Garçom cabeludo estilo Beatles inspirou "Cabeleira do Zezé"
Por Felipe Branco Cruz
A cada Carnaval surge uma nova canção com a promessa de ser o hit do verão. Mas, desde o início do século 20, a marchinha, que foi reconhecida como "Patrimônio Cultural de Natureza Imaterial" na última sexta (6), segue como o ritmo imbatível nos blocos de rua e bailes. É impossível ir para a folia e não escutar canções marcantes como "Mamãe Eu Quero", "Me Dá um Dinheiro Aí", "A Jardineira", "O Teu Cabelo Não Nega", "Sassaricando" ou "Ala-La-Ô". O poder dessas marchinhas é tão grande que só menção dos títulos já é capaz de fazer qualquer um cantar o refrão.
Um dos responsáveis por manter viva essa tradição é o músico carioca João Roberto Kelly, 76 anos, autor de algumas das marchinhas mais famosas do Carnaval, escritas na década 1960, quando ele ainda era um jovem e boêmio folião. "Não tem segredo. Quem consagrou as músicas foi o povo", diz João Roberto ao UOL. É dele, por exemplo, as músicas "Cabeleira do Zezé", "Maria Sapatão", "Mulata Yê Yê Yê (Mulata Bossa Nova)", "Bota a Camisinha" e "Colombina Yê Yê Yê".
Em 2014, as músicas de João Roberto o colocaram, pelo oitavo ano seguido, no topo da lista de compositores que mais receberam direitos autorais no Carnaval, segundo o ranking elaborado pelo Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), considerando as execuções públicas musicais em clubes, casas de diversão, coretos, bailes carnavalescos e eventos de rua --o órgão tem outro ranking para shows no Carnaval, liderado por Carlinhos Brown em 2014. "O dinheiro do pagamento do direito autoral das marchinhas é a minha principal fonte de renda atualmente", afirma Roberto.
O reconhecimento da importância das marchinhas também ocorreu em São Paulo, onde a escola de samba Acadêmicos do Tucuruvi homenageará o ritmo musical no desfile deste ano, com o enredo "Entre Confetes e Serpentinas, Tucuruvi Relembra as Marchinhas do Meu, do Seu, do Nosso Carnaval". "No Rio eu gosto muito da Mangueira. Em São Paulo eu estou honrado com a Tucuruvi, por homenagear as marchinhas", disse o compositor.
A vida de João Roberto sempre foi ligada à música, com trabalhos em programas musicais na TV Excelsior, na TV Tupi e na TV Rio. Suas composições já foram gravadas por Elza Soares, Elizeth Cardoso, Dalva de Oliveira, Emilinha Borba, entre outros, e há quatro meses ele se apresenta na casa de shows Rio Scenarium, na Lapa, cantando marchinhas e sucessos da MPB. "Homenageio os maiores compositores do Brasil", diz ele.
Garçom cabeludo
O compositor ensina que, para criar uma marchinha de sucesso, a música precisa ter um "pouco de sal", sem ser explícita. "É uma grande brincadeira", diz. João Roberto lembra que "Cabeleira do Zezé", por exemplo, foi composta em 1963 para um garçom cabeludo de um bar no Leme que usava um penteado estilo Beatles. "Sempre que eu ia ao bar São Jorge, no Leme, que não existe mais, eu via aquele garçom cabeludo, que usava uma botinha. Se eu fosse um cartunista, faria um desenho. Então fiz o que sabia fazer: música", lembra. "Achava curioso ver aquela figura equilibrando meu copo de chope. A cabeleira do Zezé foi uma sátira à moda dos Beatles. A banda inglesa influenciou tanto os costumes que acabou virando marchinha", brinca.
Para o músico, a marchinha é como uma fotografia que captura um momento específico. Um desses momentos foi o concurso de Miss Guanabara de 1964, vencido por Vera Lúcia Couto dos Santos, a primeira negra a ganhar um título de beleza no Brasil. "Assisti ao desfile e achei a Vera maravilhosa. Ela estava lá linda, rodopiando feito um pião", lembra. O resultado foi a marchinha "Mulata Yê Yê Yê", aquela do refrão: "Mulata bossa nova, caiu no hully gully, e só dá ela! Yê yê yê... Na passarela". "Essa é a minha composição favorita", confessa.
Por outro lado, "Maria Sapatão" não foi inspirada em ninguém especificamente. "Foi uma constatação. Como diz a música: 'O sapatão está na moda, o mundo aplaudiu. É um barato, é um sucesso, dentro e fora do Brasil'", diz. Já a marchinha "Bota a Camisinha" é outra que dá muito orgulho a João. "O Chacrinha divulgou a música em seu programa, e nós fomos os primeiros a aconselhar o uso. Tinha censura brava na época, e ninguém tinha coragem de falar", lembra.
João Roberto, no entanto, afirma que um dos motivos para não surgirem novas marchinhas é a falta de divulgação das músicas nos meios de comunicação. "Tem muita gente boa compondo", diz o artista, que, ao lado do promotor de eventos Perfeito Fortuna, resgatou em 2005 o concurso de marchinhas da Fundição Progresso, na Lapa carioca. Nas últimas nove edições do concurso, cerca de 6.200 novas composições passaram por lá. "Não é por falta de matéria prima e sim por falta de divulgação". O cantor lamentou também a morte de outro compositor de marchinhas, Homero Ferreira, autor de "Me Dá um Dinheiro Aí", que morreu na última segunda-feira (2), aos 86 anos.
As marchinhas de João Roberto já são tão famosas que praticamente ganharam vida própria. Para o compositor, esta é uma das suas maiores alegrias na vida. "A primeira vez que ouvi 'Cabeleira do Zezé' tocando em um baile foi no Theatro Municipal, com um monte de gringos cantando. Fiquei em choque e comecei a chorar", lembra.
O músico revela que ele continua compondo marchinhas e tem muito material inédito guardado, esperando o momento certo para ser divulgado. A inspiração, segundo ele, é a política. "A política é uma marchinha pronta. É uma piada. É só comprar um jornal para ver." (Fonte: aqui).
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Pivete, ouvi "Cabeleira do Zezé" pela primeira vez na adorável Piracuruca, Piauí. Bons tempos!
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Pivete, ouvi "Cabeleira do Zezé" pela primeira vez na adorável Piracuruca, Piauí. Bons tempos!
2 comentários:
Relembrei os nossos velhos carnavais em Luzilândia...
Beijos.
Maratonas maravilhosas!
Mas neste ano até que curtimos, hein, incansável e charmosa foliã?
Beijos.
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