domingo, 16 de junho de 2019

A COLUNA DOMINICAL DE JÂNIO DE FREITAS

O grande exercício do momento é especular sobre como a conjuntura estará até o dia da sessão em que a 2ª Turma do STF deliberará acerca de HC pleiteado pela defesa do ex-presidente. Que revelações do Intercept terão vindo a público? (O Intercept estará 'no ar' até lá?). Os atores envolvidos continuarão em seus cargos? Terá prosperado a ideia do plebiscito - que estaria sendo urdida por certos personagens -sobre quem é contra ou a favor da Operação Lava Jato (sim, o intuito parece ser o de rotular de 'pró corruptos' aqueles que ousarem condenar o comportamento dos condutores da operação, visto que estarão sendo contra a própria operação)?. Se nem os absurdos até a presente data revelados estão sendo considerados bastantes para determinar a má-fé dos implicados no dossiê Intercept, imagine-se qual seria o destino dos futuros recursos judiciais eventualmente apresentados pelas partes prejudicadas caso as revelações do Intercept não estivessem presentes!


Delinquência múltipla

Por Jânio de Freitas 

Nada aconteceu ao acaso nesta etapa fúnebre do nosso fracasso como país. A partir de tal premissa, é preciso dizer que os atos delinquentes de Sergio Moro, Deltan Dallagnol e outros da Lava Jato só puderam multiplicar-se por contarem com o endosso de vozes e atitudes que deveriam eliminá-los. É preciso, pois, distribuir as responsabilidades anexas à delinquência, não pouco delinquentes elas mesmas.

É preciso dizer que a imprensa, incluído o telejornalismo, foi contribuinte decisivo nas ilegalidades encabeçadas por Sergio Moro. Aceitou-as, incensou-o, procurou tornar o menos legíveis e menos audíveis as deformações violadoras da ordem legal e da ética judiciária.

Os episódios de transgressão sucederam-se, ora originários de Moro, ora do ambiente de fanatismo imperante entre os procuradores. Com o cúmulo do desatino e do extemporâneo no espetáculo de Deltan e da psicótica rosácea de acusações ao alvo de sua obsessão.

É preciso dizer que as advertências de juristas e advogados de alta reputação, não faltando nem livros de reunião e análise de muitas das transgressões, tiveram mais do que o espaço para o escapismo do “nós publicamos”. Foram vistos muitas vezes como interesseiros políticos ou profissionais. Era, no entanto, o caso de clamor, de defesa aguda dos princípios constitucionais e da legislação, se a imprensa quer afirmar-se democrata, ao menos quando se trata da sua liberdade plena.

A conduta da imprensa tem nomes, não foi anônima nem está encerrada. Nem corrigida: as críticas de um ou outro comentarista não compensaram o rápido esvaziamento das revelações do competente The Intercept Brasil.

É preciso dizer que a mais alta instância de defesa dos direitos civis, da Constituição e do corpo de leis foi coadjuvante nas condutas ilegais de Sergio Moro. O Supremo Tribunal Federal, principalmente pelos ministros Teori Zavascki e Edson Fachin, relatores da Lava Jato, Cármen Lúcia e Luiz Fux, teve o dever de reprimir, cedo, qualquer pilantragem judicial. Preferiu não o fazer, ou por demagógico medo de desagrados externos, ou por sujeição majoritária à ideologia. Poucos ficaram ilesos.

É preciso dizer que o Conselho Nacional de Justiça está necessitado de recuperação judicial. Sua razão de ser é zelar por prestação de Justiça a mais coerente com a legislação, o que implica correção processual, imparcialidade e ética, como explicitadas nos códigos específicos. Apesar disso, nenhum recurso, advertência ou aviso sobre o infrator Moro teve mais consequência do que o arquivamento. Em mais de meia centena de casos, endosso das artimanhas de Moro sem exceção. O papel do CNJ é vizinho do vergonhoso.

É preciso dizer que o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) praticou justiça: deu aos dallagnois o aval que seu equivalente na magistratura deu a Sergio Moro. Esse conselho é o vizinho do vizinho. Mas no Ministério Público não basta a quota de responsabilidade dos procuradores em Curitiba e no CNMP.

A proteção dada pelo então procurador-geral Rodrigo Janot foi a todos os abusos de poder, perversões na invocação de leis, arbitrariedades com as famílias de delatados. Mais de uma vez, Janot divulgou notas de restrição a condutas abusivas. Todas só para enganar a opinião pública, todas descumpridas com o seu amparo.

É indispensável reconhecer que Gilmar Mendes esteve certo nos seus ataques a procedimentos de Sergio Moro e dos procuradores da Lava Jato. Sem subscrever suas pesadas palavras, o sentido do muito que disse, com desprezo de vários colegas, foi verdadeiro. Os que apontaram as condutas transgressoras da Lava Jato foram muito atacados, mas eram os que estavam certos. Está provado, com as vozes dos políticos Sergio Moro e Deltan Dallagnol.

Leia livros
Duas edições recentes e muito apropriadas para estes dias. Do alemão Heinrich Böll, Prêmio Nobel de 1972, o pequeno e original “A Honra Perdida de Katharina Blum” (ed. Carambaia) é, entre outros méritos, uma granada no sensacionalismo dito jornalístico. 

“Repórter” (ed. Todavia), de Seymour M. Hersh, um dos raros nomes mundiais do jornalismo, é uma biografia profissional com valioso efeito simultâneo: desnuda o misto de hipocrisia, dominação, guerra, conspiração, assassinato, mentira por trás do que é dito e mostrado ao povo do eixo do mundo. E, portanto, a todo o planeta.  -  (Aqui).

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