chineses.

O documento é explícito: acordos entre os EUA e países “que mais dependem de nós e sobre os quais temos maior influência” devem resultar em contratos exclusivos para empresas americanas. A política dos EUA deve “fazer todo o possível para expulsar empresas estrangeiras” que construam infraestrutura na região, e Washington deve remodelar instituições multilaterais de desenvolvimento, como o Banco Mundial, para que “sirvam aos interesses americanos”.

Governos latino-americanos — muitos dos quais mantêm relações comerciais extensas tanto com os EUA quanto com a China — estão, na prática, sendo avisados: negociem conosco, não com Pequim — ou paguem o preço.

Mas tal estratégia é ingênua. A China é o principal parceiro comercial da maior parte do mundo, inclusive de vários países do hemisfério ocidental. Os EUA não conseguirão obrigar nações latino-americanas a expulsar empresas chinesas, e ainda arriscarão prejudicar seriamente sua própria diplomacia ao tentar fazê-lo. (...).

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