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Marielle Franco e Anderson Gomes não eram os únicos alvos dos assassinos da vereadora. Fernanda Chaves, testemunha viva, deu o seu relato
Por Patricia Faerman (Jornal GGN)
Marielle Franco e Anderson Gomes não eram os únicos alvos dos assassinos da vereadora. Fernanda Chaves, assessora chefe de gabinete e amiga da vereadora, também devia ter morrido. Estava no carro, ao lado de Marielle, quando viu em detalhes a vereadora e o motorista morrendo, e sobreviveu.
Os detalhes daquele 14 de março de 2018 foram narrados por Fernanda a todos, nesta quarta-feira (30), no primeiro dia de julgamento dos assassinos confessos Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, pelo júri popular.
Em detalhes, Fernanda contou ao 4º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro os momentos que antecederam e como foi a morte de Marielle Franco e do motorista. “Eu queria acreditar que ela estava viva”, disse, narrando que pedia às pessoas na rua para que chamassem ambulância para resgatar a vereadora.
Ela contou que, cheia de sangue, em estado de choque, com pedaços de vidro da janela estourada grudados no seu rosto, começou a pedir ajuda a umas poucas pessoas que estavam na rua naquele momento.
Em meio ao caos e terror, Fernanda relatou que, aos poucos, foi percebendo que não havia escapado de um tiroteio entre policiais e possíveis criminosos, em um desses episódios relativamente comuns do Rio de Janeiro, como inicialmente pensou. Porque não havia ninguém atrás, policiais ou “criminosos”, o carro não estava próximo de ninguém. Até que entendeu que foi uma tentativa de assassinato.
Tentativa porque ela não quis admitir que Marielle já estava morta.
“Eu estava muito ensanguentada, muito suja de sangue e comecei a gritar por socorro e ajuda. As pessoas se aproximaram, e uma mulher ofereceu ajuda. Eu não enxergava direito, meu corpo ardia, e eu olhava para Marielle lá dentro e queria acreditar que ela estava viva, que estava desmaiada, algo assim, porque eu sai inteira dali. Então eu só me preocupei em pedir uma ambulância.”
Fernanda narrou como o episódio mudou drasticamente a sua vida. Jornalista, ela comandava a comunicação e a imagem de Marielle Franco. Ela era amiga e vizinha da vereadora. Mas não só. Era uma testemunha viva do assassinato.
Com o risco, ela precisou deixar a sua casa e levar o marido e a filha de 6 anos para o exterior, para se protegerem. “A minha vida mudou completamente. Não há normalidade. Eu tive que sair do país, eu fui orientada a sair imediatamente da minha casa”, contou.
O marido teve que abandonar o trabalho, fechar o escritório e a filha interromper a escola. Depois de dois dias e meio, deixaram a casa que viviam. Foram acolhidos pela Anistia Internacional, em um programa de proteção a vítimas, em Madrid, na Espanha. Ela contou que não queria estar lá, não queria ter saído de casa e que a vida da família mudou completamente desde então.
“É violento você ser obrigada a sair da sua casa, da sua cidade, seu país. Mas muito mais dolorido foi eu ser obrigada a não participar dos ritos de despedida da Marielle.
Eu fazia parte da coordenação política dela, mas antes disso tínhamos quase 15 anos de amizade. Eu não pude ir ao velório, ao enterro, à missa de sétimo dia. As pessoas acham muito glamuroso você estar fora do Brasil, na Europa, mas eu não queria estar lá. Eu não era turista. Eu queria estar na Maré, na marcha de manifestação. Eu sequer conseguia desfazer minhas malas quando cheguei lá”, relatou.
A jornalista também narrou o impacto do episódio para a sua filha, de apenas 6 anos. Ela teve que ser retirada da escola e, após o retorno da família ao Brasil, três meses depois, não podia continuar as aulas pela interrupção do semestre escolar.
Para não deixar traumas tão fortes na criança, a família optou por dizer à filha que a mãe havia sofrido um acidente de carro. No avião, a caminho do exílio, a menina perguntou: “Mamãe, o que é assassinato?”. "Ela desconhecia o que era isso”, disse Fernanda.
As declarações da testemunha foram as primeiras ouvidas por 21 pessoas, o júri popular no Rio de Janeiro, nesta quarta-feira, sobre os assassinos de Marielle Franco e Anderson Rodrigues.
Em maio deste ano, mais de 6 anos depois do assassinato da vereadora, a Procuradoria-Geral da República (PGR) concluiu a investigação e revelou que os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão foram os mandantes do crime.
Os ex-policiais Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz admitiram ter assassinado Marielle e o motorista, e participam do julgamento por videoconferência. - (Aqui).
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