segunda-feira, 18 de março de 2019

GLOBALISMO COMO FANTASIA DA HISTÓRIA

Primórdios da globalização, do globalismo e das teorias conspiratórias, indigesto  aperitivo para descontraído jantar em espaço privilegiado da Metrópole, com as ilustres presenças de Steve Bannon e Olavo de Carvalho. 
(Bosch).
Globalismo como fantasia da história
Por André Araújo (No GGN).
Um elementar conhecimento de História e de Teoria da História trará ao estudioso a noção da imprevisibilidade, da acidentalidade e do papel do acaso na determinação do caminho da História. A conclusão é a de que é impossível prever, mesmo de forma elementar, os resultados da geopolítica, pois que a trajetória das variáveis em movimento não pode ser prevista. Um simples acidente pode mudar o curso da História, um acidente aéreo como o que atingiu Eduardo Campos alterou o mapa eleitoral, um desconhecido estudante com uma pistola em Serajevo desencadeou a Grande Guerra de 1914.
É possível sim analisar tendências ou linhas em certas áreas ou caminhos da geopolítica, mas previsões reais são meros palpites, mesmo em economia.
A GLOBALIZAÇÃO
A globalização, no sentido de livre movimentação de capitais, mercadorias e pessoas atingiu seu apogeu entre 1870 e 1914, quando enormes capitais da Europa construíram ferrovias, bondes, usinas de energia, moinhos, minas, campos de petróleo pelo mundo, ao mesmo tempo em que milhões de italianos, alemães, irlandeses, poloneses, húngaros, libaneses, portugueses, espanhóis, suecos,  emigraram, muitos sem saber bem onde iriam chegar, muitos sem passaportes: a liberdade de movimentação de pessoas e bens era quase absoluta. Foi uma globalização benigna e profícua.
Já a nova globalização, que se seguiu ao fim da União Soviética, restringiu-se a capitais, bens e serviços, mas sob uma forma menos benigna e até perversa. Não trouxe frutos ao conjunto dos povos e foi capturada nos seus ganhos por grandes empresas e pelo mercado financeiro.
Seus efeitos maléficos criaram uma nova direita pelo mundo e seu desfecho ainda não está claro. Esse terreno abriu caminho para o globalismo.
O GLOBALISMO
O globalismo é uma sub ideologia conspiratória que vê a globalização como um processo comandado por um grupo de força e não como um movimento de circunstância histórica. O globalismo seria uma conspiração de um grupo com tal poder que poderia organizar o mundo por sua vontade.
Essa ideia é fruto de pobreza cultural e de desconhecimento da história, e achou o mesmo terreno fácil que no Século XIX encontrou uma teoria conspiratória famosa, conhecida como “OS PROTOCOLOS DOS SÁBIOS DO SIÃO”, cuja preparação e divulgação foi organizada pela OKRHANA, a eficiente polícia política do Czar Alexandre II.  Os “Protocolos” criaram a lenda de que um grupo de ricos judeus se reuniam em Praga para determinar o destino do mundo.
Produziu-se então um livro dito secreto, sem autor, que foi impresso aos milhares e distribuído primeiro na Rússia e depois na Europa Ocidental.
Por muito tempo muita gente acreditou na veracidade dos “Protocolos” e só nos anos 70 do Século XX foi possível traçar com detalhes toda a trajetória da confecção dessa lenda com base em livro do  escritor francês Maurice Joly (1829-1878), tendo como texto o seu livro ”Diálogo no Inferno entre Maquiavel e Montesquieu”, publicado originalmente em francês e copiado pelos espiões russos na Biblioteca Imperial em Londres, a partir do qual “Os Protocolos” são um plágio. “Dialogo no Inferno...” se destinava a combater o Imperador Napoleão III e foi modificado para se criar “Os Protocolos”.
Os “Protocolos” foram um dos elementos de elaboração do nazismo. O livro foi proibido em praticamente todo o mundo e depois do fim da Segunda Guerra rebrotaram teorias conspiratórias similares de “um grupo de homens que mandam no mundo”, com variantes no Círculo Bildberg, na Maçonaria, na Comissão Trilateral, no Clube de Roma, todas na mesma linha de “Os Protocolos”, conspirações secretas que movem o mundo.
A teoria é atraente pela sua simplicidade, que atende ao pequeno espaço intelectual de mentes simples. Não é preciso estudar História, nem ler os vinte livros de Churchill, nem percorrer a “histoire des annales”, tudo exige muito tempo, reflexão e trabalho. Para quê, se uma simples teoria explica tudo?
O maior historiador do Século XX, Hobsbawn, ao fim de sua longa vida concluiu que não sabia nada de História, tal a complexidade das variáveis a estudar. Mas os que cultivam teorias conspiratórias podem explicar tudo através de duas ou três ideias muito simples que se aprendem em uma semana.
OS ANTIGLOBALISTAS ATUAIS
Os que acreditam no atual globalismo como teoria conspiratória veem em certos movimentos pelos direitos humanos, pela ecologia, pelas causas de minorias raciais e de gênero, um elemento de conspiração mundial conhecido como “marxismo cultural”. Ao mesmo tempo e em par com esses movimentos veem o mundo como comandado por meia dúzia de magnatas, tendo George Soros como líder. Tampouco explicam o que esses magnatas teriam a ganhar amparando movimentos pró meio ambiente, pró gays, pró miseráveis, que nada têm a ver com suas fortunas.
OS ANTIGLOBALISTAS BRASILEIROS
Estão na moda porque estão no governo, mas penam por uma contradição. Como herdeiros da teoria conspiratória dos “Protocolos”, os antiglobalistas costumam ver nos magnatas judeus o comando do grupo que controla o mundo e o marxismo cultural como emanação de um judeu, Karl Marx.
Mas, ao mesmo tempo, os antiglobalistas brasileiros adoram ardentemente o Estado de Israel, que é a culminância do sionismo e deveria ser a capital do grupo que querem combater: todos os elementos lá estão, os magnatas judeus e os marxistas culturais.
É uma contradição insanável, mas pouco importa, porque no seu deserto cultural esse grupo nem percebe a contradição, seu QI não chega a tanto.
AS TEORIAS CONSPIRATÓRIAS ATRAVÉS DA HISTÓRIA
As teorias conspiratórias sempre existirão porque a maioria das pessoas não tem a base intelectual para ver que se trata de visões “fake” da história.
O real perigo é quando essas teorias passam a ser base de um governo; aí se introduz uma visão “fake” do mundo como base de ação de governo.
Para quem estuda História fica difícil até debater esse tema, tal sua fragilidade, até cômica, mas há fases em que essas nuvens descem à terra e é preciso clareá-las: a realidade existe e é com ela que devemos lidar, e não com contos de fadas.

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